Na FNAC com Rui Unas

Conversámos com Rui Unas, o homem a que alguns chamam “Lord”, na FNAC Almada. Não houve poltrona amarela, mas foi uma beleza.

 
Com Certeza Maluco Beleza
No seu novo livro, Rui Unas resume as conversas que teve com 35 figuras públicas na sua rubrica de YouTube “Maluco Beleza”:
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Ana Malhoa
António Raminhos
Bruno Nogueira
César Mourão
Cláudio Ramos
Diana Chaves
Diogo Morgado
Fernando Alvim
Filomena Cautela
Gustavo Santos
Herman José
João Manzarra
João Paulo Rodrigues
José Avillez
José Fidalgo
Júlia Pinheiro
Ljubomir Stanisic
Luciana Abreu
Luis de Matos
Maria Leal
Maria Rueff
Mariana Cabral
Mário Rui Santos
Maya
Nelson Évora
Nilton
Nuno Eiró
Nuno Markl
Ricardo Araújo Pereira
Rita Pereira
Rui Sinel de Cordes
Salvador Martinha
Salvador Sobral
Vasco Palmeirim
Porque escolheu a FNAC Almada para esta conversa?

A razão é óbvia, não é? [risos] Sou deste lado do rio e até já se tornou quase um epíteto meu: sou o gajo da Margem Sul. Tanto que até fiz aquela música do “Margem Sul State of Mind”.

Bem como o livro Nascido e Criado na Margem Sul.

Sim, no qual brinquei com o estereótipo que a Margem Sul tem. Portanto era óbvio. E, em bom rigor, dava-me mais jeito vir aqui do que a Lisboa. Ficava de passagem.

O primeiro livro que lançou foi uma autobiografia ficcionada. Com Certeza Maluco Beleza é bem diferente. Nasce de um projeto que, logo na introdução do livro, o Rui define como o corolário de todas as experiências que fez desde que tem conta no YouTube. O que significa o “Maluco Beleza” para si?

Já faço televisão há algum tempo, já era um homem do entretenimento e do audiovisual há algum tempo, mas só quando comecei a fazer coisas na Internet, paulatinamente, com todos os desafios que me autopropus, é que fui descobrindo que de facto a Internet permite coisas que a televisão e outros órgãos de comunicação social não permitem. Sou eu que coloco os meus próprios parâmetros de duração, de conteúdo, de estilo. Claro que depois há sempre limites que não se podem ultrapassar. Não posso pôr pornografia…

Não no YouTube.

Não no YouTube. Mas essa liberdade só a descobri com a Internet. Costumo dizer, por brincadeira, que não era completamente feliz na televisão e não sabia. Só soube depois de fazer Internet. Por um lado há limitações, porque a Internet, pelo menos aqui em Portugal, não permite que se despendam muitos meios – não chegamos a tanta gente, não há tanta publicidade. Em compensação, depois permite fazer tudo aquilo que a televisão não permite em termos de conteúdo.

Na verdade, o Rui já tinha entrevistado vários dos seus convidados do “Maluco Beleza” no Cabaret da Coxa e n’A Última Ceia.

Mas nunca neste registo.

Nunca neste registo. Até porque não são propriamente entrevistas.

Sim, e consegui alcançar esse registo um bocadinho sem querer. Sou fã de podcasts, já tinha tido alguma experiência quando iniciei o projeto só em áudio, e percebi que era um registo que permitia que as pessoas se dessem a conhecer de outra maneira. Quando optei pelo registo audiovisual, com câmaras, tinha receio de que se perdesse essa espontaneidade de uma conversa à distância, via Skype.

Mas foi o contrário.

Resultou muito bem, e aí está o “sem querer”. O facto de estar só eu e a pessoa num sítio onde não há cameraman, um estúdio que não é de televisão nem de rádio, muito acolhedor… Rapidamente se esquecem que vão estar pessoas a ver. E como é uma conversa sem pressão nenhuma em termos de tempo – podemos acabar em 1h00, 1h15, 1h20, 1h30, 2h00 como já aconteceu – essa despreocupação com que se está na conversa acaba por resultar também na espontaneidade e na verdade que emerge da persona que conhecemos das figuras públicas.

Não era completamente feliz na televisão e não sabia.

Que livros ofereceria a…

Fernando Alvim
“A grande magia do Fernando Alvim é ser uma eterna criança. É isso que o faz ser tão genial e prolífero nas coisas que faz. Porque ele arrisca, tal como uma criança, sem pensar muito nas consequências. Apetece-lhe fazer e faz. Por isso recomendaria um livro infantil.”

Nuno Markl
“O Nuno Markl é um geek. Está sempre a ler. Acho que lhe recomendava qualquer coisa para não ler. Tinha de ser um livro em branco – mas ele depois ia desenhá-lo, porque também é um cartoonista. Faz desenhos muito bons.”

Ricardo Araújo Pereira
“Olha outro! Tenho uma inveja muito boa dele. Na entrevista que lhe fiz tive de me conter, porque estava nervoso. Para não parecer um fanboy. É alguém que admiro mesmo muito. Não consigo. Quem sou eu para aconselhar um livro ao Ricardo Araújo Pereira?” 
Por falar em persona, o nome “Maluco Beleza” vem de uma música do Raúl Seixas que aparenta ser sobre um homem que desiste da normalidade para abraçar a “maluquez”, como o próprio diz. Isto é também um pouco a sua história, não é? No Curto Circuito, o nome “Rui Unas” vinha quase sempre associado à expressão “ganda maluco”.

Que era uma expressão que, curiosamente, eu não curtia muito. Porque era muito redutora. Eu não sou só um “ganda maluco”. Prefiro ser um “maluco beleza”, que, tal como fizeste referência, mistura a lucidez com a “maluquez”. É o equilíbrio. Acho que uma pessoa completamente lúcida e racional, que segue as normas…

Não tem piada?

Nada contra, mas acho que não vive uma vida completa. Para uma vida mais produtiva e criativa tem de haver uma dose de “maluquez”. Não conseguimos ser completamente lúcidos se não houver ali uma pancada.

O livro é uma compilação de 35 entrevistas.

Não sei porque foram 35. Podiam ter sido 40 ou 45.

E porquê estas? Quais foram os critérios na seleção?

Pois. É a pergunta para a qual agora tenho de estar preparado para responder. Foi com a ajuda da editora. Se fosse só eu a fazer essa escolha ainda estaria hoje a selecionar. Por isso deleguei na editora essa responsabilidade de sugestão – obviamente, depois, com o meu aval. Mas creio que [o critério] foi tentar ser o mais diversificado possível em termos de áreas – temos várias áreas do entretenimento e da cultura representadas nos convidados. A escolha teve o meu aval, mas confesso que me subtraí um bocadinho a essa responsabilidade, porque senão seria muito difícil. Era como escolher os melhores filhos.

Houve alguma entrevista de que tenha gostado particularmente?

Vê lá se o Ângelo Rodrigues está no livro.

Não está.

Pronto, então olha…

Mas essa correu bem, portanto.

Essa correu muito bem. É paradigmática daquilo que acontece muitas vezes com as conversas do “Maluco Beleza” e que eu acho que também está expresso no livro: aquela história de a pessoa vir ao de cima e de conhecermos um bocadinho melhor a pessoa em vez da persona. Aconteceu-me com o Ângelo Rodrigues.

Eu próprio tinha uma ideia muito pré-concebida dele e a conversa que tive com ele foi uma descoberta pessoal. Acabei por ser surpreendido, tal como muito espectadores o são quando veem algumas entrevistas em que pensam que conheciam a pessoa. “Epá, eu não gostava muito de A, B ou C e afinal, depois de ver a entrevista, é um tipo porreiro ou uma tipa muito simpática.”

Comigo aconteceu isso. Foi um exemplo daquilo que creio que às vezes consigo proporcionar às pessoas que veem as entrevistas: serem surpreendidas por quem está por trás da figura que conhecemos.

Eu não sou só um ‘ganda maluco’. Prefiro ser um ‘maluco beleza’, que mistura a lucidez com a “maluquez”.

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Há alguém que gostaria de entrevistar e que nunca tenha entrevistado?

Há pessoas com as quais acho que teria uma excelente conversa. O Manuel Luís Goucha, por exemplo. E vai acontecer. Não tenho dúvidas. Pode levar um ano, cinco, dez, mas vai acontecer. A Teresa Guilherme também.

Isso também é engraçado. O Rui esteve tanto tempo na SIC e, no entanto, os seus convidados são muitas vezes de canais e áreas diferentes. É algo que procura?

Sim. É natural que tenha um contacto mais próximo com as pessoas da SIC, porque fazem parte da minha família televisiva, mas como estamos a falar de Internet e eu me dou bem com toda a gente, quero acreditar que mais cedo ou mais tarde todos virão, independentemente do seu canal ou da sua afiliação televisão.

O Goucha disse que não podia ir porque tinha um contrato muito blindado na TVI – mas a Cristina Ferreira saiu, por isso agora não tem desculpa para não ir ao “Maluco Beleza”. Antes pelo contrário: tem a obrigação, já que sou um primo dela na família da SIC.

Portanto há material para um segundo livro de “Maluco Beleza”.

Já há material com aqueles que ficaram de fora. Por exemplo, tive uma conversa deliciosa com o Nuno Graciano, já há dois anos, e não está no livro. Fugiu ao critério [de escolha]. Mas se fizéssemos um segundo, estaria com certeza.

E porquê um livro? Sentiu a necessidade de fazer o salto do digital para o impresso?

É um desafio muito interessante tentar transpor toda aquela genuinidade que só as conversas no YouTube permitem, porque não há pressão, e fazermos uma transcrição para o preto no branco. Se calhar as próprias pessoas que vão ler e que não viram ou ouviram vão dizer: “Espera lá, ele disse isto? Ele pensa isto? Ele é assim?” Vão ficar surpreendidas com as revelações que foram feitas no contexto do YouTube.

A Cristina Ferreira agora não tem desculpa para não ir ao ‘Maluco Beleza’. Antes pelo contrário: tem a obrigação, já que sou um primo dela na família da SIC.

O Rui é um leitor habitual?

Leio muito menos do que gostaria e deveria. Tento impor-me hábitos de leitura, mas é muito difícil.

Por uma questão de tempo?

Sim. Mas claro que é possível, isto não é desculpa. Já tentei de tudo: ler ao final do dia, andar com um livro no carro, mas volta e meia acabo por me desapegar do livro que estou a ler. Mas não desisto. Tenho um monte de livros na cabeceira e na mesa de apoio da sala. Tenho a biografia do Steve Jobs, que é um calhamaço gigantesco, e hei de ler, hei de pegar naquilo, mas confesso que sou um leitor muito frustrado porque nunca consigo cumprir os desafios que me autoimponho.

Esse é o tipo de livros que mais gosta de ler? Biografias?

Sim.

Tem algum livro que o tenha marcado especialmente?

Faço sempre referência ao primeiro que li vorazmente, com muito entusiasmo. Despachei aquilo com muita rapidez. Foi o Papillon, que depois deu um filme.

E agora deu outro.

É uma história verídica, e saber que aquilo aconteceu de verdade dá um ânimo diferente. Foi um livro que me marcou efetivamente.

Gosta de livros de humor?

Leio pouquíssimo humor. Aliás, consumo pouco humor, seja audiovisualmente falando ou em espetáculos – devia ver mais os meus colegas.

Para não influenciar?

Não sei. Sim. Por acaso agora até estou a ver uma série a que estou a achar muita graça.

Que é qual?

Crazy Ex-Girlfriend. É uma série de humor da Netflix. Está muito bem feita e representada. Mas não sou de gargalhada muito fácil.

Costuma oferecer livros às pessoas?

Agora tenho a melhor prenda e a melhor desculpa: promover o meu livro e ao mesmo tempo oferecer qualquer coisa. Sou capaz de comprar uns quantos a um preço especial para depois oferecer.

 

Por: Tiago Matos
Fotografias: Bruno Colaço/4SEE

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