[Espanha] O apoio mútuo

Por José Aureliano Martín | 01/11/2020

O apoio mútuo, de Kropotkin, publicado por primeira vez em 1907, é um dos grandes livros do mundo. O motivo disso, conforme era explicado no prólogo de sua edição norte-americana, é que o livro estava sendo continuamente reeditado e constantemente encontrava-se esgotado. Kropotkin foi um homem de ciência e um pensador anarquista. Foi simultaneamente biólogo e filósofo social; historiador e ideólogo. Por isso, seu livro, como afirma Ángel J. Cappelletti no prólogo da edição espanhola, é “um ensaio enciclopédico, de um gênero cujos últimos representantes foram positivistas e evolucionistas. Abarca quase todas as vertentes do saber humano, da zoologia à história social, da geografia à sociologia da arte, todas a serviço de uma tese científico-filosófica que constitui, por sua vez, uma particular interpretação do evolucionismo darwiniano”.

A origem desse estudo, segundo se explica no prólogo, está na viagem de Kropotkin a Sibéria, entre 1862 e 1866, onde procurou evidências sobre “essa amarga luta pela sobrevivência entre animais da mesma espécie”, que era a característica preferencialmente considerada pelos darwinistas. Entretanto, o que Kropotkin viu com seus próprios olhos não foi essa amarga luta, mas a evidência de alguma coisa diferente, que o levou a reavaliar a teoria de Darwin sobre a origem das espécies. Dizia: “A sociabilidade é tanto uma lei da natureza quanto o é a ajuda mútua… os animais que adquiriram o costume da ajuda mútua são, sem dúvida, os mais aptos. Têm maiores possibilidades de sobreviver como indivíduos e como espécie, e alcançam em suas classes correspondentes os mais altos desenvolvimento mental e organização física…”.

Kropotkin analisou o comportamento de muitas espécies. Sobre as formigas, por exemplo, dizia que ocupavam o ponto mais alto de toda uma classe de insetos por sua capacidade mental e bravura. Das abelhas, que trabalhando em comum multiplicavam em proporções inverossímeis seus esforços individuais, e recorrendo a uma divisão temporal do trabalho, cada abelha conservava sua disposição para qualquer trabalho quando fosse necessário, conseguindo assim um tal grau de bem-estar e segurança como nenhum outro animal tem, por mais forte que possa ser, ou melhor armado que esteja. Mas também advertia que a sociabilidade das abelhas era tanto mais instrutiva quanto mais os instintos de rapina e de preguiça continuavam existindo entre elas. Dessa maneira, “quando a coleta está terminada e nos campos e pradarias resta pouco material para a elaboração do mel, as abelhas ladronas aparecem em grande número…, mas a seleção natural deve aniquilar incessantemente as ladronas, dando lugar a indivíduos que compreendem as vantagens da vida social e do apoio mútuo…”.

Depois dessa análise, dizia que “… vê-se, por tudo o que precede, que a guerra de todos contra cada um não é, de modo algum, a lei predominante na natureza. A ajuda mútua é lei da natureza tanto quanto a guerra mútua, e essa lei se faz, para nós, mais exigente quando observamos algumas outras associações das aves e observamos a vida social dos mamíferos…”.

Porém, Kropotkin reconhecia que Darwin, em seu A origem do Homem explicou o verdadeiro sentido da “luta pela existência”, mostrando como em incontáveis sociedades animais a luta pela existência entre os indivíduos desaparecia completamente e, no lugar da luta, aparecia a cooperação que levava ao desenvolvimento das faculdades intelectuais e das qualidades morais que garantiam a essa espécie as melhores oportunidades de viver e se propagar.

Nesse sentido, O apoio mútuo não é, como pretendem alguns, uma negação da teoria da seleção natural de Darwin. Muito ao contrário, Kropotkin partia do reconhecimento da importância adaptável da cooperação e do socorro mútuo, que de maneira nenhuma contradiz a teoria da seleção natural. O que sim foi considerado inaceitável foi o extremismo evolucionista apresentado por autores como Huxley, ou, em sentido oposto, o conceito de vida de Rousseau. Assim, na introdução de seu livro, Kropotkin afirma: “O amor, a simpatia e o sacrifício de si mesmo, naturalmente, desempenham um papel enorme no desenvolvimento progressivo de nossos sentimentos morais. Mas a sociedade, na humanidade, de maneira alguma foi criada sobre o amor ou sobre a simpatia. Foi criada sobre a consciência – embora seja instintiva – da solidariedade humana e da dependência recíproca dos homens. Foi criada sobre o reconhecimento inconsciente ou semiconsciente da força que a prática comum de dependência estreita da felicidade de cada indivíduo e da felicidade de todos, e sobre os sentimentos de justiça ou de equidade, que obrigam o indivíduo a considerar os direitos de cada um dos outros como iguais a seus próprios direitos”.

Ao longo de suas pouco mais de duzentas páginas, Kropotkin mostra uma pesquisa rigorosa sobre o comportamento das espécies animais e do homem primitivo, corroboradas por uma grande quantidade de trabalhos de ecólogos e antropólogos posteriores, que subscrevem cientificamente a principal conclusão dessa obra do pensador anarquista: “… no progresso ético do homem, o apoio mútuo – e não a luta mútua – tem constituído a parte determinante”.

É de interesse sua referência à evolução do conceito de apoio mútuo nas cidades da Idade Média, relacionado, por sua vez, com a evolução de importantes conceitos do direito penal. Escreve assim: “Quando as instituições de ajuda mútua, isto é, a organização tribal, a comuna aldeã, as guildas, a cidade da Idade Média começaram a perder no transcurso do processo histórico seu caráter primitivo, quando começaram a aparecer nelas as excrescências parasitárias que lhes eram desconhecidas, motivo pelo qual estas mesmas instituições se transformaram em obstáculos para o progresso, então a revolta dos indivíduos contra as instituições adquiria sempre um caráter duplo. Uma parte dos rebeldes empenhava-se em purificar as velhas instituições dos elementos estranhos a elas, ou em elaborar formas superiores de livre convivência, baseadas uma vez mais nos princípios da ajuda mútua; trataram de introduzir, por exemplo, no direito penal, o princípio de compensação (multa), no lugar da lei do talião, e, mais tarde, proclamaram o “perdão das ofensas”, ou seja, um ideal ainda mais elevado de igualdade diante da consciência humana, em vez da “compensação” que se pagava segundo o valor de classe do lesado. Mas, ao mesmo tempo, a outra parte desses indivíduos que se rebelaram contra a ordem que tinha se consolidado tentava simplesmente destruir as instituições protetoras de apoio mútuo a fim de impor, em seu lugar, sua própria arbitrariedade, ampliar desse modo suas riquezas pessoais e fortificar seu próprio poder. Nesta tripla luta entre as duas categorias de indivíduos, aqueles que tinham se revoltado e os protetores do existente, consiste toda a verdadeira tragédia da história…”.

Há alguns dias compartilhava com minha professora de inglês estas reflexões e falava da necessidade de tentar adaptar esse antigo conceito da ajuda mútua aos tempos atuais, como remédio para combater os grandes males que nos acometem, a começar pela pandemia em curso, que torna a nos manter confinados, e a mudança climática, que não deixa de nos surpreender com novas catástrofes todos os dias. Embora ela se mostrasse bastante cética a respeito, eu seguia insistindo na necessidade de atualizar o conceito.

Como dizia Asmley Montagu sobre O apoio mútuo no prólogo do livro, “… em sua ampla extensão, inclusive nos tempos atuais, vemos também a melhor garantia de uma evolução ainda mais sublime de nossa raça”. Afirmação que comparto plenamente e que considero de total atualidade e vigência.

Fonte: https://elfarodeceuta.es/apoyo-mutuo/

Tradução > s/n

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agência de notícias anarquistas-ana

O corpo é um caminho:
ponte, e neste efêmero abraço
busco transpor o abismo.

Thiago de Mello

[Espanha] Carlos Taibo: “Não sei o que me preocupa mais, o alarme ou o Estado”

Betanzos (Galiza) | Ilustração: La Rara | Extraído do CNT nº 424. Dossiê Ecologia Social

Carlos Taibo, escritor, cientista político e autor de inúmeras obras teóricas, é um colaborador regular da CNT, e hoje ele deixa de lado sua coluna na última página, para que possamos fazer uma pequena entrevista com ele.

É quase obrigatório começar perguntando-lhe como superou estes meses de confinamento em Madrid. Você já usou este tempo para qualquer livro que sairá em um futuro próximo?

Eu passei em Madrid, de fato, o confinamento. E dediquei uma boa parte do tempo à leitura e à escrita. Não tive escolha a não ser avançar no trabalho que estava planejado para ser feito na segunda parte do ano. O principal é um pequeno livreto que visa aplicar a perspectiva do decrescimento e a teoria do colapso aos problemas da Ibéria vazia (a propósito, eu também incluo Portugal). Suponho que verá a luz do dia no final do ano. Em algum momento, eu tenho apontado que para mim o confinamento tem sido aquilo que eles chamam de ajuda à criação, dispensada por nosso magnânimo governo.

Desta vez foi uma Pandemia, como qualquer outro desastre humano ou natural poderia ter sido. O que você acha das decisões tomadas pelas Organizações Internacionais e pelos governos em vista da expansão da COVID-19?

Devo confessar, antes de mais nada, que não tenho ideias muito claras sobre os diferentes modelos de tratamento da pandemia que tomaram forma em alguns lugares. Estou pensando nos chineses e sul-coreanos, nos suecos, nos portugueses e gregos, e nos governos espanhol, francês, britânico e americano, para citar apenas alguns. Em todos os lugares, acredito que as consequências dramáticas das reduções orçamentárias aplicadas à saúde e, em geral, aos gastos sociais, foram reveladas. Em alguns lugares, e este é um fenômeno que acredito ser de interesse, também se tornou claro que as sociedades comunitárias tradicionais desfrutam espontaneamente de interessantes mecanismos de defesa. Também contra a pandemia. Basta lembrar que o cenário de muitas mortes nas últimas semanas – os lares de idosos – é desconhecido, ou quase desconhecido, em muitas dessas sociedades, onde os idosos vivem e morrem em casa. Muitas vezes, de fato, com fardos que recaem principalmente sobre as mulheres.

Além do acima exposto, deve-se prestar atenção à pandemia repressiva. Seria absurdo para mim atribuir ao Presidente Sanchez o projeto, através do estado de alarme, de lançar as bases de um projeto ecofascista. Mas aqueles que estão acima de Sanchez, aqueles que puxam os cordelinhos na sala dos fundos, certamente tomaram nota da reação disciplinada de tantas pessoas imersas em um exercício genuíno de servidão voluntária. Há os policiais da varanda para testemunhar isso. Já o disse várias vezes recentemente: não sei o que me preocupa mais, o alarme ou o Estado.

Em uma tirinha publicada, um tsunami atingiu uma praia na forma de três ondas, cada uma delas maior que a outra. O primeiro foi o Covid-19, o segundo a recessão econômica, e o terceiro, enorme, a mudança climática. Estamos enfrentando os prolegômenos do Colapso?

É difícil para mim responder a esta pergunta, especialmente porque não excluo que os poderosos consigam restaurar a maioria das regras do cenário pré-pandêmico, com elementos de repressão econômica e social que são cada vez mais severos. Quando, em 2016, escrevi um livro intitulado Colapso, a tese principal que defendi foi que este último seria, antes de tudo, o produto da combinação de dois fatores principais: a mudança climática e o esgotamento de todas as matérias-primas energéticas que usamos hoje. Eu acrescentei, é verdade, que a influência de outros fatores não deve ser subestimada, o que, aparentemente secundário, poderia oficializar, no entanto, como multiplicadores das tensões. A este respeito, mencionei várias crises – demográficas, sociais, assistenciais e financeiras – e falei da proliferação de várias formas de violência, referi-me à idolatria que seguem merecendo o crescimento econômico e a tecnologia e, finalmente, coloquei sobre a mesa o peso das epidemias e pandemias.

Minha impressão, que deve ser provisória, é que estes fatores secundários adquiriram um peso incomum, na medida em que a pandemia sanitária foi acompanhada por outras ligadas ao cenário social, aos cuidados e à deriva do sistema financeiro, de tal forma que uma bola de dimensões cada vez maiores foi formada. Não me parece excessivo dizer que esta bola nos coloca, por muitas razões, à beira do colapso. Além disso, assistimos provisoriamente a um declínio nos dois principais fatores, juntamente com reduções na poluição, um declínio no consumo de combustíveis fósseis e uma abrupta desaceleração no processo de turismo.

A tirinha que você menciona, em resumo, nos obriga a repensar com crueza quais deveriam ser nossas prioridades. Recentemente, lembrei várias vezes que, de acordo com um artigo publicado na revista Forbes, como resultado da queda da poluição na China, 77 000 pessoas vão salvar suas vidas, um número vinte vezes superior ao número de mortes oficialmente identificadas naquele país como resultado do coronavírus. Acho que isto dá o que pensar.

Assistimos ao surgimento de velhos problemas “nacionais” como nunca antes: territorialidade, autoritarismo, diferenças sociais, o desmantelamento do setor público e da saúde em particular. Será que nós libertários temos que dar uma resposta, tanto teórica quanto prática, aqui e agora, sem mais delongas?

Os três principais fundamentos dessa resposta são os mesmos de sempre: a implantação de redes de apoio mútuo – que, por sinal, se espalharam, felizmente espontaneamente, de forma muito notável -, a prática constante da ação direta e, finalmente, a autogestão. Nunca é demais ressaltar que não é suficiente defender “o público”, que por si só, e por si só, pode infelizmente ser uma ferramenta perversa a serviço dos poderosos. O público autogerido e socializado deve ser defendido. E devemos trabalhar, é claro, com o povo comum.

Fonte: https://www.cnt.es/noticias/carlos-taibo-no-se-que-me-inquieta-mas-si-la-alarma-o-el-estado/

Tradução > Liberto

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agência de notícias anarquistas-ana

bambu quase quieto,
voltado para o poente,
filtra a luz da tarde

Alaor Chaves

[Chile] Nova edição do jornal “Confrontación”

NADA ESTÁ ACABADO!  

AINDA ESTAMOS EM REVOLTA CONTRA TODA AUTORIDADE.

Um ano após o início da revolta desencadeada no Chile desde 18 de outubro de 2019, continuamos a propagar a CONFRONTAÇÃO.

Saudando todxs aqueles que foram ativos na luta contra a ordem estabelecida antes, durante e depois da chamada “explosão social” e continuamos nas ruas com um novo número impresso.

Estamos nos dias em que se passou um ano desde 18 de outubro e trazemos conosco a raiva anárquica contra este sistema opressivo com o calor dos momentos de luta que continuamos a compartilhar entre camaradas e com cúmplices circunstanciais e solidários no calor da revolta.

Também temos a memória fresca de cada cena de repressão e violência do Estado em nossos corpos/mentes e de tantos assassinatos, torturas, ataques e mutilações. Acrescentamos ao contexto atual o plebiscito de 25 de outubro para uma possível mudança na Constituição, uma armadilha institucional que não nos convoca nem nos representa.

Como cada momento da história, nosso contexto tem suas próprias possibilidades, dificuldades e desafios que moldam o cenário de luta. Aqui queremos compartilhar algumas reflexões, perguntas e ideias práticas que servem para nos conectar com as preocupações e desejos daqueles que se recusam a permitir o triunfo da normalidade imposta pelo Poder e as ilusões democráticas colocadas na agenda de hoje.

POR UMA VIDA LIVRE CONSTRUÍDA SOBRE AS RUÍNAS DO VELHO MUNDO DO ESTADO E DO PODER.

Para aqueles de nós que há anos vêm espalhando revolta em palavras e ações contra toda autoridade, a luta não envolve mudanças no aparato estatal. Já estamos há um ano em uma revolta que tem componentes variados e cujo horizonte de ruptura com a ordem estabelecida foi, infelizmente, aprisionado pela ilusão de supostas mudanças estruturais baseadas na possibilidade de uma modificação constitucional, uma solução reformista acordada pela classe política em novembro de 2019 em vista da impossibilidade de deter o avanço imparável de uma revolta violenta sem líderes ou dirigentes.

Com mais ou menos desconfiança em relação ao processo eleitoral constituinte, amplos setores se dobraram às soluções oferecidas pela institucionalidade, canalizando as energias e os debates para esse cenário, com lógicas semelhantes ao plebiscito realizado em 1988 para retornar à democracia pela via pacífica, após quase uma década de protestos maciços e ações subversivas contra a ditadura. Esse plebiscito – como uma experiência que trazemos ao presente – também surgiu do pacto entre a ditadura e uma classe política disposta a assegurar a pacificação social e a continuidade do regime econômico e político vigente.

FORA E CONTRA TODA INSTITUIÇÃO, PRISÃO E LEGALIDADE.

A história mostra que toda ilusão e toda mudança parcial é válida para o poder se for uma questão de pôr um fim às rupturas que permitem a imaginação/construção de formas de vida e de ação que se opõem ao Estado e à autoridade.

A experiência histórica fornece vários exemplos que mostram que aqueles que administram a ordem social sempre procuram proteger seu sistema e, se necessário, se abrem à possibilidade de reinventar as páginas de suas próprias constituições escritas com sangue, repressão e fórmulas autoritárias que garantem continuidade e dependência do Estado. Mas não lhes daremos o prazer.

A legalidade, a justiça estatal e as soluções institucionais sempre procuraram perpetuar a ordem social contra a qual nos encontramos em CONFRONTAÇÃO com o que existe. É por isso que as demandas dos cidadãos por justiça contra os agentes que exercem repressão ou os apelos para “abolir” as instituições policiais e penitenciárias não têm sentido real se não se basearem na destruição do poder, do Estado e da sociedade carcerária em que vivemos.

QUE A REPRESSÃO NÃO DETENHA A INSURREIÇÃO.

Fazendo parte dos eventos atuais, sabemos que a vigilância e a repressão estão literalmente ao virar da esquina. Sabemos que a passagem da pandemia não só provocou uma crise socioeconômica e sanitária como resultado da óbvia opção estatal de proteger o modelo empresarial – uma opção que não tem nada de novo sobre ele – mas também vimos um aumento na instalação de câmeras, no uso de drones e na normalização da vida cotidiana marcada pela presença militar, toque de recolher, monitoramento tecnológico dos movimentos e restrições de mobilidade.

Também sabemos o que os camaradas que mesmo na prisão mantêm viva a chama da revolta sentem, pensam e vivem, e nós não os deixamos nas jaulas do poder.

Por tudo isso, assumimos a importância de cuidar e conhecer uns aos outros, de afiar nossas práticas e ideias, de conhecer cada vez mais o inimigo e como funciona sua repressão, de não ficar na denúncia das injustiças, ao contrário, devemos continuar lutando apesar da sofisticação do controle social.

NADA ESTÁ ACABADO!

Nossa luta não é para tornar o Estado um inimigo mais sensível e inclusivo. As leis, onde quer que apareçam, são apenas um instrumento de repressão e de pacificação social. A liberdade não é encontrada nas jaulas da autoridade e é por isso que a insurreição anárquica varre qualquer ideia de melhorar as prisões ou tomar o poder.

Portanto, a partir deste espaço – mais um entre muitos – convidamos você a conhecer outros indivíduos em luta, sem comprometer nossa posição anárquica/antiautoritária, e também a fortalecer os laços de camaradagem e competição com nossos semelhantes, afastando-se de qualquer influência autoritária e esquerdista que procure instrumentalizar nossa paixão destrutiva/criativa.

Porque somente no ataque à dominação, na destruição de todas as formas de poder e na propagação de relações livres de autoridade, encontramos a verdadeira liberdade. A agitação e a violência da revolta não são “etapas” para pressionar e melhorar o Estado, mas uma ofensiva permanente contra todo poder e autoridade.

Com a agitação e a ação multiforme, continuamos em CONFRONTAÇÃO.

$hile, outubro-novembro de 2020.

confrontacion@riseup.net

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Velho casarão.
Iluminam o interior
raios de luar.

Fanny Dupré

[Alemanha] Anarquista, antiautoritário ou libertário? 180 anos de confusão conceitual no anarquismo

Por Maurice Schuhmann

Como um dos maiores erros do anarquismo, Gaston Leval descreveu uma vez a tentativa dos anarquistas de interpretar o termo “anarquia”, que se usou negativamente nesse momento, positivamente. Ao contrário de outros movimentos sociais, o anarquista nunca conseguiu se desfazer do toque negativo. Como no passado, “anarquia” e “anarquismo” estão associados hoje com a desordem (“caos”), o terror e a violência. Em consequência, as manchetes jornalísticas do tipo “Há anarquia em xxx” podem se encontrar nos jornais de todas as partes.

A autodenominação “anarquista” remonta ao socialista francês Pierre-Joseph Proudhon, que em um diálogo fictício com seus leitores no transcurso de sua obra O que é a propriedade? Escreve:

“- És republicano?

– Republicanos, sim, mas a palavra não diz nada definitivo. República significa o bem estar coletivo, agora quem o queira, independentemente da forma de governo, pode chamar-se republicano. Os reis também são republicanos.

– Bom, então, és democrata?

– Não.

– Que! Então és monarquista!

– Não.

– Constitucionalista?

– Deus me salve disso.

– Então és um aristocrata?

– De nenhum modo.

– Estás a favor do governo moderado?

– Muito menos.

– Então que és?

– Sou anarquista.”

Proudhon provavelmente brincou com o uso pejorativo do termo utilizado na Revolução Francesa. Nesse momento era uma má palavra para o oponente político respectivo.

O termo, que reinterpretou positivamente, se converteu rapidamente em uma autodesignação no século XIX, apesar de todas as dificuldades. Depois de tudo, Proudhon era considerado o antepassado indiscutível da corrente no anarquismo social e individualista clássico, apesar de todas as críticas posteriores a ele. O anarco-comunista russo Peter Kropotkin mais tarde lhe outorgou o título honorífico de “Pai da Anarquia”, enquanto que o anarquista individualista estadunidense Benjamin R. Tucker utilizou uma declaração de Proudhon para o subtítulo de sua revista Liberty.

Além do termo “anarquista”, o termo “libertário” foi discutido como uma autodesignação em meados do século XIX. Foi criado em resposta a Proudhon como neologismo por Joseph Déjacque, um publicitário e autor em grande parte esquecido. Como conceito, se opõe ao liberalismo e foi divulgado pelo jornal Le Libertaire desde 1858. Outros editores anarquistas mais tarde nomearam seus cabeçalhos em consequência, incluído Sébastien Faure. Especialmente no espectro anarco-comunista, a criação dessa palavra caiu em terreno fértil.

Em países de fala francesa e espanhola, este termo é geralmente sinônimo de “anarquista”. A escolha do apelido tem que ver em parte com a percepção negativa do termo “anarquista”. O fato de que este termo também pode causar confusão se demonstrou na tradução ao alemão de um documentário de arte sobre a revolução espanhola, onde se chegou a dizer que a CNT havia lutado pelo comunismo liberal (sic!). Nos países de fala inglesa, o termo “libertarian” se usa quase só em relação com os anarco-capitalistas. Neste contexto, libertário em última instância só significa radicalmente “liberal econômico”. Um exemplo deste uso é o título do livro de Stefan Blankertz Manifesto Libertário ou a designação de liberais por empresariais estadunidenses como Robert Nozick como libertários. No espectro da cena alemã, o termo é geralmente mais amplo que “anarquista”, quer dizer, também inclui correntes e ideias relacionadas com o anarquismo (clássico). Isto se pode ver, por exemplo, na rotulagem paradoxal de pensadores individualistas como “marxistas libertários”. Também assinala superposições com o adjetivo “antiautoritário”, que não pode contar-se unicamente como anarquismo. Este é também um conceito de luta que Friedrich Engels escolheu como título para a ala não marxista na Associação Internacional dos Trabalhadores. Também na área da educação, tampouco parece claro seu significado.

Com essa carga de um termo que os anarquistas tivemos conosco desde os dias de Proudhon, nunca se devem usar as seguintes linhas do poema “Anarchy” de Mackay!:

“Mas tu, palavra, tão clara, tão forte, tão pura, que dizes tudo pelo qual estou ansioso, te dou o futuro! Esse futuro é teu, quando todos finalmente despertem”.

Fonte: https://fda-ifa.org/gai-dai-no-108-mai-2020/
 
agência de notícias anarquistas-ana

Início de inverno —
Minha filha de dois anos
Ensino a usar “hashi”

Gyôdai

[EUA] Rockford: “Diga não ao novo COINTELPRO!,” lançamento do banner #FreeAnt

Relato sobre o recente lançamento do banner contra a contínua repressão da rebelião em curso após o assassinato policial de George Floyd.

A luta pela libertação dos negros se intensificou desde o levante anti-policial que começou em Minneapolis em maio. A rebelião se espalhou como fogo selvagem pelos chamados Estados Unidos. Em Rockford (no estado de Illinois), testemunhamos uma revolta multirracial encabeçada por negros contra o Departamento de Polícia de Rockford em 30 de maio. Muitos de nossos camaradas foram presos naquele dia e durante o resto do verão.

Apesar da aparente presidência de Biden, a repressão estatal ao movimento abolicionista continuará. Não importa quem está no cargo. As acusações federais contra Anthony Smith na Filadélfia e outros nos Estados Unidos são a prova de que o Estado está tentando criar uma nova geração de prisioneiros políticos negros. A repressão continuará independentemente de quem está no poder.

Encorajamos todos os revolucionários a organizar suas comunidades para defender as pessoas que estão sendo alvos do Estado por sua participação na rebelião e na ação política radical. Um movimento verdadeiramente resiliente deve apoiar as pessoas que enfrentam a repressão do Estado por suas ações e organização. Vamos construir conselhos anti-repressão em cada cidade. Diga não ao novo COINTELPRO (Programa de Contrainteligência)!

Esperamos com nosso banner ampliar as demandas dos revolucionários da Filadélfia para o #FreeAnt. Além disso, as acusações sobre Ant e de todos os outros na Filadélfia devem ser retiradas. Também elevamos as demandas do Black Philly Radical Collective pela libertação imediata de Mumia Abu-Jamal, Major Tillery, Arthur Cetawayo Johnson, Russell “Maroon” Shoatz, Omar Askia, Joseph “Jo-Jo” Bowen e todos os Prisioneiros Políticos Negros. Não podemos esquecer nossos idosos revolucionários.

É imperativo que os revolucionários em Rockford entendam as ligações entre a repressão do Estado em nossa própria cidade e a estratégia mais ampla do Estado para destruir os movimentos pela libertação negra. As ações do Departamento de Polícia de Rockford e do Gabinete do Xerife do Condado de Winnebago de vigiar, reprimir e deter organizadores, anarquistas e participantes do movimento não são exclusivas a Rockford.

Exigimos que todos os manifestantes nos Estados Unidos recebam anistia. Todas as queixas devem ser retiradas. Mostramos solidariedade incondicional a todos os rebeldes, radicais e revolucionários que enfrentam a repressão do Estado.

Liberte-os todos.

Fogo nas prisões.

Fuck 12.

Liberação Negra Agora

Fonte: https://itsgoingdown.org/rockford-new-cointelpro-freeant/

Tradução > A. Padalecki

agência de notícias anarquistas-ana

chegado para ver as flores,
sobre elas dormirei
sem sentir o tempo

Buson

[Espanha] José Negre, o primeiro secretário da CNT

Por Julián Vadillo Muñoz  | 02/11/2020

Em 30 e 31 de outubro e 1º de novembro de 1910, foi realizado em Barcelona um congresso nacional de trabalhadores, que resultou na fundação da Confederação Nacional do Trabalho. Embora o Solidaritat Obrera, um sindicato revolucionário nascido em 1907, tenha sido estabelecido na Catalunha, as demandas de outros setores de trabalhadores na Espanha apontavam para a necessidade de um sindicato que abrangesse todo o país. A Semana Trágica em Barcelona pôs um fim a uma eleição nacional que foi realizada com um ano de atraso. Esse congresso, que reuniu setores do socialismo, do anarquismo e do sindicalismo revolucionário, serviu para lançar as bases de uma organização que, sob os parâmetros revolucionários do sindicalismo e a inspiração do anarquismo, formaria uma entidade que eles vinham buscando desde o desaparecimento da FTRE no final do século XIX.

O avô do anarquismo, Anselmo Lorenzo, dirigiu estas palavras ao congresso que estava sendo realizado no Palácio de Belas Artes em Barcelona:

“Antes de vocês, o livro de história apresenta uma página em branco. Preparem-se para enchê-lo com honra para vocês mesmos, com proveito para todos, presentes e futuros”.

Entre os participantes do congresso, deve ser destacada a presença de José Negre, então Secretário Geral da Solidaritat Obrera e eleito na época como o primeiro Secretário Geral da CNT.

José Negre nasceu em Ludientes, uma pequena cidade da província de Castellón, em 13 de maio de 1875. Gráfico de profissão, jornalista e grande orador, Negre foi uma das forças motrizes do movimento operário de Barcelona nos primeiros anos do século XX, onde emigrou por razões trabalhistas.

Os ecos que vieram da França do sindicalismo revolucionário do final do século XIX e as contribuições doutrinárias ao modelo corporativo introduzido na Espanha por figuras da estatura de José Prat ou Anselmo Lorenzo, convenceram um Negre que começou a se destacar como militante e como orador.

Negre viveu um dos períodos chave para entender o avanço do sindicalismo em Barcelona e como ele se tornaria uma espoleta para o resto do país. Sua atividade sindical foi fundamental na fundação da Solidariedad Obrera em 1907, assim como a luta que ele mostrou contra a influência que o Lerrouxismo e o Catalanismo estavam começando a exercer sobre o proletariado catalão e de Barcelona. O nascimento do Solidaritat Obrera coincide na prática com a expansão do catalanismo conservador, representado pela Lliga, e o nascimento do Solidaritat Catalana (que data de 1906) no calor das consequências do ataque ao Cu-Cut! e a aprovação da Lei de Jurisdições, e a fundação do Partido Republicano Radical de Alejandro Lerroux, “o Imperador do Paralelo”. Ambas as forças rivalizavam com os espaços de sociabilidade do operariado, onde a Solidaridad Obrera era mais influente. Negre estava claro que a luta dos trabalhadores estava acima da questão nacionalista catalã e da demagogia lerrouxista.

Em 1908, surgiu um conflito entre os sindicalistas do Solidaritat Obrera e o jornal Lerrouxista El Progrès, dirigido por Emiliano Iglesias. José Negre deixou em suas memórias esta marca do conflito entre radicais e sindicalistas:

“Minorias que nunca vacilaram, apesar de terem que enfrentar tanto a burguesia quanto as autoridades que os perseguiam e atropelavam incessantemente e sem consideração, o partido Lerrouxista, sagaz e hipocritamente inserido nas mesmas sociedades operárias, um partido que tinha a pretensão de assumir a Federação Local de Solidariedade dos Trabalhadores e que afirmava pela boca do pirata político Emiliano Iglesias que ou a Federação dos Trabalhadores estava domiciliada na Casa del Pueblo, ou desapareceria, e apesar de ser o referido partido literalmente árbitro de Barcelona, tendo todas as autoridades à sua disposição, contando com a adesão de uma massa de 60.000 eleitores e com um jornal com a maior tiragem naqueles anos, foi derrotado de forma retumbante após a rude e acrimoniosa luta por uma Federação de Trabalhadores que no máximo reuniu uma massa de 15 a 20.000 membros federados e um semanário de cerca de 3.000 exemplares de tiragem”.

O conflito aumentou a influência da Solidaridad Obrera, onde Negre já era uma figura proeminente. À frente dos impressores de Barcelona, Negre tornou-se uma referência para o sindicalismo revolucionário e, portanto, foi eleito Secretário Geral de Solidariedade dos Trabalhadores.

Suas visões da Semana Trágica de Barcelona também são paradigmáticas quando se trata de analisar o momento, sobretudo por causa da repressão exercida contra sindicalistas e revolucionários:

“Uma vez liberadas as barricadas pelos revolucionários, os trabalhadores abandonaram ou esconderam suas armas, a cidade foi deixada na posse das autoridades e dos pacos (a polícia local), que desde as torres da igreja e outros estabelecimentos religiosos nas igrejas tinham os nervos do bairro em estado de tensão com seus contínuos tiros, tiros que não tinham outro propósito senão fazer crer que os autores desses tiros não eram outros senão os revolucionários, e que foram considerados inimigos inconciliáveis da tranquilidade pública e, portanto, prontos a impedir a restauração da normalidade, e que reagindo contra todas as opiniões, deixaram os vitimizadores livres para realizar impunemente a repressão feroz e selvagem que foi proposta para se vingar dos medos e terrores que haviam sido vividos durante os dias em que os trabalhadores bateram corajosamente o cobre nas barricadas.”

O momento principal de Negre veio quando, meses depois desses eventos, foi um dos impulsores do Congresso de Belas Artes que deu origem à fundação da CNT. Ele estava consciente da necessidade que o operariado espanhol tinha de uma organização em nível geral que, ao propor um modelo sindicalista revolucionário e ao alimentar-se de uma ideologia e organização anarquista, teria uma alternativa à UGT. Um congresso cheio de conteúdo que terminou com a aprovação dessa necessidade, que José Negre liderou.

Negre tinha duas questões claras em mente. A primeira foi que, apesar do nascimento da CNT, o objetivo era trabalhar pela unidade do proletariado espanhol em uma única organização de trabalhadores, levando à união das duas centrais sindicais em uma só. Uma posição compartilhada pela maioria dos sindicalistas revolucionários do mundo.

Por outro lado, para Negre, a união e a formação ideológica do proletariado foi fundamental. E isto não poderia ser realizado exclusivamente nos sindicatos, mas no desenvolvimento de entidades independentes que serviriam para administrar debates profundos entre os trabalhadores. O Ateneu Sindicalista, a entidade básica para estes debates, foi desenvolvido em Barcelona em 1909 por causa de seu impulso. Um modelo de organização que foi repetido em outros lugares como Madrid, Gijón e Ferrol, e que foi a base embrionária para o desenvolvimento da CNT nessas áreas.

Além disso, Negre pertencia àquela geração de sindicalistas e anarquistas que acreditavam na organização puramente operária, tentando afastar os trabalhadores de modelos individualistas ou minoritários baseados na violência que não produziam nenhum resultado.

Negre foi representante dos trabalhadores em muitos congressos posteriores, bem como participante da fundação de entidades como o Ateneo Sindicalista de Baracaldo. Ele também participou como representante espanhol em congressos sindicalistas internacionais. Ele teve uma participação ativa na clandestinidade entre 1911 e 1914, e mais tarde esteve envolvido na redação do Solidaridad Obrera.

Entretanto, apesar da enorme influência de Negre nesses anos, de participar ativamente na criação de seções como as do setor ferroviário ou de visitar a prisão várias vezes por causa de sua atividade sindical, durante os anos da crise da Restauração ele se afastou da linha de frente. Seus debates com sindicalistas como Salvador Seguí ou Manuel Buenacasa o ofuscaram.

Se teve que esperar até 1936 para ver Negre ativo novamente, embora ele nunca tenha abandonado a causa sindicalista. Dos anos da crise da Restauração, sua pequena obra O que é o sindicalismo? destacou-se, embora seus textos mais representativos tenham sido Memórias de um Velho Militante publicado em 1936 e O que é o Coletivismo Anarquista? de 1937.

A chegada das tropas de Franco na Catalunha o levou a fugir, sendo já idoso, para a fronteira francesa. Na França ele foi confinado a um campo de concentração e morreu em dezembro de 1939 no campo de Argelès-sur-Mer. Um triste fim para um dos expoentes mais importantes do trabalhismo, pouco conhecido hoje em dia.

Fonte: https://elobrero.es/component/k2/58189-jose-negre-el-primer-secretario-de-la-cnt.html

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Na tarde sem sol
folhas secas projetando
sombras em minh’alma.

Teruko Oda

[Espanha] O Dilema Social: nós somos mercadorias

Há duas indústrias que chamam seus clientes de ‘usuários’: o das drogas ilegais e do software” – O Dilema das Redes Sociais

As especialistas observam que recebemos uma notificação, tiramos o celular do bolso e respondemos cerca de 80 vezes por dia. Cada vez que o fazemos, uma empresa – Google, WhatsApp, Instagram, Facebook, Twitter, etc. – lutam para que passemos mais tempo em sua aplicação, colados à tela. O tempo gasto significa que o aplicativo aprende mais sobre você e que a informação vale muito dinheiro. Como é dito no documentário O Dilema das Redes Sociais (2020), “quando você não paga pelo produto, o produto é você”.

Este novo mercado de dados é chamado de “capitalismo de vigilância”. “Cada ação que você toma é monitorada e registrada. Exatamente que imagem você assiste e quanto tempo você assiste”, diz Jeff Seibert, um ex-executivo do Twitter, no documentário.

O filme, dirigido por Jeff Orlowsky, entrevista vários ex-empregados de grandes empresas de redes sociais – jovens, ricos, homens brancos de forma esmagadora – incluindo os criadores do botão “like”, um dos maiores ícones do século 21. É um bom filme que explica como estes algoritmos exploram as vulnerabilidades da psicologia humana, como diz José Antonio Luna em eldiario.es, mas é notável que o faz através da Netflix, uma plataforma que emprega as mesmas práticas. Por exemplo, quando uma nova temporada de Narcos ou Stranger Things é carregada, as imagens dentro do aplicativo da plataforma geralmente mudam até identificarem o mais atraente para os telespectadores. É como se a Amazon nos alertasse para o perigo de não comprar no comércio de proximidade.

É também chocante que o documentário não aborde o escândalo da venda de dados pelo Facebook à empresa Cambridge Analytica, o que levou à grande manipulação da sociedade britânica para votar no Brexit e o americano para votar no Trump. Mas nada acontece. Sobre este assunto, Netflix tem à sua disposição o documentário O grande ataque hacker (2019).

Um dos aspectos que explica O Dilema das Redes Sociais é como as notícias falsas se espalham através das redes sociais em geral e do Facebook em particular. O cientista da computação Jaron Lanier explica que páginas como Facebook, YouTube ou mesmo Google variam o resultado da busca por termos como “mudança climática” de acordo com o local e/ou a pessoa que realiza a busca. Nas redes sociais, o gosto do pesquisador é dissipado, o que gera microcosmos de pessoas com suas próprias realidades e seus próprios fatos. Mesmo que sejam uma mentira. O importante é que se trata de uma história que gera cliques. “Com o tempo você tem a falsa sensação de que todos concordam com você porque todas as suas notícias pensam como você”, explica Roger McNamee, um dos primeiros investidores do Facebook. As consequências? O fortalecimento das ideias de extrema-direita, sua acomodação em posições racistas e o florescimento das teorias de conspiração (do terraplanismo à negação de Covid, à QAnon).

Não pretendemos neste artigo desafiar as redes sociais como um todo, nem cair em posições simplistas sobre seu mal intrínseco. Reconhecemos que elas são mecanismos úteis para disseminar informações para um amplo público – este jornal tem contas no Facebook, Twitter e Instagram – embora seja claro que seu design encoraja o vício, seu uso irresponsável e uma brutal transformação de nossa sociedade. O que buscamos com estas linhas é refletir sobre os interesses por trás das redes e explicar – parcialmente, como a realidade nunca é simples – alguns dos fenômenos que vimos nos últimos meses: por exemplo, os tumultos liderados por fascistas contra o estado de alarme gritados por “Pedro Sanchez filho da puta”, nazistas indo atrás do MENAs e tornando-se vítimas depois de se defenderem destes, teorias conspiratórias ligando a propagação do coronavírus com 5G, etc. Quando uma história é suculenta e mórbida, ela se espalha como fogo selvagem porque os algoritmos a preveem e acaba se tornando a versão oficial.

O Dilema das Redes Sociais está longe de ser perfeito. Primeiro, porque dá voz a um grupo muito específico de pessoas (ex-trabalhadores da rede social da empresa), que enquanto fazem uma crítica detalhada a este mundo, o fazem sem revelar a verdadeira fonte de todos os problemas: o capitalismo. O problema das redes sociais é o marketing. Por outro lado, o formato de documentário também não ajuda. Tem uma parte dramática com atores que representam uma história familiar maniqueísta e exagerada sobre o vício das mídias sociais cheia de clichês que minam sua credibilidade e acabam fazendo exatamente o que criticam das grandes corporações tecnológicas: condicionar nossa maneira de pensar sobre uma questão. Ainda assim, vale a pena dar uma olhada.

Há quase dez anos, saímos às ruas denunciando que “somos mercadoria nas mãos de políticos e banqueiros” (o que deu origem ao movimento dos 15M). Talvez agora valesse a pena acrescentar ao slogan “e empresas de tecnologia”.

Fonte: https://www.todoporhacer.org/dilema-social/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

velho no banco
corrida de meninos –
passam os anos

Carlos Seabra

[Espanha] A saúde como processo: carta de uma enfermeira familiar e comunitária

Não. Nós, profissionais de saúde, não so

mos super-heróis ou super-heroínas. Para o Estado, nós profissionais da saúde mantemos os corpos produtivos do sistema capitalista tão “saudáveis” quanto possível para que eles sigam sendo forças de trabalho e sigam produzindo capital.

O sistema de saúde não se tornou saturado agora. O sistema de saúde já estava saturado antes do coronavírus e da pandemia do medo. Esta situação excepcional pôs um fim à saturação. Os cortes e a falta de valor que o Estado vem colocando no processo de saúde, na promoção de ambientes saudáveis, no cuidado com a saúde e seus profissionais, tem tornado a situação esmagadora.

Não é lícito que continuemos a manter este sistema sem as condições relevantes para nos proteger, sem o equipamento de proteção apropriado para poder evitar mais contágio. Se formos infectados, infectaremos o resto. E não é a caridade que tem que nos fornecer máscaras feitas à mão. Estamos arriscando nossas vidas, as de nossas famílias e as das pessoas com quem vivemos. A caridade é um remendo que irá legitimar aqueles que estão no topo para manter seu poder. Eles aproveitam a solidariedade do povo para continuar mantendo suas políticas de lixo.

A mídia nos injeta a doença do medo e, em troca, glorifica as pessoas que trabalham como voluntários. Não pode ser a caridade que sustenta o sistema, mesmo que estejamos em uma situação excepcional ou em “estado de alarme”. O capitalismo, o Estado e a coroa nos exploraram e nos enganaram. Eles sobrevivem e ficam ricos às nossas custas.

A saúde como processo: Eles nos querem doentes

O processo de saúde é um processo, como é. Um processo que depende de ambientes saudáveis. Quando falo de ambientes saudáveis, refiro-me à qualidade dos cuidados que podemos dar aos nossos entes queridos, incluindo o tempo e o espaço dedicados à alimentação e à escolha dos alimentos que comemos.

Toda propaganda nos encoraja a “consumir doenças” por prazer. A doença é tão acessível que nos é vendida a partir de máquinas de venda automática de alimentos e bebidas em instituições de saúde, educacionais e de trabalho. Não faz sentido que uma Coca-Cola ou qualquer barra de chocolate custe menos do que dois pedaços de fruta que tenham algum sabor. A crise gustativa promovida e legitimada pela indústria alimentícia tem um grande impacto sobre nosso processo de saúde, sobre a capacidade de tomar decisões sobre o que comemos e sobre os vícios que temos em relação a certos alimentos cujo ingrediente principal é o açúcar. Eles querem que sejamos viciados desde muito jovens. Basta olhar para a publicidade e comercialização de produtos comestíveis destinados às crianças, desde pastelaria até “iogurtes” e sucos que gerarão pacientes potenciais que, mais cedo ou mais tarde, serão carne da indústria farmacêutica.

É bem conhecido que ambas as indústrias andam de mãos dadas e têm uma relação muito boa com o Estado e suas políticas de “promoção da saúde”. Também vale destacar aqui os conflitos de interesse entre a indústria alimentícia, universidades e associações médicas “científicas”, como a Associação Espanhola de Pediatria, a Fundação Espanhola de Nutrição, a Fundação Espanhola do Coração (promovida pela Sociedade Espanhola de Cardiologia), a Sociedade Espanhola de Médicos de Atenção Primária, a Fundação de Diabetes e a Sociedade Espanhola de Endocrinologia e Nutrição, entre outras. A indústria injeta dinheiro e essas sociedades e/ou fundações realizam seus congressos em troca de legitimar seus produtos às custas de nossa saúde.

Ansiedade e depressão na sociedade de hiper-rendimento: A violência neural é sistêmica, é uma violência imanente ao sistema.

O tempo e o espaço para construir laços reais também é saúde. Uma saúde que é cada vez mais difícil para nós. O ritmo acelerado de vida que levamos, o multitarefa, chegar a tempo para tudo: ser uma supermãe, super-trabalhadora, comer super saudável, fazer exercícios, cumprir os ideais de beleza, trabalhar a maior parte do seu tempo e suportar as pressões do seu trabalho e do seu chefe, é um estresse que também terá impacto em nossos processos de saúde e em nosso sistema imunológico.

Isto é bem definido por Byung-Chu Han em seu livro “A Sociedade da Fadiga”, no qual ela distingue a interpretação imunológica da doença de alguns anos atrás – na qual foi declarada guerra a tudo que era estranho (vírus e bactérias) – da “doença neurológica” de hoje – que nos é intrinsecamente dada por superprodução, super-rendimento (trabalho, diversão e sexo) ou comunicação excessiva.

A violência neurológica é sistêmica, é uma violência imanente ao sistema. Uma violência que nos leva à maior causa externa de morte, que é o suicídio. No estado espanhol, em 2019, uma média de 10 pessoas por dia cometia suicídio, uma tendência que vem aumentando desde 2018. São estes suicídios ou assassinatos do próprio sistema em que vivemos? Atualmente, a ansiedade e a depressão não são problemas individuais ou isolados, são uma verdadeira pandemia que está crescendo fora de controle em todo o mundo.

Ansiedade e depressão nos são dadas pela pressão da produtividade e do consumo. O capitalismo nos encoraja a sermos constantemente produtivos, a aproveitar bem o tempo, a “continuar fazendo” e a “ser sempre feliz”. Se você estiver triste, não será produtivo. Por outro lado, querer alcançar “tudo o que podíamos fazer”, “tudo o que o capitalismo nos oferece”, é o que evoca a ansiedade. Exploramo-nos com nossa necessidade imposta de hiper-desempenho. Se não chegarmos a tudo – obviamente é impossível – ficamos frustrados e, com isso, deprimidos.

Ansiedade e depressão juntamente com outras patologias relacionadas à dieta e estilo de vida, como obesidade, hipertensão, diabetes e as comorbidades que geram, não são problemas individuais ou isolados; são problemas coletivos que estão cada vez mais difundidos em todo o mundo. Eles são uma verdadeira pandemia causada pelo capitalismo. Estes corpos, sujeitos a tanta violência, como podem responder a um vírus?

Isolamento não é saúde. Relacionar-se através de telas, tão pouco.

Antes do capitalismo impor a família como modelo organizacional, ele isolou indivíduos para mecanizar seus corpos como força de trabalho. A população estava morrendo de tal escravidão e quase não tinha descendência. As forças produtivas do trabalho eram cada vez menores. Foi então que o capitalismo organizou indivíduos isolados em famílias. O capitalismo criou o modelo familiar para poder controlar mais facilmente a população, abolindo assim qualquer forma de associativismo comunitário que existia até então. Também separou territórios comunitários – da comunidade – em propriedades privadas para as quais cada família trabalharia em troca de dinheiro. Qualquer divergência nos modelos impostos, como a recusa de trabalhar e a mercantilização de suas vidas, levou a que nossos ancestrais fossem queimados na fogueira, especialmente as mulheres que eram consideradas bruxas. Este modelo, que começou a ser imposto por volta do século XV, é perpetuado até os dias de hoje. Muitas pessoas são agora forçadas pelo Estado a viver com seus agressores. Agora, quem tiver uma família, será confinado, confinado à sua casa (quem tiver uma), independentemente de o ambiente em que formos forçados a nos confinar é mais ou menos violento.

Eles nos impõem o isolamento e o individualismo e tornam impossível qualquer tipo de sentimento comunitário. Eles não estão interessados. Referindo-se a Debord, em A Sociedade do Espetáculo:

“O sistema econômico baseado no isolamento é uma produção circular de isolamento. A técnica de isolamento funde e, consequentemente, o processo técnico isola. Desde o automóvel até a televisão, todos os bens selecionados pelo espetacular sistema constituem suas armas para o constante reforço das condições de isolamento das multidões solitárias”.

A saúde é um processo que vai muito além da guerra contra um vírus. O vírus do capitalismo é uma verdadeira pandemia. Junto com o coronavírus, somos injetados com o vírus do medo, da separação: o vírus da rejeição do humano, da individualidade e do individualismo. Eles querem que tenhamos uma distância de mais de 1 metro para colocar uma tela no meio e dificultar cada vez mais a criação de ligações reais. Eles semeiam o medo para nos impor relações virtuais através das telas, tornando as relações cada vez menos humanas. Temos ambientes que realmente promovem a saúde? Ou, pelo contrário, eles nos injetam a doença em uma veia? Somos injetados com doenças através do medo, através da escravidão do trabalho e do consumo. As condições em que somos obrigados a viver são insalubres. As necessidades básicas de uma grande parte da população não são atendidas e, para atendê-las, elas nos obrigam a escravizar nossas vidas. O acesso à moradia é a necessidade mais básica e a mais difícil de atender. Criar as vidas que queremos viver é impensável. Trabalhar para poder consumir em nosso tempo livre é o modelo que eles nos impõem. Criar laços reais é cada vez mais difícil, pois o tempo “livre” também se tornou um espaço para o consumo. Nada disso jamais gerará saúde.

Estado de bem-estar: escravidão e lazer do consumidor.

O Estado social nos garante ter as necessidades mais básicas “cobertas” em troca de escravidão. Não é de graça para nós mantê-lo, nossas vidas vão com ele. O sistema capitalista nos impõe quando temos que ser produtivos e quando podemos desfrutar do lazer do consumidor. Isto não entra em nenhum parâmetro de liberdade além da liberdade de produzir e manter este modelo de sistema, o que não nos favorece em nada. Que sistema vivemos que não é capaz de sobreviver a alguns dias de inatividade produtiva?

É hora de parar e pensar sobre o que estamos fazendo. Sair da roda do hamster e ser criativo para criar a vida que queremos viver, e não aquela que nos é imposta. A vida que eles nos impõem é a que os sustenta, é a que nos deixa doentes ao manter o capital. Trata-se de compartilhar a liberdade, mesmo que estejamos em uma cela.

O povo organizado é muito mais poderoso do que um Estado. Quando pessoas organizadas recebem tempo e espaço para gerar consciência sobre a vida que lhes é imposta, elas podem vir a conhecer as necessidades que têm, e se escolhermos o caminho da cooperação e organização, podemos aprender como resolvê-las sem a necessidade de uma entidade paternalista e protetora: o estado social. Nestes dias de confinamento, pensemos em que vida estamos levando e pensemos em que vida queremos criar, além dos limites que nos foram impostos e que tão internalizados nos foram impostos. Os slogans “trabalho é saúde” e “trabalho dignifica” já passaram para a história. O trabalho nos escraviza. Responsabilidade social, cooperação e apoio mútuo e auto-organização serão o que deslegitimará o Estado e o sistema capitalista, criando um novo e desconhecido modelo de vida, que, embora assustador, se caminharmos juntos, estaremos a cada dia um pouco mais perto da liberdade.

ACL. Enfermeira Familiar e Comunitária.

Fonte: https://aquiyahora.noblogs.org/post/2020/05/10/no9-la-salud-como-proceso-carta-de-una-enfermera-familiar-y-comunitaria/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

o mar o azul o sábado
liguei pro céu
mas dava sempre ocupado

Paulo Leminski

[Itália] Carta da camarada anarquista Francesca Cerrone sobre a greve de fome

“Solidariedade entre os prisioneiros anarquistas”

As condições de detenção nas prisões italianas continuam a piorar; diante da emergência da COVID, as exigências dos presos foram em sua maioria ignoradas, causando revoltas em dezenas de prisões, seguidas de forte repressão, com transferências punitivas e processos criminais. Nessas revoltas, muitos detentos já morreram. A responsabilidade por essas mortes cabe ao Estado. As mudanças feitas pelos sistemas prisionais desde a última primavera significaram em muitos casos uma redução nos contatos com o mundo exterior, reduções nas atividades, isolamento, tornando as condições de detenção cada vez mais inabitáveis. Até o momento, não há sinais de melhoria, mesmo que houvesse tempo para agir sobre a situação. As novas disposições não antecipam nada de bom, com medidas ainda mais restritivas para as seções de alta segurança e uma extensão do uso do regime de tortura lenta 41, que visa quebrar as estruturas básicas das identidades individuais.

Diante de tudo isso, aqueles que ousam ser contra as prisões, contra o Estado que as dirige e contra a sociedade que precisa delas, aqueles que realizam práticas de solidariedade dentro e fora dos muros, estão cada vez mais sendo trancados deste lado dos muros. As últimas investigações anti-anarquistas são claramente uma forma de se opor à solidariedade com os prisioneiros anarquistas.

Entre elas, algumas situações de prisão se destacam por seu caráter particularmente punitivo e insustentável.

Davide Delogu está, de fato, sujeito ao regime do 14a, por nunca ter curvado sua cabeça diante da instituição penitenciária. Apesar de seus pedidos de transferência para outra prisão, ele não foi transferido e, além disso, sua situação se agravou.

Giuseppe Bruna está na seção protegida da prisão de Pavia há mais de um ano, apesar de seus repetidos pedidos de transferência, o DAP (Departamento de Administração Penitenciária) por trás de pretextos não o transferiu.

O sistema patriarcal sobre o qual o Estado e a sociedade são governados revela seus aspectos mais baixos e agudos no mundo das prisões: vemos isso nas piores condições em que os presos são encontrados nas prisões de mulheres em geral, nos estereótipos de gênero aos quais são forçados, na lógica da infantilização e da psiquiatria imposta a elas. Vemos isso no tratamento reservado a nossas camaradas anarquistas, que estão divididas e espalhadas no AS3 na Itália, porque esta é a primeira lógica do patriarcado: dividir as mulheres, porque quando elas se unem, fazem o poder tremer. Vemos isso no tratamento de homens com uma orientação sexual não-normativa, e no de pessoas que não se reconhecem no binarismo de gênero imposto, a quem é dado um lugar entre os infames, pedófilos e estupradores.

Como anarquista, eu certamente não apoio a lógica dos circuitos diferenciais da prisão, assim como não apoio a própria lógica da prisão, à qual me oponho e luto contra. Para que cada tipo de prisão venha a ser destruída.

Enquanto isso, não ficarei em silêncio enquanto os camaradas anarquistas vivem em condições insustentáveis em outras prisões.

Davide e Giuseppe estão lutando por sua transferência para situações mais habitáveis. Eu estou com eles.

Por esta razão, a partir de segunda-feira, 19 de outubro, farei uma greve alimentar na prisão de Latina, onde estou presa.

Por um mundo livre de prisões.

Por solidariedade entre e com os e as prisioneiras.

Pela anarquia.

Fra

Fonte: https://es-contrainfo.espiv.net/2020/11/04/prisiones-italianas-carta-de-la-companera-anarquista-fra-sobre-la-huelga-de-alimentos/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Lentos dias se acumulam –
Como vão longe
Os tempos de outrora.

Buson

[Holanda] Protesto em solidariedade ao anarquista Abtin Parsa em Amsterdam

No último sábado, 7 de novembro, o Grupo Anarquista Amsterdam organizou uma manifestação em relação à situação extremamente perigosa pela qual o anarquista Abtin Parsa do Irã está passando atualmente. A seguir, um breve relato do protesto.
  
Às 14h na Beursplein, em Amsterdam, as pessoas começaram a se reunir. Logo éramos quase 50 pessoas, de diferentes idades e origens, e haviam também várias pessoas de fora de Amsterdam.

Haviam faixas e bandeiras pretas / vermelhas, várias pessoas fizeram cartazes de protesto com papelão. E centenas de folhetos em holandês e inglês foram distribuídos aos transeuntes. Havia um pequeno sistema de som e vários discursos foram feitos ao lado de Abtin, que contou brevemente sobre sua situação. Ele queria enfatizar mais uma vez que esta não é uma luta individual contra o Estado e o capitalismo, mas uma luta coletiva contra a opressão sistemática dos movimentos revolucionários que se opõem ao capitalismo neoliberal assassino e ao hiperindividualismo do Ocidente “democrático” moderno. E que é do interesse de todos que nós, como anarquistas, sempre mostremos solidariedade para com aqueles que lutam contra a opressão em qualquer forma. Que a longa linha histórica do anarquismo sempre foi a linha da guerra de classes, dos pobres contra os ricos, dos trabalhadores contra os patrões, dos impotentes contra os poderosos.

Nem no Irã, nem na Grécia, Abtin deve ficar na Holanda!

A solidariedade é a nossa arma!

Anarchistische Groep Amsterdam / Vrije Bond
aga@agamsterdam.org
agamsterdam.org

https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2020/10/28/grecia-apelo-a-todos-os-camaradas-anarquistas-e-antifascistas-por-solidariedade-para-com-o-anarquista-revolucionario-abtin-parsa/

Tradução > A. Padalecki

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https://noticiasanarquistas.noblogs.org/post/2020/10/28/grecia-apelo-a-todos-os-camaradas-anarquistas-e-antifascistas-por-solidariedade-para-com-o-anarquista-revolucionario-abtin-parsa/

agência de notícias anarquistas-ana

palmo a palmo
dedo a dedo
inicio teu percurso

Eugénia Tabosa

[Chile] Semeando a revolta: reflexões anarquistas a um ano da explosão

E d i t o r i a l

Este compêndio de escritos aparece como uma primeira aproximação de trabalho em conjunto com diversas assembleias anarquistas que se levantaram ao longo do território dominado pelo Estado do Chile, para tornar visível o esforço colaborativo que estamos realizando, expressar nossas experiências e posturas a propósito da comemoração de um ano da revolta de outubro, e poder assim fomentar também os espaços de encontro, diálogo e articulação entre anarquistas. As assembleias que aqui se encontram compartilham a necessidade de construir espaços organizativos ácratas abertos, com ênfase territorial e social, que permitam a participação diversa, ampla e convocante. Além da reflexão ideológica/teórica coletiva fecunda e a práxis permanente e honesta.

Todas estas assembleias, que nascem em contexto de revolta, se focaram em diversos trabalhos de agitação e propaganda, cada uma com as ferramentas que melhor lhe convêm para tensionar o atual conflito social em seus territórios. A crise permanente do capital, que estava tão naturalizada, se viu questionada por muitos, e é a partir desse questionamento generalizado, que emergem diversas expressões de protesto, assim como diversos espaços que se posicionaram desde o autoconvocado, auto-organizado, sem partidos nem governos, pela defesa dos territórios e a projeção política de satisfazer de forma autogestionária nossas necessidades.

A revolta e todo o ano que passou nos deixa cheios de ensinamentos e desafios que talvez ainda não conseguimos dimensionar em sua totalidade, mas que fizeram nos  encontrarmos e organizarmos para analisar, assumir e enfrentar coletivamente. Passo a passo, sem pressa, mas com a convicção de que virão tempos de luta e disputa e de que o anarquismo tem e deve contribuir com ideias, ferramentas, propostas e ações que suscitem o fortalecimento das comunidades organizadas e o desenvolvimento da autogestão generalizada da vida social, desmantelando a lógica do patriarcado/estado/capital e suas hierarquias.

A um ano da revolta, sabemos que fica muito por fazer, que as possibilidades estão abertas e que isto recém começa.

Que viva a Anarquia!

Asamblea Anarquista del Bio-bío, Asamblea Anarquista Autoconvocada de Valparaíso, Asamblea Libertaria de Santiago, Asamblea Libertaria Cordillera, Asamblea Anarquista Chuchunco

>> Baixe a publicação aqui:

https://lapeste.org/wp-content/uploads/2020/10/Boletin-Sembrando-la-revolta.pdf

Tradução > Sol de Abril

agência de notícias anarquistas-ana

árvore seca
a lua é a mosca
em sua teia

Aclyse de Mattos

[Espanha] A agenda libertária é reativada após a quarentena!

A pandemia a nível mundial, ao menos por um tempo, levou a uma paralisação de nossas vidas em muitos níveis. Também em Madrid, as agendas de muitas pessoas foram deixadas vazias, e a agenda libertária não tem sido diferente.

Entretanto, consideramos importante que esta situação não tire os poucos espaços de reunião que nos restam, nem a oportunidade de criar novos; que não relegue todos os debates e experiências coletivas para o coração das redes sociais. É por isso que, após um período de espera – que também aproveitamos para uma pequena reestruturação – estamos colocando a agenda em marcha novamente.

Talvez não tenhamos o volume frenético de eventos que nos ocupavam antes da pandemia, e talvez também possamos usá-lo como uma oportunidade para sairmos de nossos próprios círculos e espaços. É por isso que vamos continuar, publicando as convocatórias que recebemos, e os encorajando a nos enviar as suas, caso estas iniciativas surjam.

Ajude-nos a criar este espaço para a convergência de diferentes ambientes antiautoritários, para gerar uma alternativa às redes sociais e aplicações de mensagens instantâneas. Você pode nos enviar as convocatórias por correio e também divulgar nossa página em suas próprias redes.

Pela anarquia!

agendalibertariamadrid.espivblogs.net

agendalibertariamadrid(a)riseup.net

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

Na casa do avô
Havia tantos pernilongos
Em noites como esta!

Paulo Franchetti

[EUA] 16 coisas que você pode fazer para ser ingovernável. PS: Foda-se Biden

Indigenous Action (Ação Indígena) examina maneiras fundamentais das pessoas “voltarem ao básico” à medida que a era Trump chega ao fim.

Somos ingovernáveis em terras roubadas. Foda-se Biden.

Biden substituiu Trump. Enquanto alguns estão celebrando uma forma “mais segura” de violência colonial, estamos nos preparando para o reinício da guerra.

Não é apenas porque Trump intensificou o nacionalismo autoritário da supremacia branca (também conhecido como fascismo) e quase continuou seu legado explicitamente brutal, não é só que os colonizadores liberais mal abriram seus caminhos para a vitória. É que, no final das contas, Trump e Biden são as duas faces da mesma moeda. Estaremos mais uma vez sujeitos àquela lúgubre diminuição do fervor político pós-eleitoral até que a maré liberal recue e sejamos confrontados com a mesma violência ecológica e social de antes.

O governo Obama-Biden foi responsável pela deportação de mais pessoas do que qualquer outro regime dos EUA na história. Entre 2009 e 2015, Obama-Biden deportou à força mais de 2,5 milhões de pessoas, o que representa mais do que a soma das deportações de todos os outros presidentes do século XX. As comunidades de Tohono O’odham e Hia Ced O’odham foram fortemente militarizadas e divididas ao meio pela fronteira colonial EUA / México. Aldeias inteiras foram desalojadas e locais sagrados foram profanados em várias comunidades indígenas ocupadas na fronteira. Isso foi agravado pelo “muro da fronteira” de Trump, mas a militarização da fronteira e a ocupação colonial de terras indígenas continuarão, estejam os EUA sob controle republicano ou democrata. Os colonizadores estão unidos em suas crenças e práticas do colonialismo. O regime Obama-Biden não foi um adiamento para aqueles que foram bombardeados e atacados por drones, o que, no Afeganistão, significou o assassinato de vidas inocentes em 90% das vezes. Não podemos comemorar quando sabemos que com Biden (ou quem quer que seja), o imperialismo dos EUA e a guerra sem fim contra os negros em todo o mundo continuarão.

Biden se apresentou como o restaurador de uma “normalidade” sob a qual estávamos sendo mortos, agredidos, desaparecidos, bombardeados, poluídos, encarcerados, empobrecidos e profanados. Um retorno ao normal neoliberal é um retorno à morte para povos indígenas, negros e pardos em todo o mundo.

Há um discurso sobre o menor dos males e uma diatribe sobre esperança em algum lugar ali, mas esses temas foram gravados em nossa carne de forma que nossa pele perdeu a capacidade de cicatrizar. É como se nossos corpos fossem a terra profanada a cada ciclo de nosso agressor. No caso da política eleitoral, o ciclo não é contestado e nem o abuso. Se é preocupado apenas com o grau em que o véu cobre as feridas. A questão não é ver o abuso, é ver o efeito que move a zona de conforto para quase o perturbador.

Recusamos a dominação, o controle e a exploração dessas terras pelas forças coloniais desde 1492. Ser ingovernável significa que não juramos lealdade à autoridade colonial nem dependemos de seus sistemas para nossa sobrevivência, identidade, pertencimento ou bem-estar.

Diante da COVID-19 e do fascismo mais aberto, celebramos as expressões poderosas de ação direta e intervenções não mediadas contra o capitalismo, a supremacia branca, o cis-heteropatriarcado e o estado policial colonial. Dos poderosos levantes do Black Lives Matter à demolição de estátuas racistas, de zonas autônomas a milhares de projetos de apoio mútuo em Turtle Island fornecendo suprimentos e apoio necessários, nossas comunidades têm atuado diretamente e construído infraestrutura alternativa por gerações para não sermos dependentes do estado ou de empresas.

Procuramos organizar e intervir o mais diretamente possível nas causas profundas que sustentam ordens sociais opressivas, enquanto trabalhamos para construir e apoiar criativamente alternativas baseadas no apoio mútuo, dignidade e autodeterminação coletiva para além do capitalismo. Somos ingovernáveis e devemos tornar impossível para este sistema colonial governar em terras roubadas e ocupadas. Construir, sustentar e proliferar organizações e organizações autônomas e abraçar seu papel nessas lutas.

16 coisas que você pode fazer para ser ingovernável:

• Crie um grupo de afinidade.

Um grupo de afinidade é um pequeno grupo de 5 a 20 pessoas que trabalham juntas de forma autônoma em ações diretas ou outros projetos. Os grupos de afinidade geralmente consistem em pessoas com ideias semelhantes que se reúnem para realizar algo. Se vocês já tem um grupo de afinidade, vinculem e unam esses grupos!

• Desenvolva Habilidades.

Desligar-nos do capitalismo e dos aparatos coloniais exige que aprendamos como fazer coisas para nós mesmos e uns para os outros, para além de comprar, vender, trabalhar ou pedir ajuda ao Estado. Da autodefesa e da defesa coletiva à jardinagem, construção de bicicletas, desescolarização e o cuidado uns para com os outros – podemos aprender e compartilhar uma habilidade. Podemos mudar a forma como valorizamos as habilidades e desmantelar hierarquias de classe e capacidade.

• Estabeleça e pratique uma boa cultura de segurança.

A cultura de segurança é necessária para sobreviver à repressão do Estado. Podemos impedir muita infiltração e desinformação desde o começo, melhorando nossas formas de comunicação e navegação de conflitos. Ainda podemos ser horizontais e transparentes sem sacrificarmos a segurança e a proteção.

• Pratique uma justiça transformadora e restaurativa.

Comunidades fortes tornam a polícia e as prisões obsoletas. Podemos mudar nossa cultura para prevenir a violência e o abuso. Podemos desenvolver nossas capacidades para enfrentar e resolver conflitos. Podemos fortalecer nossos laços e desintoxicar nossos relacionamentos para que os danos não tenham espaço para crescer em nossas comunidades.

• Apoio mútuo.

Comece um grupo de apoio mútuo e forneça o suporte necessário para aqueles que precisam. A organização de apoio mútuo pode garantir que nossas comunidades não sejam dependentes de corporações e do Estado. Mude o uso de recursos para coisas que você pode cultivar e fazer ou adquirir de outros resistentes. Construa redes de ajuda e recursos para além do capitalismo.

• Defesa mútua.

De treinamento com armas à táticas de rua, intervenções de observadores e equipes de segurança, precisamos ter as habilidades e recursos para defender nossas comunidades de ataques fascistas ao nosso povo, seres não humanos e terras.

• Construir e manter infraestrutura de conflito.

Infraestrutura de conflito é qualquer estrutura que organizamos para ajudar a sermos mais eficazes em nossas lutas. Essa é uma infraestrutura que vai além de apenas fornecer conscientização e serviços, mas que constrói nossa capacidade de enfrentar uma resistência real. De hortas comunitárias e fazendas coordenadas coletivamente a infoshops e comunicações independentes de mídia.

• Criem ocupações para povos desabrigados.

Aluguel é roubo. A propriedade privada é a violência colonial sobre a terra. É preciso abolir o aluguel e a propriedade privada, e rematriar as terras aos cuidadores originais. Crie espaços para viver para além dos proprietários.

Defenda e recupere terras ancestrais.

Porque #landback significa acabar com a ocupação colonial e restaurar a gestão indígena de nossas terras ancestrais. Regenerar nossas relações sagradas, e tudo o que implica espiritual e materialmente, para com nossa pátria original. Liberte o sagrado.

• Reparações.

Pegue o que foi roubado dos Povos Negros e Indígenas e libere de volta. A redistribuição radical é necessária.

• Acabe com essa merda.

Intervenham na infraestrutura crítica dos pontos onde o capitalismo e o colonialismo estão mais vulneráveis. Tomem as ruas, fábricas, portos, blocos de fracking, oleodutos, usinas de energia, quebrem as fronteiras, sejam inteligentes e criativos! Isso também é uma forma eficaz de atacar as indústrias que perpetuam as mudanças climáticas.

• Seja ferozmente interseccional.

Porque não vamos levar esses velhos comportamentos de merda conosco. Foda-se a anti-negritude, foda-se o orientalismo, foda-se a islamafobia, foda-se o anti-semitismo, foda-se a transfobia, foda-se o heteropatriarcado, foda-se a supremacia branca, foda-se o imperialismo, foda-se o capacitismo, foda-se a hierarquia, foda-se o racismo, foda-se a cidadania, foda-se o privilégio, foda-se a merda toda!

• Pratique Auto-cuidado Radical e Coletivo.

Para permanecermos perigosos para o poder, devemos cuidar de nós mesmos e uns dos outros.

Aprenda quais são os gatilhos comuns e como se comunicar sem falar merda. Aprenda a comunicar suas necessidades, limites e desejos de maneira eficaz e não tóxica – lembre-se de que as pessoas na luta e na resistência têm mais dificuldade em acessar recursos para cuidados mentais e espirituais. O trabalho dentro do movimento pode ser insustentável para aqueles com muitas experiências de policiamento colonial e gatilhos de violência – encontre maneiras de comunicar e negociar as normas e limites do grupo de forma que acomodem as necessidades das pessoas, quando for razoável. Identifique padrões de comunicação tóxicos e aprenda / crie maneiras de desmantelá-los e de se comunicar de maneiras mais saudáveis e menos prejudiciais. Seja honesto sobre suas limitações e cuide de si mesmo e dos outros. O Estado colonial cristianizado e capitalizado nos ensinou a nunca descansar ou curar. Rejeite qualquer tentativa de coagir as pessoas a irem além de seus limites. O autocuidado radical nos mantém seguros e invulneráveis quando nos engajamos consistentemente em agitar a governabilidade por parte do Estado.

• Torne tudo acessível para todos.

Rejeite o capacitismo e a objetificação de nossos corpos e vidas, estabeleça redes de cuidados comunitários com pessoas equipadas para fornecer primeiros socorros e suporte de cuidados em um espectro completo de necessidades. Desafie o capacitismo do nosso idioma, como nos organizamos e como valorizamos uns aos outros. Todos nós somos bons o suficiente.

• Abolir a cultura do estupro.

Estude o estupro e a cultura do estupro e como isso se relaciona com a profanação de terras sagradas. Transforme nossa cultura e práticas em torno do namoro, humor, relacionamentos, sexualidade, consentimento, festas, trabalho sexual e brincadeiras para a abolição da cultura do estupro. Responsabilize mactivistas, estupradores, abusadores, oportunistas e canalhas. Concentre no consentimento e nos relacionamentos saudáveis em tudo o que fizer e em todos os lugares.

• Espalhe alegria radical e militante.

Podemos destruir essa porra toda enquanto dançamos, cantamos, festejamos, rimos, brincamos, nos maravilhamos, temos conversas profundas, contamos histórias, fazemos arte, fazemos amor, fazemos mágica, fazemos brilho, fazemos maravilhas e nos divertimos.

Fonte: https://itsgoingdown.org/16-things-you-can-do-to-be-ungovernable-ps-fuck-biden/

Tradução > A. Padalecki

agência de notícias anarquistas-ana

Sobre o monte liso
contra o céu uma só árvore.
Gesto de vitória!

Alexei Bueno

 

 

[Espanha] Sobre a chegada em Madrid das delegações Zapatista, da CNI-CIG e da Frente Popular em Defesa da Água e da Terra de Morelos, Puebla e Tlaxcala

Companheiras, companheiros, companheiras zapatistas,

Mais uma vez estamos surpresos e entusiasmados ao ouvir sua palavra, calma, precisa, excitante, sísmica, rebelde, profunda, sábia. Há muitos de nós que, tanto de nosso sindicato como da CNT como um todo, temos seguido vocês por anos, décadas, lendo, escutando e admirando vocês. Também temos compartilhado reuniões internacionais, galácticas e extra-galácticas em suas comunidades e caracóis. Embora, como organização, não conseguimos estruturar este apoio, que esperamos resolver em breve, temos acompanhado seus passos e refletido sobre suas comunicações desde 1º de janeiro de 1994. Nós os temos em mente em nosso dia-a-dia, tanto em assuntos “meramente” organizacionais como no nível da utopia, tão importante para nossa jornada e talvez um tanto esquecida.

A necessidade de atender ao imediato e ao concreto em cada luta, a situação de emergência social que só está piorando, a doutrina do choque que a hidra capitalista aplica às nossas vidas e a urgência de fazer com que os fins se cumpram, nem sempre é fácil encontrar tempo e energia para olhar um pouco mais além e imaginar como será esse mundo no qual muitos mundos se encaixam. Como nos aproximar, em nossa geografia e calendário, daquele novo mundo que carregamos em nossos corações.

Nesse sentido, sua dignidade rebelde, o confederalismo democrático de nossas camaradas curdos ou tantas outras experiências e conhecimentos de luta nos cinco continentes, estão provando que a vida pode realmente vencer o dinheiro. Que a alternativa para esta velha desordem mundial é através da autonomia dos povos, através do transfeminismo e do descolonialismo, da ecologia e do cooperativismo. Já não mais os antigos Estados-nação, nem o extrativismo, nem o consumismo, nem o individualismo, nem o livre mercado, não mais.

Talvez nos últimos anos tenhamos nos tornado cada vez mais conscientes dos muitos problemas que antes não estavam sequer sobre a mesa, nos fortalecendo cada vez mais com todas aquelas vozes que antes não eram ouvidas, todas aquelas comunidades que longe de serem minorias, nós somos a maioria. É claro que ainda há muito a ser feito, e é complexo.

Como podemos articular as resistências e rebeliões contra nosso inimigo comum, a modernidade capitalista, levando em conta que este mesmo inimigo nos coloca em lugares muito diferentes, hierarquizando nossas vidas através destes muitos sistemas que é o sistema: o cisheteropatriarcado, o sistema racista-colonial, o próprio capitalismo de classe e ecocida… Ou seja, como ser camaradas apesar dos (des)privilégios que nos cruzam, para juntos pararmos com este massacre e fazermos valer a pena viver e não valer a pena viver.

Juntamente com todos os coletivos e organizações desta Madrid rebelde, popular e libertária, a Madrid do PAH e os grupos habitacionais, dos coletivos feministas, antirracistas e LGTBQ+, das organizações de migrantes, dos sindicatos de base, das plataformas em defesa dos serviços públicos, a Madrid de baixo e à esquerda, gostaríamos de participar da organização da acolhida, apoio e acompanhamento que as delegações indígenas podem precisar, que do México, 500 anos após a suposta conquista, virão à nossa cidade e ao nosso continente, para nos dizer que ainda estão lá, vivendo, isto é, resistindo. Nós os esperamos com alegria e nervosismo. Organizando-nos.

Com a permissão do falecido Sub-Marcos, do Subcomandante Insurgente Moisés, do Comando Geral do EZLN e de todas as bases de apoio Zapatista, dizemos até mais adaptando um clássico…

Desde os bairros do sudeste de Madrid

CNT Comarcal Sur Madrid

Fonte: https://www.cnt.es/noticias/sobre-la-llegada-a-madrid-de-las-delegaciones-zapatistas-del-cni-cig-y-del-frente-de-pueblos-en-defensa-del-agua-y-de-la-tierra-de-morelos-puebla-y-tlaxcala/

Tradução > Liberto

agência de notícias anarquistas-ana

na folha orvalhada,
gota engole gota,
engorda, desliza e cai.

Alaor Chaves

Os anarquistas e as eleições

Uma pressão exorbitante foi posta sobre o anarquismo nas eleições de 2018, no Brasil, e possivelmente será posta nas eleições de 2022. O país já vivenciou diversos modos do governo se colocar diante de seu povo: ditaduras, governos militares e regimes democráticos, mas esta experiência que estamos vivendo com o governo Bolsonaro, o fascismo, conhecíamos somente através dos livros, no Brasil, com o Integralismo e o Estado Novo de 1937. A crítica mais ferrenha é aquela que nos responsabiliza, junto aos bolsonaristas, por levar Bolsonaro ao poder.

Bolsonaro, o clã Bolsonaro, e seus seguidores são realidades que não se limitam à democracia representativa, não são – como todo fascismo – passíveis de conversação e negociação, cedo ou tarde, a sociedade irá perceber a ignorância e o perigo que alimentam estes grupos, e irá decidir o destino do qual são merecedores.

Do ponto de vista mais próximo, a eleição propriamente dita, a lição que ela nos dá, “repisa” sempre as mesmas coisas: 1º) aquela que o repulsivo Hitler nos deixou, é possível chegarmos ao fascismo pela via do voto, na democracia; 2º) não há, depois da desaparição da União Soviética e do socialismo autoritário, uma oposição entre democracia e capitalismo; a democracia é mais uma forma de governar o capitalismo, como as ditaduras, formas equivalentes se, economicamente, produzem o lucro; 3º) entramos em uma nova fase de organização política do capitalismo, o Lawfare onde os dispositivos jurídicos entram em conluio com dispositivos midiáticos e parlamento para governar seja por meios democráticos, seja por meios golpistas.

De um ponto de vista mais longínquo, do olhar e da utopia anarquista, desde a desilusão de Proudhon com o Parlamento e após as revoluções de 1848, o anarquismo busca um outro tipo de democracia. O anarquista repudia a democracia representativa – baseada no voto – e defende, em seus escritos e em suas ações, a “democracia direta”, experiência permanente de autogoverno da sociedade, sem a necessidade histórica da existência do Estado.

Assim, pedir para que um anarquista vote, é como pedir que nos esqueçamos a ideia anarquista de “democracia direta”, e assumamos uma democracia duvidosa, a democracia representativa – que só é festejada no dia da eleição, e nos dias posteriores, passe a ser alvo – com razão – da indignação e do  sentimento de traição, por parte dos eleitores.

Pedir ao anarquista que vote é desrespeitar um dos princípios fundamentais de sua existência, o primeiro passo – o voto nulo – de sua Revolução Política.

A “democracia” que o anarquista vislumbra não tem compromisso algum com as “democracias representativas”, construídas com eleições normais ou fraudulentas; não nos peça que votemos; peça-nos outra coisa! Melhor, não peça, junte-se ao NÓS enquanto coletivo humano. Demonstre que a solidariedade na ação direta é possível entre trabalhadores, homens e mulheres, lgbtq para pôr fim ao capitalismo e construir esta sociedade inteiramente nova, baseada na autogestão e na democracia direta. Na Comuna de Paris de 1871, na Guerra Civil Espanhola da década de 1930 com os anarquistas, a utopia mostrou-se possível. Não tema, não se culpabilize!

Sempre: Vote Nulo!

Edivaldo Vieira da Silva

Prof. Doutor em Ciências Sociais pela PUC/SP

09/11/2020

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agência de notícias anarquistas-ana

Esqueletos de árvores,
lampiões rodando no vento,
no chão, sombras, bêbadas.

Alexei Bueno

Memória | Empastelamento do jornal ‘A Plebe’

Por Marcolino Jeremias | 09/11/2020

No dia 31 de outubro de 1919, estudantes almofadinhas de direito de São Paulo (SP) invadiram e destruíram as oficinas onde era feito o jornal anarquista ‘A Plebe’. Somente estavam no local Edgard Leuenroth e Afonso Schmidt, que conseguiram escapar por pouco.

No dia seguinte ao empastelamento de ‘A Plebe’, o jornal reaparecia com a seguinte manchete em primeira página: “A Plebe é imortal como a Fênix da velha lenda, ela renasce das próprias cinzas”. Na véspera, muitas caixas haviam sido empasteladas e o diário apareceu com uma impressão muito precária, em virtude dos estragos sofridos, porém a voz popular dos anarquistas não se calou!

Nessa poesia (imagem em destaque) escrita pouco depois, Afonso Schmidt, recorda o empastelamento de ‘A Plebe’, quando tudo que havia dentro das oficinas do periódico foi atirado na rua e queimado numa fogueira. Milhares de cópias do livro “O Que é o Maximismo ou Bolchevismo” de Edgard Leuenroth e Helio Negro foram queimados, contudo muitas centenas deles foram apanhados por populares.

agência de notícias anarquistas-ana

Arrastar espantalhos pelo chão
é o que a tempestade
faz primeiro.

Kyoroku