Nos dias 2 e 3 de Abril de 2018, o Partido Obrero (PO) da Argentina organizou uma conferência em Buenos Aires em nome do Comitê Coordenador para a Refundação da Quarta Internacional (CRQI).
As tentativas de “refundar” ou “reconstruir” a Quarta Internacional, fundada por Leon Trotsky em 1938, não são novas. O Partido Obrero esteve envolvido em tais esforços por cerca de 45 anos, desde a sua aliança com a OCI (Organização Comunista Internacionalista) francesa de Pierre Lambert na década de 1970, no que ficou conhecido como CORQI (Comitê de Organização pela Reconstrução da Quarta Internacional). Esse empreendimento desmoronou quando Lambert virou-se para o Partido Socialista na França e a todos os tipos de movimentos nacionalistas burgueses de direita na América Latina, ao mesmo tempo que denunciava seus antigos aliados do CORQI como agentes da polícia. O PO se aliaria mais tarde à tendência Pablista extrema da Argentina, liderada por Nahuel Moreno, numa tentativa igualmente abortiva – e ainda mais curta – de “refundação”.
Todas essas alianças efêmeras se baseiam em um comum acordo segundo o qual a Quarta Internacional não existe, e até mesmo nunca existiu. O que realmente significa “reconstrução” é a fusão de organizações politicamente heterogêneas, sem qualquer acordo sobre questões essenciais de programa e estratégia. A única questão em torno da qual essas organizações absolutamente concordam é o direito de cada uma delas levar adiante qualquer política nacional que seja considerada melhor para si mesma. Essa abordagem totalmente sem princípios da política não tem absolutamente nada em comum com o Trotskismo. Sua atitude em relação às experiências e lições acumuladas pela Quarta Internacional desde 1938 se define por uma combinação de hostilidade política, indiferença teórica, oportunismo nacional míope e a mais bruta ignorância.
A história da Quarta Internacional, para essas organizações, não tem significado objetivo e não há nada a ser estudado e aprendido sobre ela. Tudo o que Trotsky escreveu em sua luta contra o Stalinismo e uma miríade de formas de centrismo e oportunismo pertence ao passado distante e pode ser ignorado. Por sua vez, as lutas políticas travadas pela Quarta Internacional contra as tendências revisionistas anti-Trotskistas – principalmente o Pablismo e o Shachtmanismo – são vistas como politicamente sem sentido. Assim, não deve haver exame ou discussão do papel desempenhado por esses partidos e tendências anti-Trotskistas nas lutas políticas dos últimos 80 anos. As traições e crimes do passado podem ser esquecidos. Uma anistia geral é concedida a todos, permitindo que comecem de novo com uma ficha limpa.
O encontro de Abril em Buenos Aires foi muito além de qualquer evento anterior na sórdida história política de tais exercícios de “refundação” e “reconstrução” da Quarta Internacional. Jorge Altamira, líder do Partido Obrero, e Savas Michael-Matsas, secretário geral do EEK (Partido Revolucionário dos Trabalhadores) grego, declararam que a Quarta Internacional reconstruída deveria incluir organizações pró-Stalinistas na Rússia. Para eles, os crimes cometidos pelos regimes Stalinistas – incluindo o assassinato de centenas de milhares de comunistas e o assassinato do próprio Trotsky – devem ser esquecidos em nome da “unidade”. Uma ponte deve ser construída sobre o “rio de sangue”, que, nas palavras de Trotsky, separou o Trotskismo do Stalinismo.
A proposta de reconciliação entre o Stalinismo e o Trotskismo encontrou expressão concreta no convite estendido pelo CRQI a Darya Alexandrovna Mitina, líder do Partido Comunista Unificado da Rússia (OKP), um partido radicalmente pró-Stalinista. Ela participou integralmente das discussões do CRQI e foi convidada a realizar um dos principais discursos para os membros do PO no encerramento da conferência. Quem providenciou o convite a Mitina para a conferência foi Michael-Matsas, que mantém uma estreita relação política com ela há mais de uma década.
Mitina e Michel-Matsas na conferência de Buenos Aires
Mitina concordou com a construção de uma “nova internacional para melhor coordenar a luta de classes em diferentes países” e organizar “ações de solidariedade internacional”. Seu discurso foi calorosamente recebido pelo público, que, em grande parte, não sabia nada sobre as afiliações e atividades políticas de Mitina, sem falar no programa e na história do OKP. Nós vamos passar pelos fatos que foram ocultados por Altamira e Michael-Matsas da base do PO.
O Partido Comunista Unificado da Rússia surgiu em 2014 como uma cisão do Partido Comunista da Federação Russa (PCFR), liderado por Gennady Zyuganov. As diferenças entre o OKP e a organização nacionalista e chauvinista de Zyuganov, que é um aliado político do regime de Putin, são de caráter tático. Como o partido de Zyuganov, o OKP glorifica Stalin e justifica seus crimes. Um artigo recentemente publicado na página eletrônica do OKP declarou:
Foi Stalin quem continuou o trabalho do grande Lênin, reunindo em torno de si um grupo de persistentes e fiéis bolcheviques. Foi sob sua liderança que a industrialização socialista, a coletivização da agricultura e a revolução cultural foram realizadas. Stalin expôs e derrotou os partidários de um retorno ao capitalismo: os Trotskistas, Zinovievistas, Bukharinistas, vários nacionalistas burgueses e outros capituladores.
O OKP luta pelo “renascimento da União Soviética” e elogia a Constituição Soviética de 1936, também conhecida como a “Constituição de Stalin”, um documento reacionário adotado na véspera dos processos de Moscou e do lançamento do Terror de 1936-1940. O principal objetivo político do OKP é empurrar o PCFR de Zyuganov, que busca a “re-Stalinização” da Rússia em aliança com a Igreja Ortodoxa, para a esquerda.
Manifestação do Partido Comunista Unificado da Rússia
Darya Mitina é uma agente política de longa data do Stalinismo com profundos laços com o Estado russo. Ela é a neta do primeiro-ministro afegão, Mohammed Yusuf, mais tarde nomeado embaixador na União Soviética. De acordo com sua biografia na Wikipédia:
Desde 2014, ela é secretária responsável pelos assuntos internacionais do partido e membro da Comissão Política do Partido Comunista Unificado (Rússia).
Foi deputada da Duma Estatal na segunda convocatória (1995 – 1999). Durante as eleições para a Duma Estatal de 2016, ela foi candidata dos “Comunistas da Rússia” no distrito eleitoral de Cheremushkinskiy, mas não se elegeu.
Ela é a primeira secretária do Comitê Central da Liga da Juventude Comunista Russa (Komsomol), e foi uma das fundadoras em 1993.
Entre Maio e Agosto de 2014, Mitina foi a representante do Ministério das Relações Exteriores da República Popular de Donetsk, em Moscou.
Mitina com tropas em Donetsk
Como secretária de assuntos internacionais do OKP, Mitina foi incumbida de cultivar conexões internacionais em nome do Estado russo com uma ampla gama de organizações Stalinistas, Pablistas, nacionalistas burguesas e anti-imigrantes.
Eu uma recente viagem, Mitina reuniu-se com representantes do Euro-Rus, um grupo de direita que promove a unidade da Europa com a Rússia a partir dos “valores familiares”, do “direito à vida”, do “protecionismo nacional”, da “proteção das fronteiras europeias” e do nacionalismo branco. Suas extensas viagens indicam substancial apoio financeiro. Desde que deixou Buenos Aires, ela foi para a China, Vietnã e Nepal, encontrando-se com funcionários de Estado, assim como com militantes de partidos Stalinistas e Maoístas.
Mitina com Kris Roman (o mais idoso de paletó), líder do Euro-Rus
Em 5 de Março de 2018 – apenas um mês antes de viajar para a Argentina para participar da Conferência de Refundação organizada pelo PO –, Mitina participou de um homenagem pública a Joseph Stalin por ocasião do 65º aniversário da morte do ditador. Ela e outros membros do OKP honraram a memória de Stalin, ao lado de grupos de Stalinistas, nacionalistas russos, chauvinistas anti-imigrantes e neofascistas, colocando flores sob o túmulo de Stalin na parede do Kremlin. Mitina e seus companheiros do OKP também colocaram coroas nos túmulos dos sucessores de Stalin, Leonid Brezhnev e Yuri Andropov.
Mitina orgulhosamente comemorou a celebração com um post em seu blog, escrevendo: “65 anos atrás, um homem que, até hoje, ninguém pode estar em pé de igualdade. (…) Estou com Josef Vissarionovich [Stalin] ... e duas vezes por ano levo flores ao monumento.”
Alguém que vai duas vezes por ano colocar flores no túmulo de Stalin pode ser apenas descrito como um miserável reacionário político, e qualquer um que lhe forneça uma plataforma política é seu cúmplice.
A presença de Darya Alexandrovna Mitina na conferência do PO não foi um acidente. Uma aliança com tais forças é um componente importante da “Refundação” planejada por Altamira.
Em seus comentários na conferência, Altamira justificou a presença da representante do OKP, declarando:
Nós não estamos construindo uma internacional do tipo “faça você mesmo”; isto é, uma extensão de uma seita política de um país para outros países mais ou menos vizinhos ou mais ou menos distantes. Nessa luta política, na plataforma de hoje, vocês presenciaram uma camarada que fala em nome da tradição do comunismo na Rússia, que para ela seria o Stalinismo. ... Estamos realizando discussões políticas com esses camaradas para saber se todos podemos trabalhar juntos para dar um passo à frente na construção de uma Internacional, de maneira que a Rússia possa voltar a ser, como foi por um longo período histórico, o território da Revolução de Outubro.
Com essas palavras, Altamira repudia não apenas o programa e os princípios historicamente enraizados da Quarta Internacional, mas o significado da própria história. O que ele está dizendo equivale a uma declaração de que o que aconteceu no passado não tem importância para o presente. Para Altamira, o fato do regime Stalinista ter assassinado centenas de milhares de comunistas, realizado inúmeras traições e levado, no limite, à destruição da União Soviética não deveria impedir a colaboração com os Stalinistas de hoje na reconstrução da Quarta Internacional.
Na prática, essa abordagem totalmente pragmática da política abre a possibilidade de colaborar com praticamente qualquer organização política, tendência ou pessoa. O que quer que tenham feito no passado deve ser considerado sem qualquer importância particular, muito menos duradoura. Os crimes do passado podem ser encobertos como erros infelizes e até mesmo lamentáveis, mas essencialmente não relacionados à sua identidade política atual. A única coisa que realmente importa é encontrar pontos de acordo sobre determinadas tarefas práticas particulares, ainda que mínimas e conjunturais, aqui e agora.
E se esse método de negociação política oportunista pode ser aplicado a partidos Stalinistas, cujas histórias estão mergulhadas em traições e crimes, por que não pode ser aplicado a todas as organizações, incluindo as nacionalistas e até mesmo fascistas? De fato, o verdadeiro propósito atual dos esforços de Altamira para forjar relações com organizações Stalinistas e neo-Stalinistas é legitimar a colaboração política precisamente com tais forças, não apenas na Rússia, mas internacionalmente.
A principal característica das organizações Stalinistas, especialmente na Rússia, é o seu caráter nacionalista. Qualquer que seja o palavreado “comunista” que empregam ocasionalmente, não é mais do que o mais fino verniz para cobrir o chauvinismo russo. A glorificação de Stalin como um grande líder nacional tem muito mais em comum com o fascismo do que qualquer coisa que possa ser legitimamente descrita como socialista.
Savas Michael-Matsas, secretário geral do EEK grego e principal aliado do Partido Obrero na Europa, desempenhou o papel de intermediário, fazendo a ligação entre o partido argentino e Darya Mitina, embaixadora itinerante de Putin para organizações oportunistas de “esquerda” dispostas a jogar a carta nacionalista.
As relações políticas entre Michael-Matsas e Mitina remontam há mais de uma década. Ela foi convidada para falar em uma reunião do EEK na Grécia no 90˚ aniversário da Revolução de Outubro em 2007. Dois anos depois, ela relatou em seu blog que junto com seu marido, Said Gafurov, foram apanhados no aeroporto por Michael-Matsas em Atenas quando chegaram para uma reunião de Setembro de 2009 do comitê organizador do Fórum Social Europeu, “onde representamos a Rússia”.
Darya Mitina e Savas Michel dividem a mesa em um encontro de 2007 na Grécia
Said Gafurov, como sua esposa, possui estreitos laços com o Estado russo. Ele trabalhou em vários ministérios e serviu como editor-chefe adjunto de uma revista econômica mensal russa conhecida por seu forte apoio a Vladimir Putin. Ele realiza transmissões regulares em árabe em apoio aos interesses geoestratégicos russos e é comentarista da página eletrônica pró-Stalinista pravda.ru.
“Representar a Rússia” no Fórum Social Europeu significa defender os interesses do Kremlin em um meio que reúne ONGs, agências de inteligência e representantes de governos, juntamente com várias organizações de “esquerda”.
Mitina ajudou Michael-Matsas a estabelecer amplas conexões entre os círculos Stalinistas na Rússia. Em 2017, ele foi convidado a participar de um congresso em São Petersburgo dedicado a unir os “Partidos Comunistas” da Rússia e de outras ex-repúblicas soviéticas.
Esses esforços aparentemente começaram a dar frutos. O OKP anunciou recentemente que a organização Rússia Trabalhadora incitou seus membros em Moscou para juntarem-se ao partido. A Rússia Trabalhadora, liderada até sua recente morte por Viktor Anpilov, é conhecida por seu extremo nacionalismo e antissemitismo. Participou de eleições sob a bandeira do “Bloco Stalinista” em aliança com o neto de Stalin.
Quem é Savas Michel-Matsas?
Embora Michael-Matsas tenha participado de conferências organizadas pela PO ao longo de duas décadas, o partido argentino nunca deu aos seus membros uma avaliação séria da história política desse indivíduo. Ele foi apresentado ao público como “um camarada que é fundador e construtor do CRQI, um protagonista na construção do CRQI na Europa e no Oriente Médio, e um camarada que é o líder de um partido que tem em seu crédito 50 anos de intervenção na luta de classes na Grécia.”
Tal descrição é um ato deliberado para enganar os militantes do PO.
Michael-Matsas é uma figura política questionável cuja inteira história é composta de manobras políticas sem princípios e traidoras. No final dos anos 1970, tornou-se secretário nacional da Liga Internacional dos Trabalhadores, a seção grega do Comitê Internacional da Quarta Internacional (CIQI). Sua chegada a essa posição veio após a remoção de dois líderes anteriores sobre diferenças políticas que nunca foram esclarecidas dentro do CIQI.
A única característica constante da política de Michael-Matsas era sua orientação nacionalista. Os princípios do internacionalismo socialista eram continuamente subordinados aos cálculos nacionais mais vulgares. Em 1983, por trás das costas do CIQI, Michael-Matsas viajou para o Irã enquanto o governo de Khomeini estava reprimindo brutalmente grupos e ativistas de esquerda. Em meio a essa repressão, Michael-Matsas escreveu uma série de artigos exaltando o governo iraniano. Ele apareceu na televisão estatal iraniana em um ato de apoio público ao regime.
Em 1985, Michael-Matsas realizou um racha sem princípios com o CIQI enquanto essa organização conduzia uma luta política contra a degeneração nacionalista e oportunista que levou ao colapso o Partido Revolucionário dos Trabalhadores (WRP) britânico liderado por Gerry Healy. Ele recusou toda discussão com outras seções a partir da alegação absurda de que elas não tinham autoridade nem para se reunir sem a permissão de Healy, a quem ele descreveu como “líder histórico” do CIQI.
Ao se alinhar com Healy e romper com o Comitê Internacional, Michael-Matsas considerou que estaria livre para buscar quaisquer alianças que, dentro da Grécia e internacionalmente, pudessem melhor servir seus cálculos pragmáticos. Poucos meses depois de seu racha com o CIQI e a fundação do EEK, Michael-Matsas proclamou “uma nova era para a Quarta Internacional” que marcaria uma ruptura com “propagandismo abstrato” e “as práticas dos períodos de derrotas e isolamento do Trotskismo”. Essa “nova era” representou, na realidade, a implementação da política Pablista em sua forma mais extrema.
Dentro da Grécia, livre das restrições do Comitê Internacional e dos princípios Trotskistas, Michael-Matsas envolveu o EEK em uma série de alianças sem princípios com o partido burguês Pasok, o Partido Comunista Stalinista e a burocracia sindical. Na frente internacional, Michael-Matsas saudou Mikhail Gorbachev como o líder da revolução política na União Soviética. Enquanto o número de militantes do EEK permanecia minúsculo, Michael-Matsas tornou-se um elemento fixo no meio corrupto da esquerda pequeno-burguesa em Atenas.
A relação entre Jorge Altamira e Savas Michael-Matsas é baseada em uma atitude desdenhosa mantida por ambos em relação à história da Quarta Internacional.
O CRQI foi fundado sob o “princípio” de que não deveria haver discussão sobre diferenças passadas ou o desenvolvimento histórico das várias tendências que juntaram-se a ele. O documento fundador do comitê afirmou isso explicitamente. Pode ser lido em suas últimas linhas que:
Em oposição ao método de seita, que consiste em condicionar a Refundação imediata da IV Internacional a uma solução prévia, puramente literária por outra parte, das discrepâncias políticas que possam existir, propomos a organização de um partido revolucionário internacional, a IV, sobre a base de uma delimitação política exata de todas as divergências. Construir o partido internacional é o ponto do programa que delimita os marxistas revolucionários da seita.
Assim, a Quarta Internacional seria “refundada” a partir de um acordo “anti-sectário” para não discutir nenhuma das lições históricas da luta contra o Pablismo e um acordo para que cada grupo que juntasse-se ao CRQI permaneceria livre para levar adiante sua própria política oportunista nacional sem críticas ou interferências.
Para o EEK, isso significou trabalhar na periferia do – e promover ilusões no – Syriza. Saudando a vitória eleitoral do Syriza em Janeiro de 2015 como um triunfo para a classe trabalhadora grega, o EEK propagou a posição de que esse partido burguês poderia ser empurrado para a esquerda e compelido a “romper com a burguesia”.
Com sua promoção do Syriza e chamando o CIQI de “sectário” por alertar que o Syriza era um partido burguês que a classe trabalhadora grega tinha de se opor, o EEK desempenhou um papel auxiliar em uma traição histórica.
O Partido Obrero, por sua vez, persegue suas próprias políticas nacionais oportunistas estreitas, para as quais o CRQI deve fornecer uma cobertura “internacionalista”. Desde a sua fundação em 1964, a PO combinou críticas formais à tendência Pablista de direita conhecida como Morenismo, fundada pelo nacionalista e oportunista argentino Nahuel Moreno, com uma prática política centrada na busca de alianças com os próprios Morenistas.
Em 2017, o líder do PO, Altamira, criticou o Morenista Partido dos Trabalhadores Socialista (PTS), descrevendo-o explicitamente como um “Podemos em fraldas”, uma referência ao partido burguês de “esquerda” que se integrou ao establishment político dominante da Espanha. Mas nesse mesmo ano, o PO mais uma vez entrou em um bloco eleitoral sem princípios com o PTS, a chamada Frente de Esquerda e dos Trabalhadores (FIT), subordinando quaisquer críticas a um programa de menor denominador comum do populismo anti-Macri e a busca por mais postos parlamentares. As manobras oportunistas do PO com os Morenistas e a ala Kirchnerista do Peronismo estão sendo direcionadas para preparar uma armadilha ao estilo do Podemos ou do Syriza para a classe trabalhadora argentina.
Em seu discurso na conferência em Buenos Aires, Altamira deu ênfase especial à luta na Argentina pelo direito ao aborto, declarando: “Se pudermos colocar o selo do Partido Obrero e da Frente de Esquerda na vitória dessa luta, nós seremos, em um curto período, candidatos ao poder.”
Quando o líder do PO fala que seu próprio partido e sua frente eleitoral oportunista com os Morenistas argentinos do PTS podem tornar-se “candidatos ao poder” como resultado de seu apoio às manifestações a favor da legalização do aborto, isso só pode significar uma coisa. Ele não está falando sobre a mobilização independente da classe trabalhadora em um movimento revolucionário para tomar o poder e estabelecer um governo operário. Pelo contrário, ele está considerando a possibilidade de que a FIT seja chamada, sob condições de intensa crise para o capitalismo argentino, a formar um governo burguês, como fez o Syriza na Grécia.
Como um partido preparando-se para chegar ao poder do Estado, a liderança do PO está estabelecendo relações de Estado. Esse é o verdadeiro significado da consolidação dos laços entre o PO e o OKP de Darya Mitina.
Darya Mitina (a segunda da direita para a esquerda) com Vladimir Putin
Em sua contribuição para a conferência do CRQI, o PO propôs a posição de que “nem na Rússia nem na China uma burguesia emergiu como classe, já que em ambos os casos é mediada pelo Estado, que continua a manter grande parte de sua estrutura burocrática ‘pré-capitalista’.” O PO se refere tanto a Putin quanto a Xi Jinping como “bonapartistas especiais”, equilibrando-se entre os capitalistas emergentes e “a necessidade de conter a desintegração de seus estados”.
Por trás dessa perspectiva neo-Pablista está a concepção de que Putin tem o potencial de apresentar algum tipo de alternativa anti-imperialista, um contrapeso à dominação do imperialismo americano. Sob condições em que tanto a China quanto a Rússia tentaram expandir sua influência na América Latina, essa perspectiva tem implicações concretas em termos de política de Estado.
A política internacional de um partido como o Partido Obrero é sempre uma extensão da política nacional. A virada para uma aliança com o Stalinismo russo, uma força política de direita, está alinhada com sua orientação eleitoral oportunista dentro da própria Argentina. Como a contribuição do PO reconhece, a FIT que o une aos Morenistas está fundamentada em uma “adaptação eleitoral que se justifica na necessidade de cooptar a ala esquerda do Kirchnerismo” – isto é, o Peronismo.
Sob o pretexto de “refundação” da Quarta Internacional, um eixo profundamente reacionário está sendo preparado, envolvendo uma aliança com correntes nacionalistas burguesas e até mesmo direitistas.
A conferência em Buenos Aires e a pretensão de “refundar” a Quarta Internacional em aliança com o Stalinismo devem ser tomadas como uma advertência à classe trabalhadora. Representam uma tentativa de forjar novos instrumentos políticos para subordinar a classe trabalhadora à burguesia justamente em um momento em que a luta de classes está ressurgindo em todos os continentes.
Passaram-se 80 anos desde a fundação da Quarta Internacional e os 65 anos desde o racha de 1953 da QI, que levou à formação do Comitê Internacional na defesa do Trotskismo contra o revisionismo Pablista. A tentativa de criar uma tendência internacional suprimindo as lições da história da Quarta Internacional só pode resultar na traição da classe trabalhadora.
Para todos aqueles na Argentina e em toda a América Latina que querem defender o Trotskismo, é vital o aprendizado das lições dessas traições e da prolongada luta do Comitê Internacional para construir a Quarta Internacional através de um combate implacável contra o Pablismo e todas as formas de oportunismo. Chamamos os leitores do World Socialist Web Site na Argentina e em todo o continente Americano a estudar seriamente os documentos desse combate e iniciar a luta para construir seções do CIQI em todos os países.