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Trump, o Irã e o avanço dos EUA em direção à hegemonia mundial

Keith Jones
20 de febrero de 2018

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Publicado originalmente em 16 de Outubro de 2017

No fim de um belicoso e desonesto discurso na sexta-feira, o presidente dos EUA, Donald Trump, prometeu acabar com o acordo nuclear firmado com o Irã em 2015, a menos que seja reescrito de acordo com as exigências dos EUA.

O discurso foi um exemplo perfeito da arrogância e da criminalidade da elite dominante dos Estados Unidos. Trump denunciou o Irã por espalhar “conflitos, o terror e tumultos em todo o Oriente Médio e além.” Isso foi dito pelo líder do país que submeteu as pessoas do Oriente Médio a incontáveis horrores, travando guerras de agressão que destruíram sociedades inteiras, causando a mortes de milhões de pessoas no Afeganistão, no Iraque, na Líbia e na Síria, e obrigando muitos milhões mais a fugir de suas casas.

Trump denunciou a revolução iraniana de 1979, pintou o governo burguês-clerical do Irã como um regime internacional fora da lei e lançou os Estados Unidos como o protetor dos direitos democráticos do povo iraniano.

Porém, a população iraniana não esqueceu que a CIA organizou o golpe de 1953, que derrubou o presidente eleito do Irã, Mohammad Mossaddegh, e instalou a ditadura selvagem do Xá, que Washington manteve no poder nos 25 anos seguintes. Ou que, nos últimos 40 anos, os EUA realizaram uma campanha implacável contra o Irã, ameaçando-o repetidamente com um ataque, apoiando Bagdá na guerra de 8 anos entre Irã e Iraque (1980-88) e impondo duras sanções econômicas que culminaram, sob o governo Obama, em uma guerra econômica total.

Trump deixou claro que suas exigências para “corrigir” as “muitas falhas” do acordo nuclear não estão sob negociação. Essas exigências representam um ultimato para que Teerã se desarme unilateralmente, enquanto os EUA mantenham uma armada no Golfo Pérsico e armem seus aliados sauditas e israelenses até os dentes. Eles exigiram que o Irã aceite incursões permanentes em seu território, acabe com sua soberania e que seja de facto reduzido ao status de um estado vassalo.

As exigências incluem: tornar permanentes as restrições rigorosas sobre o programa nuclear civil do Irã, que estão programadas para acabar em 2026; permitir inspeções irrestritas da Agência Internacional de Energia Atômica nas instalações militares iranianas; e desmantelar o programa de mísseis balísticos do Irã.

Os líderes europeus responderam denunciando com raiva Washington por agir de acordo com suas próprias leis, incitando uma corrida armamentista nuclear global e aumentando o perigo de guerra no Oriente Médio e na Península Coreana. O ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Sigmar Gabriel, advertiu que, se os Estados Unidos insistirem nesse caminho, “seremos obrigados a tomar uma posição comum com a Rússia e a China contra os EUA.”

O que acontecerá a seguir não está claro. Grande parte do establishment político e militar dos EUA, incluindo os principais assessores de Trump - o secretário de Defesa James Mattis, o secretário de Estado Rex Tillerson e o conselheiro de segurança nacional H. R. McMaster - aconselharam Trump contra o cancelamento do acordo com o Irã. Tanto Mattis quanto o presidente do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas dos EUA, Joseph Dunford, testemunhando na semana passada diante do Congresso, reconheceram que o Irã está seguindo o acordo nuclear e disseram acreditar que apoiar o acordo é do interesse dos Estados Unidos.

Isso não acontece porque os generais de Trump estão menos determinados em deixar Irã de joelhos e garantir a hegemonia dos EUA no Oriente Médio, a região exportadora de petróleo mais importante do mundo e o pivô estratégico entre a Ásia, a África e a Europa.

Os críticos de Trump do Partido Democrata e da mídia americana não pensam diferente. O New York Times e o Washington Post repetidamente incitaram uma ofensiva militar e diplomática dos EUA mais agressiva contra o Irã, começando na Síria, onde Teerã desempenhou um papel importante na derrota das forças islâmicas apoiadas pelos EUA. Em um editorial no sábado, intitulado “Trump traçou um perigoso caminho sobre o Irã”, o Washington Post acusou o presidente de “loucura geopolítica” e o castigou por “não ter um plano claro para conter o avanço iraniano na Síria, que ameaça disparar um novo conflito com Israel.”

Os desentendimentos entre o Post e Trump, embora agudos, são inteiramente táticos. Eles giram em torno do alvo mais apropriado e de quando se iniciará a próxima guerra dos EUA, questões que se dão em meio a temores generalizados de que um confronto com o Irã irá prejudicar as ofensivas estratégicas militares de Washington contra a China e a Rússia e inflame relações com os aliados europeus tradicionais dos EUA, que, através da OTAN, continuam a desempenhar um importante papel em projetar o poder global dos EUA, especialmente contra a Rússia.

A oposição ao plano de Trump para acabar com o acordo com o Irã é mais um elemento na guerra política sem precedentes que se trava em Washington, que agora chegou ao ponto de se discutir publicamente o uso da 25a Emenda à Constituição dos EUA para tirar Trump do poder.

Com o plano de Trump em usar o domínio de Wall Street sobre o sistema bancário mundial e o acesso ao mercado dos EUA para intimidar os europeus a impor novas sanções econômicas contra Teerã, as questões em torno do Irã ameaçam piorar ainda mais a já violenta disputa comercial entre os EUA e a Europa, especialmente a Alemanha. As potências europeias já estão falando em retaliar os EUA.

Os países imperialistas europeus não são menos predatórios do que Washington. Eles foram parceiros-chave na guerra econômica contra o Irã. Mas a nova campanha dos EUA contra Teerã ameaça seus planos de investir bilhões para explorar economicamente o Irã, que possui a quarta maior reserva de petróleo do mundo e as maiores reservas de gás natural. Além disso, dada a proximidade com o Oriente Médio e sua dependência do petróleo dessa região, as potências europeias temem as consequências desestabilizadoras de outra guerra dos EUA - que poderia envolver rapidamente potências nucleares como a Rússia e a China.

Enquanto Trump é um fator acelerador da crise entre EUA e a Europa, a raiz dessas divisões dentro da classe dominante americana em relação ao Irã e sua ampla estratégia imperialista está no fracasso de Washington em compensar a deterioração de seu poder econômico através de guerras de agressão depois da dissolução da União Soviética.

Na busca por hegemonia global, os EUA arrasaram o Oriente Médio. O Irã tem sido um alvo principal da agressão americana, com tropas americanas invadindo dois de seus vizinhos, o Afeganistão e o Iraque. No entanto, o Irã conseguiu expandir sua influência, enquanto tanto a Rússia como a China são agora grandes atores econômicos e geopolíticos no Oriente Médio, unindo-se para frustrar os planos de Washington em usar forças armadas islâmicas para derrubar o governo da Síria, como aconteceu com sucesso na Líbia.

A resposta do imperialismo dos EUA a essas derrotas tem sido o aceleramento de seus planos de guerra, ameaçado diretamente seus principais rivais, começando com a China e a Rússia. A Europa e o Japão, por sua vez, estão num agressivo processo de rearmamento para assegurar seus próprios interesses imperialistas em oposição aos dos EUA.

A humanidade se confronta com o perigo real e presente de ser arrastada pelas potências imperialistas para uma Terceira Guerra Mundial, desta vez com o uso de armas nucleares.

Não há nenhuma facção na classe dominante em qualquer das principais potências mundiais que defenda a paz. A única força social que pode interromper o caminho em direção a um holocausto nuclear é a classe trabalhadora internacional, mobilizada com um programa socialista e internacionalista para derrubar o capitalismo, fonte da guerra, da desigualdade social e da ditadura. O Comitê Internacional da Quarta Internacional luta para construir um movimento anti-guerra internacional de massa sob essa perspectiva revolucionária.