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ONU afirma que 27 pessoas são mortas todos os dias no cerco a Raqqa liderado pelos EUA

Bill Van Auken
29 de setembro de 2017

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Publicado originalmente em 1 de setembro de 2017

O representante do Secretário-Geral das Nações Unidas para questões humanitárias, Stephen O’Brien, disse ao Conselho de Segurança da ONU, na última quarta-feira, que 27 pessoas são mortas a cada dia no cerco liderado pelos EUA a Raqqa. A cidade síria, controlada pelo Estado Islâmico, foi submetida a incessantes bombardeios norte-americanos por quase três meses, e grande parte de sua área foi reduzida a escombros.

Cerca de 270.000 pessoas foram expulsas da cidade e transformaram-se em refugiados sem-teto, enquanto um número estimado em 25.000 civis continua acuado pelo ataque norte-americano. Estão sem comida, água potável, eletricidade e cuidados médicos. Relatos provenientes de Raqqa afirmam que seus habitantes estão comendo grama e folhas para não morrer de fome.

Adama Dieng, conselheiro das Nações Unidas para a prevenção do genocídio, emitiu um comunicado em separado que condena “a horrível situação enfrentada pelos civis presos na ofensiva para recapturar a cidade do ISIS”, enquanto o Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad al-Hussein, acusou o fato de que “civis – que sempre deveriam ser protegidos – estão pagando um preço inaceitável”.

Em outras palavras, um crime de guerra de monstruosas dimensões está ocorrendo à vista de todos enquanto o imperialismo norte-americano, seu perpetrador, goza de impunidade completa.

Em sua conta no Twitter, o grupo de monitoramento local Raqqa is Being Slaughtered Silently (“Raqqa está sendo massacrada silenciosamente”) posta diariamente fotografias de bebês, crianças, homens, mulheres, idosos e famílias inteiras sofrendo não só com as bombas e mísseis dos EUA, mas também com a total devastação dos bairros residenciais da cidade.

O cerco à Raqqa acontece logo depois de um crime de guerra ainda maior perpetrado neste último verão no norte do Iraque, na cidade de Mossul, que já foi a segunda maior do país e onde o número de mortos - após nove meses de cerco e bombardeio por parte dos EUA e de seus aliados do governo iraquiano – foi estimado em pelo menos 40.000.

Toda essa carnificina vem sendo virtualmente banida da mídia norte-americana, que estava engajada até o ano passado – em estreita colaboração com o governo norte-americano – em uma campanha a plenos pulmões de falsa indignação moral contra a ofensiva do governo sírio, apoiada pelos russos, para retomar o leste de Aleppo dos “rebeldes” islamistas ligados à Al-Qaeda e armados pelos Estados Unidos.

Naquela ocasião, a acusação de “crimes de guerra” foi repetida à exaustão; agora, há apenas silêncio. Nada poderia fornecer comprovação mais devastadora da hipocrisia desta política de “direitos humanos” do imperialismo, a especialidade do Partido Democrata, da chamada imprensa liberal e dos inúmeros grupos de pseudo-esquerda que os orbitam, ao conclamar Washington a intervir mais agressivamente em suposto benefício do povo sírio.

Por trás das mentiras e da hipocrisia acerca dos direitos humanos e do terrorismo, o que move as atuais intervenções dos EUA - tanto no Iraque quanto na Síria (assim como nas contínuas guerras travadas pelo imperialismo norte-americano, nesta região, pelo último quarto de século) – é a tentativa de Washington de assegurar sua hegemonia sobre o Oriente Médio - rico em petróleo – em detrimento dos seus rivais globais e regionais e, com isso, reverter sua posição global declinante através da força militar.

A matança de civis em Raqqa é parte de um arco de massacres “Made in USA”, que vai do Chifre da África ao sudeste asiático passando pelo Oriente Médio, da Somália ao Afeganistão. Bombardeios, mísseis, ataques de drones e “operações especiais” de assassinato perpetrados pelos EUA estão matando diariamente cidadãos inocentes, indefesos e empobrecidos.

Por toda a parte, as forças armadas norte-americanas estão incrementando suas operações e modificando suas diretrizes de combate para seguir o que o Secretário de Defesa dos EUA, John “Cachorro Louco” Mattis, descreveu no início do ano como “estratégia de aniquilação”.

Na última quinta-feira, Mattis anunciou que o Pentágono começou uma escalada militar de grande monta no Afeganistão, enviando mais 4.000 soldados para uma guerra que já dura quase 16 anos.

O anúncio da escalada deu-se logo após o Pentágono admitir que havia “subestimado” o número de tropas que já estava no Afeganistão, escondendo do povo norte-americano a verdadeira dimensão das operações militares dos EUA. Em vez dos 8.448 oficialmente alistados, há de fato 11.000 lá estacionados neste momento. Não está claro se este número inclui todos os assim chamados deslocamentos “temporários” de tropas entrando e saindo do terreno de combate. Após a última escalada, haverá ao menos 15.000 soldados estacionados no Afeganistão.

Apesar de o Pentágono ter colocado o número de soldados no Iraque em 5.000 e na Síria em 500, agora ele também admite que ambas as cifras foram deliberadamente subestimadas, com milhares a mais mobilizados nestes países também. A imprensa norte-americana divulgou servilmente dados do Pentágono que sabia que eram falsos.

A escalada no Afeganistão aumentará o número de vítimas civis, que já estava subindo como resultado das operações militares dos EUA. A missão das Nações Unidas para o Afeganistão registrou um aumento de 43% nas mortes de civis causadas por bombardeios americanos nos primeiros seis meses de 2017, comparados ao mesmo período no ano passado.

Em três ataques distintos desde a última segunda-feira, pelo menos 40 civis, muitos deles mulheres e crianças, foram mortos por bombas dos EUA lançadas nas províncias de Herat e Logar.

Enquanto isso, o Pentágono lançou uma grande escalada na sangrenta intervenção, que já dura décadas, na empobrecida porém estrategicamente situada nação da Somália, no Chifre da África, patrocinando uma campanha de ataques de drones e missões especiais de assassinato. Na última sexta, tropas das forças especiais dos EUA operando ao lado de elementos do governo invadiram a aldeia de Barire de madrugada, capturaram 10 civis e os executaram sumariamente, um por um. Os habitantes da aldeia, indignados, levaram os corpos, inclusive de mulheres e crianças, para a capital do país, Mogadishu, para protestar contra esse massacre.

E no Iêmen, o governo Trump tem aumentado o fornecimento do indispensável armamento e apoio logístico que Washington já garantia, sob Obama, para uma guerra liderada pelos sauditas que já assumiu proporções quase genocidas. Bombardeios aéreos sauditas já mataram mais de 12.000 civis desde o começo desta guerra em 2015, com suprimento de bombas e mísseis por parte dos EUA, inclusive bombas de fragmentação que são banidas pela lei internacional.

A última atrocidade saudita-norte-americana ocorreu nesta quarta-feira, quando bombas atingiram um posto de gasolina e um reservatório de combustível, iniciando um incêndio que matou 13 pessoas, todas queimadas vivas. Na semana passada, um bombardeio aéreo atingiu um hotel e um prédio de apartamentos de três andares, matando cerca de 60 pessoas.

A destruição massiva da infra-estrutura e o bloqueio dos portos e do espaço aéreo do Iêmen levaram os 22 milhões de habitantes deste país à beira da inanição gerando ao mesmo tempo as condições para a pior epidemia de cólera da história mundial. Nada menos que meio milhão de iemenitas foi contaminado, metade dos quais crianças. O índice de mortalidade devido à doença já atingiu 2.000 e está crescendo rapidamente.

Estes crimes de guerra são cometidos sem o consentimento do povo norte-americano. As múltiplas intervenções e escaladas militares – virtualmente não relatadas pela mídia – são realizadas sem haver sequer um simulacro de autorização legislativa ou de debate. Tanto os democratas quanto os republicanos apoiam incondicionalmente o militarismo norte-americano como um instrumento essencial ao incremento das operações de pilhagem da oligarquia financeira dominante.

Recursos maciços são desperdiçados na máquina de guerra norte-americana, enquanto serviços públicos essenciais e infra-estrutura social são asfixiados, deixando milhões de pessoas sem proteção e arrasadas por catástrofes cada vez mais frequentes como a do furacão Harvey.