Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 19 de junho de 2007.
Chuvas torrenciais anuais, enchentes e deslizamentos de terra
estão atingindo a China, causando a degradação
da vida de milhões de pessoas. Uma forte chuva caiu entre
os dias 6 e 9 de junho em seis províncias do sul da China
Hunan, Guangdong, Guangxi, Guizhou, Jiangxi e Fujian
e continuou a atingir a região ao longo da semana. Apesar
das enchentes ocorrerem praticamente todos os anos, o governo
chinês pouco fez para impedi-las e para proteger as pessoas
mais vulneráveis os pobres do campo.
Até agora, 128 pessoas morreram e 24 estão desaparecidas.
Cerca de 788.000 pessoas foram retiradas de suas casas, 69.000
casas foram destruídas e outras 94.000 estão danificadas.
Oficialmente, 20.000 pessoas estão sem casa. Pelo menos
24 vilas em seis províncias ficaram submersas. Muitas pessoas
estão sendo abrigadas por parentes ou em escolas e barracas.
Há duas semanas, o Rio Hanjiang, na província
de Guangdong, alcançou a marca de 26,44 metros, o mais
alto nível dos últimos 50 anos. Para proteger as
populações urbanas ao longo do rio, cuja margem
é densamente povoada, a água foi desviada, causando
enchentes em seis vilas. A maioria das casas ficou a dois metros
abaixo da água e mais de 10.000 pessoas tiveram de ser
transferidas somente nesta província. Mesmo com esse desvio
de água, o nível do rio passou de 0,9 metros para
3,5 metros acima do nível de risco. Outros 2,5 milhões
de pessoas estão correndo riscos. Esforços de última
hora estão sendo realizados para reparar os diques.
Em Huangjin, as autoridades locais advertiram que se ocorrer
mais uma forte tempestade, o número de pessoas dependentes
do fornecimento de alimentos por parte do governo continuará
aumentando. As lavouras de arroz na região foram destruídas.
O município de Meizhou, no nordeste de Guandong, foi
uma das regiões mais castigadas. Mais de 7.000 pessoas
tiveram de ser transferidas quando foi descoberta uma rachadura
de 40 metros numa barragem próxima. A região de
Meizhou, que é conhecida pela cultura local Hakka, é
montanhosa e povoada por pessoas extremamente pobres. A ligação
pela estrada de ferro foi cortada por 92 horas. A rede de televisão
estatal CCTV noticiou que mais de 87.000 pessoas ainda estavam
presas na cidade.
Na província de Guangxi, uma forte chuva destruiu 29
reservatórios, 162 estradas e forçou 59 fábricas
a paralisarem a produção. A Barragem dos Três
Desfiladeiros no Rio Yangtze, a maior hidroelétrica no
mundo, teve de despejar água no dia 5 de junho para baixar
o nível de seus reservatórios.
No dia 17 de junho, oito agricultores estavam desaparecidos
em conseqüência de um deslocamento de terra na província
de Hubei.
O Ministério de Relações Civis estima
que o custo das enchentes gira ao redor de 8,92 bilhões
de yuan (US$ 1,17 bilhão). O Centro Nacional Metereológico
informou que 23,6 milhões de pessoas foram afetadas. Pelo
menos 1.360 quilômetros quadrados de plantações
foram destruídos, elevando o preço das folhas verdes
e de outros vegetais em mais de 40% nas cidades do sul do país.
O preço do arroz também está começando
a aumentar e deve ficar alto, pois a colheita, que termina no
final deste mês, está sendo bastante prejudicada
pelo excesso de chuvas.
As enchentes não são apenas desastres naturais.
No passado, as grandes planícies que eram inundadas pelas
enchentes não eram habitadas, formando uma defesa natural
contra a elevação das águas. Recentemente,
entretanto, diversos agricultores pobres foram levados a cultivar
essas áreas e estão pagando um elevado preço.
Ao mesmo tempo, as medidas de controle das enchentes tais como
barragens, diques e reservatórias estão sendo mantidas
de maneira muito precária ou foram muito mal construídas.
Cidades economicamente importantes são protegidas por grandes
diques, mas as comunidades e cidades rurais, onde vive a maioria
da população chinesa, não têm uma proteção
satisfatória.
As enchentes destroem todos os bens de milhões de famílias.
Em muitos casos, os campos ficam cobertos de lama e não
podem ser replantados durante um longo período. As pessoas
jovens e todos aqueles que têm capacidade para trabalhar
são obrigados a se mudar para as cidades e tentar ganhar
o suficiente para reconstruírem suas casas e recuperar
o que perderam. Os mais velhos ficam no interior para cuidar das
crianças e trabalhar nas lavouras ainda existentes. O governo
chinês destinou apenas 100 milhões de yuan (US$ 13
milhões) para ajudar as vítimas das enchentes, enquanto
seus gastos militares chegam a cerca de $ 45 bilhões por
ano.
Se, por um lado, as enchentes estão afetando a região
sul da China, por outro, grande parte do norte e do sudoeste,
sobretudo nas províncias de Yunan e Sichuan, enfrentam
uma forte estiagem. Por volta de 11 milhões de pessoas
sofrem a falta de água e 8 milhões de hectares de
plantações foram perdidos. Alguns cientistas chineses
alertaram que estas condições climáticas
extremas podem se tornar uma constante nas próximas décadas,
a não ser que se faça alguma coisa para evitar o
aquecimento global.
Por causa do rápido e anárquico crescimento da
indústria nas últimas três décadas,
a China é agora a segunda maior emissora de gases estufa.
De acordo com a Agência Internacional de Energia, a China
produziu 5,6 bilhões de toneladas de dióxido de
carbono no ano passado, sendo que os EUA produziram 5,9 bilhões.
Este ano a China poderia superar os EUA, pois a expectativa de
emissão é de mais de 6 bilhões de toneladas.
A fim de estimular o crescimento econômico, Beijing se recusou
a tomar medidas sérias para a redução de
gases estufa, a não ser que os EUA e outros países
industrializados façam o mesmo.
Ao mesmo tempo, as autoridades chinesas estão usando
o aquecimento global como uma conveniente desculpa para não
assumir a responsabilidade de ajudar e proteger as famílias
atingidas pelas enchentes. Jiao Meiyan, o diretor do Centro Nacional
Metereológico, disse ao China Daily, no dia 11 de
junho, que as últimas enchentes foram em parte causadas
por mudanças no clima do planeta, acrescentando:
o número de casos tem caído nos últimos
anos, o que é um progresso substancial numa nação
densamente povoada com condições climáticas
bastante complexas.
Fortes tempestades, furacões e enchentes vêm ocorrendo
na China durante séculos. No início do século
XX, a desintegração da lei imperial e a falta de
qualquer autoridade central deixaram as massas chinesas ainda
mais vulneráveis a estes desastres. Um sistema apropriado
para o controle das enchentes era uma das reivindicações
populares na revolução chinesa de 1949. Na década
de 1950, o regime maoísta extorquiu milhões de camponeses
para construir diques e reservatórios de água, que,
apesar do planejamento não cientifico e da administração
burocrática, proporcionaram uma maior proteção
e melhorias no sistema de irrigação.
Com o fim da coletivização da agricultura realizada
no início dos anos 1980, as comunidades rurais deixaram
de ser as responsáveis pela manutenção dos
sistemas hidráulicos. A falta de investimentos públicos
levou à degradação dos diques, dos canais
e dos reservatórios. O lucro dos dirigentes corruptos aliados
às companhias de construção resultou no uso
de materiais de baixa qualidade e a conseqüente erosão
das defesas físicas contra as enchentes.
Em 1998, 4.000 pessoas morreram e 240 milhões foram
afetadas pelas enchentes, que causaram uma despesa de cerca de
$ 30 bilhões. Em 2006, o número de mortes pelas
enchentes e pelos furacões na China foi de 2.704. Cientistas
chineses alertaram que existe uma forte possibilidade de haver
mais enchentes ainda neste ano ao longo dos rios Yangtze e Songhua,
o que poderá levar ao aprofundamento da destruição
e à morte de um número ainda maior de pessoas.