Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês,
no dia 24 de abril de 2007.
Os últimos relatórios sobre a situação
da economia mundial divulgados tanto pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI) quanto pelo Banco Mundial expõem um
quadro de uma expansão global inédita nas quatro
últimas décadas.
O Panorama da Economia Mundial (PEM), do FMI, publicado no
início desse mês, prevê que a taxa de crescimento
mundial de 4,9% ocorrida no período de 2003-2006 continuará
por pelo menos mais dois anos. De acordo com as estatísticas
do FMI, um pico mais forte que esse só ocorreu no período
de 1970-1973, quando a taxa de crescimento mundial alcançou
5,4%. Se a atual taxa se sustentar, ela representará a
maior expansão num período de seis anos da economia
mundial, desde 1970.
As conclusões do relatório Perspectivas da Economia
Global publicadas pelo Banco Mundial em dezembro de 2006, não
tem nenhuma diferença essencial em relação
ao PEM. Embora o Banco Mundial indique uma perspectiva levemente
abaixo daquelas levantadas pelo FMI, devido a diferenças
na técnica de mensurar os dados, ele também aponta
para "um forte desempenho global", em conseqüência
de uma "expansão muito rápida nos países
em desenvolvimento, que crescem a uma taxa duas vezes mais alta
que nas economias avançadas". Isso não ocorreu
apenas como resultado do impacto da economia chinesa, que cresceu
10,4%, mas foi o reflexo de todo o conjunto dos países
em desenvolvimento. De modo geral, 38% do aumento no resultado
global são originados nessas regiões, bem acima
dos 22% da produção mundial.
O Banco Mundial observou que se os últimos 25 anos foram
divididos em dois períodos - 1980-2000 e 2000-2005 - a
taxa de crescimento nos países em desenvolvimento aumentou
de 3,2% no primeiro período para 5% no segundo. Se, por
um lado, essa aceleração não foi compartilhada
por todos os países, por outro, não pode ser considerada
como mero resultado do crescimento na China e na Índia.
O PEM, do FMI, traz inúmeras informações
a respeito de sucessos econômicos semelhantes. A atividade
econômica na Europa Ocidental teve um "momento de ganho"
em 2006, tendo o PIB alcançado um crescimento de 2,6% na
área do euro, quase o dobro obtido em 2005, representando
a maior taxa desde 2000. "A Alemanha foi o principal propulsor,
impulsionada por um enorme crescimento das exportações
e um forte investimento gerado pela melhoria na competitividade
e saúde corporativa nos últimos anos," afirma
o relatório. Acima de tudo, a taxa de desemprego caiu para
7,6% na área do euro, o nível mais baixo em 15 anos.
Houve também boas notícias vindas do Japão,
onde a economia estava virtualmente estagnada por mais de uma
década, depois do colapso do mercado de ações
e da bolha imobiliária ocorridos no começo da década
de 1990. Apesar de um inesperado declínio do consumo em
meados de 2006, "os fundamentos do crescimento econômico
permanecem firmes, com a expansão dos investimentos privados
- suportados por fortes lucros, planilhas corporativas de balanço
saudáveis, reinício dos financiamentos bancários,
e um crescimento da taxa de exportações". A
expectativa é de que o crescimento real no Japão
permaneça acima dos 2%.
Enquanto a taxa de crescimento na América Latina foi
de 5,5% em 2006 e a expectativa para 2007 é de 4,9%, os
anos 2004-2006 foram "os três anos de crescimento mais
forte na região desde o fim dos anos 70".
Na chamada "Ásia emergente", a atividade econômica
"continua a expandir-se a um ritmo veloz", respaldada
por "um crescimento muito forte tanto na Índia quanto
na China". Na China, o PIB real cresceu 10,7% em 2006, enquanto
na Índia a taxa de crescimento foi de 9,2%, resultado de
um incremento no consumo, investimentos e exportações.
O crescimento na Europa Oriental alcançou 6% em 2006,
enquanto na Rússia a taxa foi de 7,7% em 2006, embora seja
esperada uma ligeira queda, chegando a 7% em 2007 e 6,4% em 2008.
O relatório descreveu o panorama econômico para
a África como "muito positivo" num cenário
de forte crescimento global, incremento de fluxos de capital,
crescimento da produção petrolífera num determinado
número de países e o incremento da demanda por mercadorias
não-energéticas. "A expectativa de crescimento
real do PIB em 2007 é de 6,2%, acima dos 5,5% obtidos em
2006. Prevê-se uma desaceleração para 5,8%
em 2008".
Uma preocupação que existe é se essa expansão
mundial poderia ser retardada pela desaceleração
da economia norte-americana, devido ao significativo declínio
no mercado imobiliário. Segundo as últimas informações,
a venda e a construção de imóveis ainda são
os responsáveis pela queda. O estoque de casas novas não
vendidas atingiu o maior nível em 15 anos. Foi estimado
que durante os últimos três trimestres de 2006 a
taxa de retração da construção residencial
foi 1% abaixo do crescimento real do PIB nos EUA.
Com a economia dos EUA tendo "desacelerado consideravelmente
durante o ano passado", a preocupação central
do FMI foi "o quanto esse baixo crescimento é uma
freada temporária... ou os estágios iniciais de
uma queda mais prolongada". Enquanto a previsão de
crescimento dos EUA foi reduzida para 2,2% (em relação
à previsão de 2,9% feita em setembro passado), espera-se
uma "recuperação econômica, com o aumento
das taxas trimestrais de crescimento durante o ano de 2007 e a
retomada de todo o seu potencial em meados de 2008".
Instabilidade Financeira
Embora seja considerado por renomados economistas como "a
previsão oficial mais otimista que já vimos para
a economia global," o relatório do FMI levantou algumas
preocupações, principalmente em relação
aos mercados financeiros.
A busca contínua por lucros crescentes resultou em grandes
riscos em mercados e agentes financeiros menos conhecidos. "Se
essa estratégia tem tido sucesso foi porque os mercados
permanecem com tendência de alta, mas a queda nos preços,
o aumento da volatilidade e o surgimento de perdas nos empréstimos
podem levar a uma reavaliação das estratégias
de investimentos e a um recuo dos investimentos que se tornaram
excedentes. Qualquer iniciativa que desconsidere essas recomendações
pode ter sérias conseqüências macro-econômicas,"
afirmou o FMI.
O relatório também alertou sobre a recente onda
de aquisições, freqüentemente realizadas por
firmas de investimentos, todas mediante a tomada de empréstimos.
Ele admitiu, no entanto, que os riscos ao crescimento global "são
atualmente menores que há seis meses".
Apesar de não terem uma identidade completa na análise,
os dois relatórios consideraram que os maiores fatores
que reforçam a tendência de crescimento econômico
mundial são a integração dos mercados globais,
a abertura das economias chinesa e indiana, a expansão
da oferta mundial de força de trabalho e o impacto das
tecnologias de informação e comunicação.
De acordo com o Banco Mundial, durante os últimos 25
anos, a integração global da economia, a diminuição
brutal nos custos de transporte e comunicação, juntamente
com as reduções das barreiras comerciais, associados
à integração dos mercados emergentes aos
mercados globais, prepararam o caminho para ganhos de produtividade.
"O comércio global explodiu desde o início
dos anos 60. As exportações mundiais cresceram de
um patamar de menos de US$ 1 trilhão por ano (baseado na
cotação do dólar em 2000) para aproximadamente
US$ 10 trilhões por ano, o que significa um crescimento
anual em torno de 5,5%. O comércio global está claramente
superando os resultados globais, que cresceu em torno de 3,1%
durante o mesmo período. Entre 1970 e 2004, as exportações
dobraram sua participação no rendimento global,
representando agora mais de 25% deste. De 1970 a 1985, a elasticidade
de exportações (a taxa de crescimento da participação
das exportações no rendimento global) estava em
torno de 1,5%, mas por volta de 1986, a elasticidade aumentou
substancialmente, atingindo cerca de 2,5% uma década depois.
A aceleração chegou a seu ponto máximo no
colapso da Cortina de Ferro e na guinada da Índia e da
China rumo à abertura de suas economias e à busca
de uma estratégia baseada nas exportações.
Outros países também abandonaram estratégias
que conduziam ao isolamento e obtiveram um salto em suas exportações".
Na seção especial dedicada à globalização
do trabalho, o relatório do FMI estima que a força
de trabalho efetiva global cresceu quatro vezes durante as duas
últimas décadas - um "campo de crescimento
do trabalho global que está sendo acessado por economias
avançadas através de vários canais, incluindo
as importações de bens de consumo, a instalação
de empresas em países que não impõem regulamentação
alguma (para produzir mercadorias parcialmente completas), e a
imigração".
A maior parte desse incremento da oferta de trabalho aconteceu
depois de 1990. As regiões que mais contribuíram
foram o leste asiático, como principal fornecedor de força
de trabalho, e o sul da Ásia e o antigo bloco oriental,
em menores proporções. Embora a maioria desse trabalho
super-explorado envolve trabalhadores com um baixíssimo
nível de educação, o relatório observou
que a oferta relativa de trabalhadores com alto grau de educação
aumentou em torno de 50% durante os últimos 25 anos, a
sua grande maioria nos países avançados, mas também
na China.
Nem o Banco Mundial e nem o FMI traçaram qualquer paralelo
histórico, mas as vastas mudanças estruturais associadas
com a última fase da globalização capitalista
lembram o início do século XX, quando as taxas de
lucro e o crescimento econômico dos países capitalistas
avançados receberam um enorme estímulo por meio
dos baixo custo das matérias-primas, minerais e outros
recursos naturais que provinham das colônias.
Junto com a introdução de novas tecnologias,
a vasta expansão na força de trabalho global durante
as duas últimas décadas impulsionaram enormemente
os lucros. Desde o início dos anos 80, estima-se que nos
países capitalistas avançados a parcela do PIB dedicada
ao trabalho diminuiu cerca de 8%.
As duas organizações apresentaram a última
tendência de alta como uma demonstração de
saúde e estabilidade do capitalismo mundial... Mas sobre
isso restam inúmeras dúvidas. Nas palavras do Banco
Muncial: "embora aparentemente este seja um cenário
promissor, a economia global encontra-se num ponto crítico,
depois de muitos anos de forte crescimento - e períodos
como esses são extremamente arriscados. Sem dúvida...
o último século começou com circunstâncias
semelhantes, caracterizadas por um período de extremo crescimento
baseado em mudanças tecnológicas e alta liquidez.
Longe de continuar dessa forma, como previsto pelas lideranças
econômicas daquele período, o mundo foi lançado
à Grande Depressão. Assim, embora o atual desenvolvimento
seja tranqüilo, um pouco de cuidado é sempre necessário".
Antes da Grande Depressão, ocorreram a Primeira Guerra
Mundial, a Revolução Russa de 1917 e os levantes
revolucionários através da Europa do início
dos anos 20. O crescimento avassalador da economia mundial no
fim do século XIX e no início do século XX
e o surgimento de novas potências - Alemanha, Japão
e Estados Unidos - destruiu o antigo equilíbrio internacional
do século XIX, levando à guerra. E o crescimento
da classe trabalhadora ocasionado por essa expansão da
economia capitalista, significou o envolvimento das massas populares
nas lutas políticas.
A história, logicamente, não se repete. Mas uma
análise da história indica que vastas mudanças
na estrutura real do capitalismo mundial, como as que agora se
expressam no elevado crescimento econômico, terão
um impacto de grandes proporções na esfera da política.