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As ameaças dos EUA contra o Irã: o espectro da barbárie nuclear

Declaração do Conselho Editorial do WSWS
13 Mayo 2006

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A recente revelação de que o governo dos EUA mantém a preparação e planejamento já avançados de uma operação de bombardeio ao Irã, que inclui o possível uso de armas nucleares, manifesta grave ameaça numa situação internacional de já crescente instabilidade.

O imperialismo norte-americano embarcou numa trajetória que, se não impedida, levará o mundo a uma catástrofe histórica, que fará a Segunda Grande Guerra Mundial, comparativamente, parecer algo insignificante.

Que tal ato possa ser cogitado pela Casa Branca de Bush já é o suficiente para chocar e horrorizar todos aqueles que estão preocupados com o destino do mundo e o futuro da humanidade. Pouco menos de seis décadas depois do imperialismo dos EUA ter realizado os primeiros bombardeios atômicos contra Hiroshima e Nagasaki—infligindo horrores que as gerações que se seguiram juraram que jamais se repetiriam—Washington está considerando ativamente o uso de tais terríveis armas mais uma vez, agora sem provocação real ou mesmo prova verossímil de uma futura ameaça. Tal ato teria o efeito de incriminar definitivamente os Estados Unidos como país e como sociedade.

Esses planos não são apenas reais, como já estão em andamento, segundo confirmação de Seymour Hersh em artigo publicado na revista New Yorker assim como no The Washington Post. As preparações incluem a designação de tropas para operações especiais dentro do Irã para visualizar alvos e a realização de exercícios aéreos nos céus do Mar da Arábia, simulando batalhas com mísseis nucleares contra instalações nucleares iranianas.

A ameaça da guerra apenas se intensificou desde a publicação desses artigos, com o anúncio do governo iraniano de que teve sucesso no enriquecimento de urânio para seu programa de energia nuclear. Teerã mais uma vez insistiu que esse programa serve apenas para usos pacíficos, e especialistas confirmaram que seu desenvolvimento ainda deixa o Irã longe de ser capaz de produzir o urânio enriquecido no grau necessário à fabricação de armas nucleares.

Há sem dúvida pouca cautela nas atitudes tomadas pelo governo de Teerã que, na discussão sobre confrontação nuclear, está perseguindo seus próprios objetivos políticos de curto prazo, utilizando o ressentimento nacionalista de uma larga porção do povo iraniano com relação às provocações dos EUA, como meio de distração das tensões sociais e políticas dentro do próprio Irã. As ações das facções burguesas, que controlam o governo iraniano, não fizeram nada para defender o povo do Irã da ameaça da guerra. De fato, essas facções fazem o jogo da direita militarista que controla a Casa Branca.

Cálculos políticos domésticos têm um papel proeminente na nova maquinação bélica dos EUA. O colapso do apoio popular para as políticas de Bush—ele próprio manifestação de uma crise profundamente enraizada nos EUA—encorajou o governo a embarcar em outra campanha militar de agressões como meio de atrair a opinião pública e suprimir a oposição.

Previsivelmente, o governo Bush respondeu ao último anúncio de Teerã engrenando suas ameaças belicosas. A secretária de Estado Condoleezza Rice disse 12 de abril que o Conselho de Segurança das Nações Unidas deve dar " passos decisivos" contra o Irã para "manter a credibilidade da comunidade internacional". E acrescentou: "não podemos deixar que essas atitudes continuem".

O Secretário de Defesa Donald Rumsfeld descreveu o Irã como "um país (...) que patrocina terroristas". E continuou: "é um país que indicou um interesse em ter armas de destruição em massa".

O governo está seguindo um roteiro virtualmente idêntico àquele usado na corrida para a guerra no Iraque, com um obscuro e pouco substancioso alerta sobre uma suposta ameaça iminente pelas "armas de destruição em massa" que apenas podem ser impedidas por uma mudança no regime daquele país iniciada pelos EUA. Mais uma vez, Washington está dispensando, como algo inútil, o monitoramento das Nações Unidas sobre o programa nuclear iraniano. Poucas dúvidas restam de que, com a quase certa recusa da Rússia, China e talvez de outros membros do Conselho de Segurança de legitimar a ação militar, a Casa Branca de Bush vá novamente declarar a ONU irrelevante, e embarcar na sua própria ação unilateral.

Falando a uma platéia na John Hopkins School of Advanced Internacional Studies, Bush repetiu sua belicosa denúncia contra o Irã feita em 2002, quando disse que este país—juntamente com a Coréia do Norte e o agora ocupado pelos Iraque—constitui um "eixo do mal".

Bush declarou que sua estratégia em relação ao Irã foi baseada numa "doutrina preventiva". Para a linguagem estatal internacional, uma guerra preventiva é uma guerra de agressão com o objetivo de prevenir que um rival aumente seu poder ou consiga um avanço estratégico no futuro. Após o precedente estabelecido pelos julgamentos dos líderes nazistas, em Nuremberg, isso é considerado crime de guerra.

O The World Socialist Website já ressaltou os paralelos existentes entre as políticas utilizadas pelo governo dos EUA e os métodos implementados pelos líderes do III Reich alemão nas décadas de 1930 e 40. O claro desprezo pelas leis internacionais, a agressão militar na base de falsos pretextos, o uso de força exagerada contra vítimas relativamente sem poder são comuns a ambos os regimes. Alguns de nossos leitores podem ter considerado tais comparações exageradas. Mas com as últimas revelações acerca dos planos dos EUA contra o Irã, tal complacência não é mais sustentável.

Existe um poderoso elemento de inconseqüência e mesmo insanidade na ameaça dos EUA ser capaz de usar armas nucleares—pela primeira vez no planeta desde a Segunda Grande Guerra—pelo suposto propósito preventivo de impedir que o Irã desenvolva a tecnologia para produzir essas mesmas armas nucleares.

Petróleo e vantagem estratégica

Sublinhando essa aparente loucura, todavia, está uma clara política que vem sendo seguida pelo imperialismo. Como no Iraque, o motivo principal por detrás das ameaças de guerra contra o Irã não são as armas de destruição em massa, mas o petróleo. O programa nuclear iraniano não é, na realidade, visto por Washington como uma grande ameaça. Assim como no Iraque, armas de destruição em massa funcionam como casus belli para a ação militar com outros objetivos.

Não apoiamos o esforço do governo iraniano na obtenção de armas nucleares, partindo do princípio de que em nenhum sentido elas contribuem no avanço da luta dos trabalhadores no Irã ou em qualquer outro lugar na mesma região. Todavia, mesmo se o Irã estivesse adquirindo armamento nuclear, isso não teria uma maior significação militar, dada a gigantesca força que detém os EUA.

O Irã está, afinal de contas, cercado por países que possuem tais armas—Rússia, Israel, Paquistão, Índia—sendo que alguns deles as obtiveram com apoio aberto de Washington. Não tivesse a ditadura do Xá do Irã (Reza Pahlevi), apoiada pelos EUA, sido derrubada, o programa nuclear que ela iniciou, com o apoio direto de pessoas como Cheney e Rumsfeld, já teria há muito produzido bombas nucleares.

O governo americano está simplesmente explorando a ignorância popular e uma mídia condescendente com relação à situação para criar uma cortina de fumaça por detrás da qual esconde interesses definidos. O Irã possui a segunda maior reserva de gás natural do mundo, além de ser o quarto país no planeta em reservas de petróleo. Existem previsões que tais reservas produzirão ainda por algumas décadas, mesmo após o término do petróleo na Arábia Saudita. Além do mais, Washington está diante de um fato político grave: o Irã começa a emergir como o principal beneficiário da intervenção dos EUA no Iraque, ameaçando a tentativa americana de estabelecer uma hegemonia sobre o Golfo Pérsico e sobre os recursos energéticos estratégicos da região.

Vê-se uma ameaça ainda maior aos interesses norte-americanos no estreitamento dos laços do Irã com a Rússia, China e Europa. Washington não tem nenhuma intenção de permitir aos seus rivais econômicos que tirem vantagens de sua política de sanções econômicas contra o Irã. Os laços entre Irã e Rússia são vistos como um impedimento à tentativa norte-americana de controlar as enormes reservas de petróleo e gás das antigas repúblicas soviéticas da Ásia Central.

A ameaça de uma guerra de agressão contra o Irã e o uso de armas nucleares expressam a crise histórica do capitalismo norte-americano e mundial, e o desequilíbrio acelerado dentro de todo o sistema de estados nacionais capitalistas. Este desequilíbrio e o seu produto maléfico, o risco de uma nova guerra mundial, foi exacerbado tanto pelo colapso da União Soviética como pelo relativo declínio do capitalismo dos EUA em relação à economia mundial.

Dentro da oligarquia dominante norte-americana, estes desenvolvimentos paralelos criaram uma estratégia consensual de exploração da superioridade militar do imperialismo dos EUA com a intenção de reorganizar a economia mundial em função dos interesses dos bancos norte-americanos e corporações transnacionais. Isso significa a tomada de posições e recursos estratégicos—como no Golfo Pérsico—e o uso do militarismo e da guerra para impedir a emergência de qualquer rival, mesmo regional, que coloque em risco a busca norte-americana pela hegemonia global.

Busch negou os planos relatados sobre o uso de armas nucleares, porém, há ampla evidência de que, no meio político norte-americano, o que antes era impensável agora é visto como uma opção viável. Um artigo publicado na última edição da Foreign Affairs, revista que reflete a visão norte-americana da política externa do país, coloca a possibilidade de uma guerra nuclear na qual os EUA poderiam sair vitoriosos, baseados nos avanços tecnológicos de seu sistema armamentista e na deterioração do arsenal nuclear da ex-União Soviética.

"Hoje, pela primeira vez em mais de 50 anos, os EUA estão no limiar da obtenção da primazia nuclear", diz o artigo. " Provavelmente logo será possível aos Estados Unidos destruir os arsenais nucleares de longo alcance da Rússia ou da China".

Um ataque nuclear contra o Irã, país que tem fronteiras com a Rússia, representaria um primeiro teste desta estratégia. Serviria não apenas para devastar o Irã e infligir uma destruição em massa da população civil, como também permitiria ameaçar Rússia, China e qualquer outro poder que se coloque no caminho das metas imperialistas norte-americanas.

Os EUA estão se movendo em direção que inexoravelmente caminha para uma grande e catastrófica guerra que tiraria a vida de milhões de pessoas. Em relação à próxima ação de agressão militar norte-americana, a questão não é "se", mas apenas "quando".

O Iraque já mostrou que dentro da estrutura política atual dos EUA, não há meios para bloquear esta ameaça. Com as novas ameaças ao Irã, o Partido Democrata dos EUA permaneceu em silêncio absoluto.

Em seu artigo no New Yorker, Hersh cita um membro da Câmara, que teria dito que "não há nenhuma pressão do congresso" contrária ao lançamento da guerra.

Nenhuma seção do Partido Democrata convocou a realização de audiências públicas para discutir as implicações políticas, militares, legais e morais dos planos de uma guerra que pode envolver o uso de armas nucleares. Não há nenhuma razão para acreditar que o congresso e os democratas não serão tão cúmplices deste novo ato criminoso quanto o foram da invasão e ocupação do Iraque.

Bastante sintomático da reação dos "liberais" foi o editorial do New York Times da última terça-feira (11 de abril), com a complacente manchete "Fantasias militares sobre o Irã".

"O congresso e a sociedade precisam impulsionar um debate nacional sério, que na realidade nunca aconteceu antes da invasão do Iraque", o Times declara, notando que o governo está fazendo ameaças de uma "ação militar futura em uma linguagem que por vezes faz lembrar os pronunciamentos feitos antes da invasão do Iraque".

O chamado do editorial a um "debate nacional sério" em uma nova guerra de agressão reflete precisamente a linguagem usada pelo Times nos meses prévios à invasão do Iraque. Naquela época, o jornal insistiu para que o governo continuasse a perseguir uma justificativa pseudo-legal para a guerra, e propos um debate para preparar a opinião pública para a invasão. No entanto, o jornal apoiou a ação do governo mesmo quando a Casa Branca ordenou a invasão sem o apoio das Nações Unidas.

O último editorial faz uma advertência sobre as possíveis conseqüências desfavoráveis dos ataques aéreos contra o Irã, no que se refere às tropas norte-americanas no Iraque; questiona também se esses ataques realmente conseguiriam "destruir todo o aparato nuclear iraniano" e descreve uma guerra contra o Irã como uma "loucura temerária". Mas o jornal não denuncia claramente a perspectiva de ataques aéreos ofensivos e o possível uso de armas nucleares como o que essas coisas realmente são: crimes de guerra. Claramente, os editores vêem essas ações como possibilidades reais.

Estado policial no interior do país

As implicações destas possíveis ações de guerra para a própria sociedade norte-americana são assustadoras. Os ataques sem dúvida iriam provocar retaliações, o que seria usado por Washington para intensificar dramaticamente a "guerra ao terror", sob a forma de uma escalada militarista no exterior e a eliminação dos direitos democráticos básicos, no interior dos EUA.

O uso de armas nucleares pelos EUA iria provocar horror e revolta na população norte-americana, e uma massiva oposição. O governo responderia com repressão direta. A perspectiva do povo americano enfrentando uma ditadura fascista-militar como subproduto de um ataque militar como este é bastante real.

As novas ameaças de guerra contra o Irã revivem, mais do que nunca, como única alternativa para esta época histórica: socialismo ou barbárie. A luta contra esta nova ameaça e contra a guerra que continua no Iraque apenas pode ser sustentada pelos trabalhadores norte-americanos, unidos aos trabalhadores e oprimidos de todo o mundo. É necessário assumir a forma de uma luta política contra a oligarquia financeira norte-americana e os seus partidos políticos.

O grande perigo é que a crise capitalista e os seus subprodutos, como o militarismo e a guerra, estão se desenvolvendo muito rapidamente, enquanto os meios políticos de se opor àqueles estão muito atrasados. Isto precisa ser superado através de um reconhecimento consciente da contradição entre a gravidade enorme das questões colocadas e a ausência de qualquer alternativa política dentro do sistema capitalista americano de dois partidos políticos.

Um novo movimento de massas revolucionário, embasado na unidade internacional da classe trabalhadora, precisa ser levado adiante, erguendo uma ampla luta pelo socialismo mundial e contra o já obsoleto sistema dos estados nacionais sobre o qual o imperialismo ainda se sustenta. O SEP (Partido da Igualdade Socialista) e o World Socialist Website lutam para estabelecer os fundamentos políticos indispensáveis para o desenvolvimento de tal movimento.