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A crise no Partido Republicano e a fratura do sistema bipartidário americano

Joseph Kishore
7 de dezembro de 2017

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Publicado originalmente em 26 de Outubro de 2017

O surgimento de um conflito aberto entre o establishment do Partido Republicano e a administração Trump marca um novo estágio na crise política dentro dos Estados Unidos.

O conflito dentro do Partido Republicano chegou ao seu ponto máximo na terça-feira com um discurso no salão do Senado do Republicano Jeff Flake, que anunciou que não tentaria a reeleição e denunciou as ações de Trump de “perigosas para a democracia” e uma ameaça à “eficácia da liderança americana ao redor do globo.” O discurso de Flake veio após uma série de declarações feitas por importantes Republicanos atacando Trump, incluindo os senadores John McCain (presidente do Comitê de Serviços Armados), Bob Corker (presidente do Comitê de Relações Exteriores) e o ex-presidente George W. Bush.

Democratas importantes fizeram fila para elogiar Flake, um defensor de corte de impostos para os ricos e de políticas de austeridades. O líder Democrata no Senado, Charles Schumer, descreveu Flake como “um dos melhores seres humanos que já conheci na política”, acrescentando que “ele fará falta.”

As disputas políticas dentro do Partido Republicano são o último episódio de um conflito dentro do estado americano que surgiu ao longo da campanha eleitoral de Trump e se intensificou nos últimos dez meses desde sua posse. Esses conflitos se dão em torno de importantes discordâncias em política externa, com os oponentes Republicanos de Trump atacando seu ultranacionalismo “América Primeiro” como destrutivo para a dominação global dos EUA, particularmente no que diz respeito às relações com os aliados tradicionais de Washington e ao ataque político/militar contra a Rússia e a China.

Desde o início da sua campanha de eleição, Trump explorou o descontentamento social e econômico e a ampla aversão ao Partido Democrata para cultivar o crescimento de um movimento de extrema-direita, fascista e extra-parlamentar. A escolha de Trump de Stephen Bannon, editor do Breitbart News, como seu estrategista-chefe, pouco depois da eleição mostrou a continuação dessa política na Casa Branca. Como o WSWS então escreveu, “Um homem com laços diretos com organizações fascistas, racistas e supremacistas-brancas será o braço direito do presidente, com poder imenso para determinar a política governamental.”

As políticas fascistas de Trump e Bannon tiveram, e continuam tendo, significativo apoio dentro da elite corporativa e financeira americana. A agenda de contrarrevolução social, cortes de impostos para os ricos e maiores gastos militares da administração Trump tem, além disso, amplo apoio em Wall Street e no Pentágono.

Ao mesmo tempo, seções significativas da classe dominante estão preocupadas com as consequências da eleição de Trump para os interesses estratégicos do imperialismo americano no exterior e para a estabilidade social e política dentro dos Estados Unidos.

Após Trump se solidarizar com grupos fascistas que invadiram Charlottesville, na Virginia, em Agosto, Bannon, que tinha entrado em conflito com o Chefe de Gabinete da Casa Branca e ex-fuzileiro, General John Kelly, foi removido como estrategista-chefe e reassumiu sua posição no Breitbart.

A saída de Bannon, entretanto, teve mais o caráter de uma libertação de suas restrições de atuação na Casa Branca do que o de uma demissão. Desde que deixou formalmente a Casa Branca, Bannon levou adiante uma estratégia política de atacar as maiores lideranças do Partido Republicano e apoiar candidatos desafiantes aos incumbentes Republicanos nas primárias, Flake entre eles, que não estão de acordo com a agenda racista anti-imigrante e ultranacionalista da administração Trump.

Os conflitos políticos dentro dos Estados Unidos refletem processos globais. Em um país após o outro, movimentos de extrema-direita têm explorado o vácuo político criado pelo deslocamento à direita de partidos socialdemocratas e trabalhistas, que há muito tempo deixaram de lado qualquer preocupação pelos problemas que a classe trabalhadora enfrenta.

Na terça-feira, os fascistas do partido Alternativa para a Alemanha entraram no parlamento alemão depois das eleições em Setembro, assegurando 94 cadeiras, beneficiando-se do colapso eleitoral do Partido Social Democrata.

Espera-se que Partido da Liberdade, de extrema-direita, entre no governo austríaco depois das eleições do mês passado, nas quais aumentou seu voto em 7%, conseguindo o segundo lugar à frente dos socialdemocratas. O partido de um populista bilionário ganhou as eleições parlamentares da semana passada na República Checa, que assistiu a um colapso dos socialdemocratas.

Na Grã-Bretanha, o anti-imigrante Partido da Independência do Reino Unidos surgiu como a força política principal no referendo do Brexit do ano passado. Na França, a líder da Frente Nacional, Marine Le Pen, conseguiu 34% dos votos nas eleições presidenciais deste ano, sendo derrotada no segundo turno por Emmanuel Macron. No Japão, o militarista de direita, Shinzo Abe, conseguiu a reeleição como primeiro-ministro com uma margem substancial de votos a seu favor.

Nos EUA, Trump, em aliança com Bannon, está levando adiante uma estratégia semelhante, com o objetivo de ou assumir o controle do Partido Republicano, ou incitar um racha que fraturaria o sistema bipartidário americano.

Em consonância com o que aconteceu no resto do mundo, Trump explorou o caráter reacionário e militarista da administração de Obama, do Partido Democrata e da campanha de Clinton. Ela disputou como a candidata de Wall Street e do aparato militar e de inteligência americano, em aliança com seções privilegiadas da classe-média alta defensoras da política de identidade. Clinton manifestou total desprezo pelas queixas dos trabalhadores, que foram atingidos com demissões em massa e a destruição de salários e aposentadorias, promovendo a alegação mentirosa de que o sucesso eleitoral de Trump foi causado pelo racismo da “classe trabalhadora branca”.

Depois da eleição de Trump, os Democratas se deslocaram ainda mais à direita, agindo na semana passada para remover apoiadores de Bernie Sanders do Comitê Nacional do Partido Democrata. Eles esconderam sistematicamente as amplas consequências da eleição de Trump e a nomeação de figuras como Bannon.

O foco central dos Democratas desde a eleição de Trump tem sido impulsionar uma campanha cada vez mais delirante de uma intervenção russa nas eleições americanas. Isso tem sido feito tanto para resolver os conflitos dentro da classe dominante sobre a política externa quanto, cada vez mais explicitamente, justificar a censura da internet e a destruição da liberdade de expressão.

A preocupação central dos Democratas está em ganhar o apoio das agências militares e de inteligência, que estão surgindo como os árbitros da política americana. A orientação do Partido Democrata foi detalhada em uma coluna de Thomas Friedman, no The New York Times, publicada ontem, em que Friedman pediu novamente uma intervenção militar contra Trump.

Apelando ao Secretário de Defesa James Mattis, bastante conhecido por comandar as forças dos EUA na destruição de Fallujah em 2004, para que “aja”, Friedman escreveu: “Não estou falando de um golpe... Trump precisa saber que agora é o seu jeito ou a estrada – não a sua.” Em outras palavras, os militares precisam tomar o controle, por meio de um golpe ou de outra maneira.

A fratura do sistema político é uma expressão de uma crise incontrolável do capitalismo americano. Nos conflitos da classe dominante, não há lado progressivo ou democrático. Os críticos abertos Republicanos de Trump incluem um criminoso de guerra e defensor da tortura (George W. Bush), um fanático defensor da guerra (John McCain), um aliado próximo de Wall Street e dos militares (Corker) e um defensor de extrema-direita de cortes em gastos sociais (Flake).

Nada progressista pode surgir da solução da crise realizada pelos de cima através de alguma forma de golpe palaciano. Qualquer final desse tipo apenas deslocará todo o sistema político ainda mais à direita, aumentando o assalto sobre a classe trabalhadora e o avanço em direção à guerra mundial.

O grau da crise política que envolve Washington é a marca de uma situação pré-revolucionária. Explosões sociais estão no horizonte. A tarefa crítica para a classe trabalhadora é fazer avançar sua solução própria e independente e não se deixar ser arrastada por qualquer facção da elite dominante. A luta da classe trabalhadora contra Trump e toda a classe dominante coloca a urgente necessidade de construir um movimento político de massas em oposição aos Democratas e Republicanos para derrubar o sistema capitalista.