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Eleições presidenciais: um alerta para Merkel
Por Peter Schwarz
8 de julho de 2010
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Publicado originalmente em inglês no dia 2 de julho
de 2010, no WSWS.
Muitos editoriais de jornais europeus elogiaram a eleição
presidencial ocorrida na Alemanha na quarta-feira, dia 30.06,
como evidência do pleno funcionamento da democracia alemã.
Justificam afirmando que diversos delegados da situação
votaram pelo candidato da oposição.
Na realidade, na história política recente, poucos
foram os acontecimentos manipulados de forma tão cínica
e sistemática como a eleição desta quarta-feira.
Tratou-se do resultado de uma campanha do empresariado e do
establishment político para chamar a atenção
do governo de Angela Merkel, a Primeira Ministra alemã.
Não existem divergências quanto às medidas
assumidas até aqui no percurso político de Merkel:
consolidação fiscal às custas da classe trabalhadora
e uma política externa agressiva (participação
na guerra do Afeganistão, ditames de austeridade contra
a Grécia e outros países endividados). Essas políticas
encontram apoio geral no parlamento, incluindo nas fileiras da
chamada "oposição".
No entanto, diversas críticas surgiram a respeito damaneira
como o governo Merkel está implementando tais políticas.
É acusado de perder tempo demais em disputas internas.
Diz-se que devia por a mão na massa. Dizem também
os acusadores que o governo gasta muito tempo e esforço
procurando fechar acordos com os mais diversos lobbystas, causando
tensões desnecessárias entre a população.
A chanceler é acusada de vacilar entre os interesses
contraditórios no campo governista, em vez de apontar firmemente
um caminho a ser seguido.
Por semanas, grandes organismos da mídia -como o diário
financeiro Handelsblatt, o semanário Der Spiegel,
ou órgãos conservadores como o Frankfurter Allgemeine
Zeitung e o Die Welt- acusaram Merkel de temer aplicar
medidas impopulares, em função de considerações
táticas internas ao seu partido.
O Partido Livre Democrático (FDP) -parte da coalizão
governista, junto com a União Democrata-Cristã,
de Merkel (CDU), e a União Social-Cristã, da Bavária
(CSU)- também está é atacado, por conta de
uma redução no imposto aplicado aos hotéis,
que desacreditou a medida de austeridade orçamentária
do governo. O líder do FDP, Guido Westerwelle, foi acusado
de controle político excessivo, uma vez que acumula os
cargos de ministro das relações exteriores, vice
chanceler e presidente do FDP.
As críticas ao governo dentro dos círculos da
classe dominante estão ligadas à consideração
de uma possível e vantajosa entrada do Partido Social Democrata
Alemão (SPD) no governo, iniciando uma coalizão
com Merkel. O último chanceler pelo SPD, Gerhard Schröder,
conseguiu implementar a "reforma" trabalhista e a "reforma"
no sistema de bem-estar social, a chamada "Agenda 2010".
A coalizão ampla entre SPD e CDU que sucedeu Schröder
aumentou a idade da aposentadoria. Ou seja, o SPD tem comprovada
habilidade em desafiar a oposição pública
e impor ataques contra as condições de vida da classe
trabalhadora -algo tão almejado no atual momento de crise
econômica.
A campanha da mídia burguesa contra Merkel atingiu seu
ápice na eleição presidencial desta quarta-feira.
A demissão do presidente anterior, Horst Köhler,
em maio, foi por si só um aviso ao governo Merkel. Köhler,
de forma não habitual para um governo, defendeu abertamente
a defesa dos interesses econômicos alemães pela via
militar. Com isso, quando ganhou ampla oposição
na mídia, deixou o cargo afirmando que seus críticos
haviam fragilizado a autoridade de seu cargo -era, na verdade,
uma crítica indireta à chanceler, por ser incapaz
de oferecer apoio suficiente.
Depois que Merkel escolheu Christian Wulff, do CDU, para substituir
Köhler, o SPD e os Verdes lançaram Joachim Gauck como
alternativa à presidência. Um ex-ativista dos direitos
civis na Alemanha Oriental e chefe da agência responsável
por investigar os arquivos da Stasi (polícia secreta da
Alemanha Oriental), Gauck foi alardeado como um "candidato
popular" por uma ampla aliança da mídia, desde
o liberal Frankfurter Rundschau, passando pelo Der Spiegel,
até os conservadores Frankfurter Allgemeine Zeitung,
Die Welt e o tablóide Bild-Zeitung.
No entanto, não há evidências de que Gauck
conte com grande apoio da população. A "primeira
eleição livre" na República Democrática
Alemã (RDA - Alemanha Oriental), de março de 1990,
para a Câmara, tão entusiasticamente relembrada por
Gauck em seus discursos, não é relembrada com tanto
carinho pelos trabalhadores da Alemanha Oriental. No momento,
o chanceler da Alemanha Oriental, Helmut Kohl, prometeu ao povo
uma Alemanha reunificada, com "paisagens floridas".
A única herança que os trabalhadores receberam,
entretanto, foi uma terra devastada.
A eleição e seus resultados ressuscitaram o mote
"primeiro traído, depois enganado". Para muitos
cidadãos da RDA, o mote resume as experiências posteriores
à queda do Muro de Berlim.
A Câmara "livremente eleita" durou apenas sete
meses. Sua principal preocupação foi a própria
dissolução. A verdadeira política governamental
vinha de Bonn, então capital da Alemanha Ocidental.
Gauck candidatou-se pelo Neues Forum (Novo Fórum)
e obteve apenas 2,9% do total de votos, acabando repentinamente
com a ilusão de que o grupo encabeçava o movimento
popular. Depois, Gauck usou seu controle da agência responsável
pela investigação dos arquivos da Stasi para acertar
velhas contas.
Sua atual "popularidade" também é falsa.
Apesar dos enormes telões montados ao lado do Bundestag
(parlamento) na quarta-feira, mostrando imagens ao vivo da eleição
presidencial, a praça do parlamento estava praticamente
vazia.
A campanha de Gauck para a presidência tinha por finalidade
mostrar ao governo como as coisas deveriam ser feitas. Gauck foi
fabricado pela mídia como um tribuno do povo, um contrapeso
à classe política desarraigada. Em nome da liberdade
e da responsabilidade, fez campanha por cortes no sistema de bem-estar
e em favor das operações militares no Afeganistão.
Enquanto a mídia declarava que Merkel deveria demitir-se
no caso de uma derrota de seu candidato, Wulff, o campo governista
passou a usar, cada vez mais, a eleição como oportunidade
para mandar um aviso à Merkel. Na primeira e na segunda
votações, onde a vitória exigia uma maioria
absoluta, Wulff perdeu por 44 e 29 votos, respectivamente. Foram
votos de delegados da CDU e do FDP, desafiando Merkel.
Merkel foi humilhada. Wulff venceu somente na terceira e derradeira
etapa, onde uma maioria simples era necessária.
Merkel recebeu uma mensagem cristalina: não mais poderá
contar com o apoio de seu próprio partido, caso não
siga impiedosamente o rumo exigido pelos círculos dirigentes
do empresariado e da aristocracia financeira. Ela "não
pode fugir das expectativas legítimas que depositamos num
governo poderoso", escreveu Heribert Prantl, o editor de
política nacional do Süddeutsche Zeitung.
O presidente Wulff, que vem de um ambiente conservador e católico,
se colocará ao lado de Merkel e procurará imitar
Gauck.
Ao mesmo tempo, ao apontar o nome do conservador Gauck, o PSD
e os Verdes demonstraram estar prontos para reentrar no governo
federal a qualquer momento, dando prosseguimento às políticas
de cortes sociais de Schröder.
Com essa finalidade, o Partido de Esquerda fornece a ambos
a cobertura política necessária. Desde sua formação,
há três anos, tem se mostrado capaz de acabar com
a crescente oposição social e direcioná-la
aos canais políticos inofensivos. Ao mesmo tempo, defende
um retorno do SPD e dos Verdes ao governo, oferecendo todo o seu
apoio.
Na eleição presidencial, essa "cooperação"
atingiu um novo patamar. O Partido de Esquerda fez diversos chamados
ao SPD e aos Verdes, defendendo um candidato conjunto, mesmo que
de um campo mais conservador. Assim, até mesmo levantou
a possibilidade do ex-ministro do meio ambiente, Klaus Töpfer
(CDU), como candidato tri-partidário.
Mas isso não era suficiente para o SPD e os Verdes.
Exigindo que o PE apoiasse Gauck, um anti-comunista declarado,
buscavam forçar o partido a condenar a antiga RDA, dirigida
pelos stalinistas.
Isso era demais para o Partido de Esquerda, cujas raízes
estão no partido stalinista que governava a antiga RDA.
Embora alguns de seus líderes tenham feito campanha para
Gauck, o apoio oficial do partido teria sido demais para o restante
dos seus membros e eleitores.
Assim, oPartido de Esquerda avançou apenas até
a metade do caminho. Na terceira votação, retirou
seu candidato próprio, Lucretia Jochimsen, sem fazer qualquer
recomendação de voto em Gauck. No final, a maioria
dos seus 124 delegados se absteve.
Mesmo assim,o Partido de Esquerda deu um passo adiante rumo
a uma cooperação mais estreita com o SPD e os Verdes.
Se o SPD e os Verdes conseguirem continuar a política de
corte de gastos sociais avançada por Schröder, contarão
com o firme apoio do Partido de Esquerda.
Para o trabalhadores, os acontecimentos de quarta-feira são
uma lição. Confrontada pela pior crise econômica
em 80 anos, a burguesia caminha para formas mais autoritárias
de dominação.
O chamado por alguém que possa "fornecer um sentimento
nacional, que nos diga o que é preciso ser feito"
(Josef Joffe, no Die Zeit), foi ouvido em todo o país.
Somente um movimento independente pela classe trabalhadora -independente
do SPD, do Partido de Esquerda e dos sindicatos reformistas existentes-,
defendendo um programa socialista, pode evitar esse perigo.
(traduzido por movimentonn.org)
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