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Alemanha: milhares de jovens protestam contra ruína do sistema educacional

Por correspondentes do WSWS
23 de junho de 2009

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Publicado em inglês em 2 de junho de 2009.

Cerca de 200.000 estudantes secundaristas, universitários e professores fizeram uma série de manifestações conjuntas em 70 cidades ao redor da Alemanha para protestar contra a ruína do sistema educacional do país. As manifestações de massa na quarta-feira foram o ponto alto de uma semana de ações que incluíram greves isoladas e protestos em universidades individuais. Na capital alemã, estudantes ocuparam temporariamente prédios das universidades Humboldt e Free.

Universidades estiveram sujeitas a cortes drásticos nos anos recentes, com muitos postos de docência vazios permanecendo não preenchidos. Os orçamentos para universidades foram reduzidos enquanto dinheiro foi liberado para o estabelecimento de universidades mais elitistas, como a Einstein Foundation, em Berlim. Muitos dos cortes e deteriorações em cursos universitários ocorreram sob o Processo de Bolonha, que foi inicialmente assinado em 1999 e tinha como objetivo transformar a educação em uma mercadoria.

A isso acrescenta-se a decisão da corte constitucional alemã em 2005 de permitir que governos dos estados implementem novas taxas. Muitos estados alemães introduziram ou estão introduzindo tais taxas, que podem totalizar até 500 euros por semestre. As novas taxas ameaçam muitos estudantes com a pobreza e inevitavelmente forçarão um número considerável a encerrar os estudos prematuramente.

Relatos recentes da mídia fornecem o exemplo de jovens estudantes que foram forçados a trabalhar meio-período em hotéis para suplementar a renda e pagar as taxas. Como funcionários temporários do hotel, eles devem limpar os quartos e fazer as camas por menos de 3 euros/hora.

Uma das principais exigências dos estudantes universitários na quarta-feira foi “libertar a educação para todos”, com a vasta maioria dos estudantes se opondo vigorosamente ao desenvolvimento de um sistema educacional baseado em renda.

Cortes financeiros e de efetivo ao redor do país resultaram em salas de aula superlotadas e uma drástica deterioração da proporção professor-estudante.

Ao mesmo tempo, novos regulamentos quanto aos cursos de bacharelado das universidades levaram à restrições nas escolhas de matérias disponíveis aos estudantes, com cursos cada vez mais orientados às eventuais carreiras. Sob condições onde as perspectivas de emprego para os graduados estão diminuindo rapidamente, em razão da atual crise econômica e financeira, a restritiva estrutura do curso, somada às possibilidades sombrias para o futuro profissional, cria uma mistura explosiva.

Embora um punhado de faixas de sindicatos eram visíveis na manifestação em Berlim, o principal papel dos sindicatos do funcionalismo público que possuem representação entre os professores e outros efetivos da educação foi desmontar e isolar uma onda de ações de protesto e greves que está se levantando através do país. Na segunda-feira, líderes do sindicato do funcionalismo público Verdi usaram uma manifestação de 30.000 trabalhadores de assistência infantil para criar uma plataforma para políticos da situação.

Apesar dos trabalhadores da assistência infantil compartilharem de muitos dos problemas — em termos de cortes financeiros e condições de trabalho deterioradas — que perseguem os estudantes e professores, os sindicatos estão se utilizando de uma tática divisionista sistemática. Eles se recusaram a organizar uma manifestação conjunta de estudantes, professores e trabalhadores da assistência infantil.

A ruína da educação foi conduzida por governos sucessivos — em particular o da coalizão Partido Social Democrata-Partido Verde (1998-2004) e a atual “grande coalizão” (Partido Social Democrata-União Democrata Cristã-União Social Cristã). Em Berlim, os cortes foram implementados pelo senado da cidade, que consiste numa coalizão entre o Partido Social Democrata e o Partido de Esquerda.

Muitos dos participantes das manifestações ao redor da Alemanha eram críticos quanto ao papel dos partidos da situação e dos sindicatos, e era notável que nenhum dos oradores da marcha em Berlim representava um sindicato ou oficialmente reconhecia comprometimento com algum partido político estabelecido.

Repórteres do WSWS estiveram em diversas das manifestações e entrevistaram estudantes:

Berlim

Moritz, 22, estuda ciências sociais na Universidade Humboldt, e Jona, 21, é estudante de engenharia econômica na Universidade Técnica.

Moritz e Jona dissearm que uma das principais razões de sua participação na marcha de cerca de 15.000 pessaos era protestar contra a ruína das universidades em Berlim e a crescente tendência em direção a um sistema educacional de duas classes.

Moritz disse: “Estamos exigindo que o Senado invista 150 milhões de euros adicionais nas universidades de Berlim ao longo dos próximos quatro anos. Esse dinheiro é necessário meramente para manter o status quo nas universidades. Também nos opomos à neo-liberalização dos cursos universitários. Em particular, os novos cursos de bacharelado introduzidos há alguns anos são muito restritivos. A escolha de matérias foi limitada e quaisquer cursos interessantes ou socialmente críticos foram podados.”

Moritz continuou: “As decisões em tais assuntos financeiros são sempre políticas. Estão nos dizendo que agora não existe dinheiro para a educação em razão da crise financeira, mas o dinheiro está sendo liberado para os bancos e, aqui em Berlim, a Fundação Einstein está sendo financiada pelo senado com 40 milhões de euros. Também há planos para reconstruir a Stadtschloss por 100 milhões. O Estado deveria estar investindo em educação básica e no futuro de seus cidadãos, em vez de em projetos controversos.”

Quando questionado sobre o senado de Berlim, Moritz declarou que não possuía qualquer confiança no Partido Social Democrata ou no Partido de Esquerda. “O problema com o Partido de Esquerda é que não é de esquerda. É social-democrata e simplesmente tenta repetir as políticas que o Partido Social Democrata levou adiante na década de 1970.

“A discussão sobre 1968 está no ar após o aniversário de 40 anos desses eventos no ano passado. Mas me parece que uma das principais diferenças entre aqueles anos e o presente é que muitos dos estudantes de 68 faziam seus protestos, mas tinham confiança de que seriam capazes de encontrar empregos num estágio mais tardio de suas carreiras. Hoje na esteira da crise financeira as coisas são muito diferentes. Estamos sendo limitados a uma carreira específica mas sob condições onde é muito questionável se seremos capazes de encontrar um trabalho razoavelmente bem pago ao final de nossos estudos.”

Relatando a situação de sua própria universidade, Jona explicou que o nível e qualidade do ensino caiu dramaticamente — 20 vagas de docência não foram preenchidas na universidade desde 2003.

Bielefeld

Em Bielefeld cerca de 4.500 jovens tomaram parte em uma marcha de protesto através do centro da cidade, que terminou com um comício em frente à prefeitura da cidade. A manifestação foi integrada principalmente por estudantes secundaristas e a ausência de estudantes da universidade local e vários colégios de ensino superior era marcante.

Antes da manifestação a Corte Administrativa em Minden impediu os manifestantes de protestar na junção de tráfico central da cidade. Os jovens manifestantes ocuparam a junção mesmo assim, paralisando o tráfico suburbano por horas. “Aquela foi uma decisão política pela corte”, explicou o estudante Jannis para nosso repórter. “Na época do campeonato mundial de futebol eles disponibilizaram a junção ao público, mas quando se trata de livre expressão da opinião a junção é banida!”

Nosso reporter falou com organizadores e participantes do protesto. Hendrik, um membro da equipe de organização e do conselho estudantil do distrito, fez um balanço positivo da ação e da participação substancial de secundaristas: “Também fomos apoiados por professores que estão descontentes que as atuais condições em suas escolas.” Ele foi positivo sobre o papel assumido pelos sindicatos na disputa, e anunciou novos protestos para o próximo ano escolar, para colocar “pressão sobre os políticos.” Quando questionado sobre o motivo de trabalhadores da assistência infantil não tomarem parte dos protestos ele reconheceu que as táticas sindicais “eram inapropriadas.”

Leipzig

Cerca de 3.000 estudantes e professors participaram da manifestação em Leipzig. O protesto começou no colégio de educação superior (HTWK Leipzig) no sul da cidade e cresceu conforme progredia. Professores em greve se juntaram à manifestação, e enquanto ela percorria o caminho através do centro da cidade estudantes da Universidade de Leipzig também a incorporaram.

Com uma gama de faixas e estandartes, os participantes deixaram claro sua posição crítica quanto ao atual estado do sistema educacional e expressaram sua raiva quanto ao fato do governo liberar centenas de bilhões para os bancos e se recusar a investir em educação e nos jovens.

Robert, que estuda ciência cultural, disse que a universidade está sujeita a sub-financiamento crônico com uma contínua redução dos postos de docência, embora o número de estudantes está aumentando. Na sua opinião é necessário repensar completamente todo o Processo de Bolonha, co-responsável pelas miseráveis condições. Quando questionado se achava que ações de protesto como a de quarta-feira poderiam ser vitoriosas, foi cético: “Olhando para trás, a grande demonstração realizada no ano passado em Dresden não foi vitoriosa. Desde lá nada mudou. Naturalmente protestar é importante, mas não vai longe o bastante. Precisa haver mais.”

Igualmente critico foi Mohamed, estudante de ciência política e estudos árabes. Ele tomava parte da manifestação por melhores condições de estudo, melhores equipamentos nas universidades e um melhor sistema educacional como um todo. Expressou ódio quanto ao modo como as universidades se voltaram à economia privada para o financiamento. “Nos cursos de ciência política e comunicação há um professor que é financiado pelo grupo do setor de energia Vatternfall. Eu me pergunto até que ponto um homem como esse pode nos ensinar ou em que medida suas aulas são determinadas ideologicamente pela companhia para a qual trabalha. A pior parte é que freqüentemente os estudantes não conhecem o histórico do professor.”

Integrando a marcha dos secundaristas e universitários em Leipzig estava um professor, Birgit, que explicou: “Eu estou protestando porque as condições de trabalho em meu emprego pioraram inteiramente do mesmo modo que as condições para secundaristas e universitários.” Ela reclamou do nível de barulho do local onde trabalha, que aglomera crianças demais em cada grupo. “Há menos e menos professores empregados, embora as exigências que nos são feitas cresçam continuamente.” Ela não tinha certeza se o protesto iria ser capaz de mudar a política oficial, mas declarou que era importante “não desistir nunca”.

[traduzido por movimentonn.org]