Em 2009 a humanidade alcançará um recorde lamentável:
pela primeira vez em sua história, mais de 1 bilhão
de pessoas passarão fome.
Estima-se que o número de subnutridos aumente em 100
milhões somente neste ano, chegando a 1,02 bilhões
de pessoas, de acordo com a Organização das Nações
Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO).
O aumento de 11% no índice este ano é produto
direto da crise econômica mundial, combinado com o persistente
aumento no preço dos alimentos. É esperado que a
economia mundial decline mais de 3% neste ano - a primeira grande
contração desde a Segunda Guerra Mundial. A crise
econômia, relata a FAO, "reduziu os salários
e as oportunidades de emprego aos pobres, diminuindo significativamente
seu acesso à comida".
A fome mundial está concentrada em países da
Ásia e do Pacífico (642 milhões de pessoas),
na África Sub-Saariana (265 milhões), América
Latina e Caribe (53 milhões), no Leste Europeu e no norte
da África (42 milhões). A África Sub-Saariana
tem a maior concentração de famintos, enquanto o
Oriente Médio e o norte da África assistem o mais
rápido crescimento da fome(13,5%).
A definição da situação de "faminto"
pela FAO se baseia no número de calorias consumidas pela
pessoa. Dependendo da idade e do gênero em um país
dado, a quantidade varia de 1.600 a 2.000 calorias diárias.
Na verdade, é como se o organismo da ONU simplesmente
subestimasse o número de pessoas que passam fome. Um estudo
publicado no começo deste ano revela que somente nos EUA
12 milhões de crianças estãos em situação
de sub-alimentação (veja: US:
12 million children face hunger and food insecurity). A FAO,
no entanto, estima o número de pessoas que passam fome
nos "países desenvolvidos", como um todo, em
15 milhões.
De acordo com a FAO, o crescimento da fome não é
resultado de uma queda na produção. A produção
de cereal, por exemplo, teve apenas um pequena queda neste ano
em relação a 2008. No entanto, "os pobres são
menos capazes de conseguir comida, principalmente onde os preços
no mercado interno estão muito altos... Ao final de 2008,
o preço da comida ainda custava cerca de 24% a mais do
que custara dois anos antes".
Em outras palavras, o grande crescimento da fome não
está vinculado à incapacidade de produção,
mas à incapaciade de massas cada vez maiores atenderem
sua necessidade mais báasicas.
A FAO destaca três aspectos da crise atual que a tornam
particularmente severa. Primeiro, ela acompanha o rápido
crescimento do preço dos alimentos entre os anos de 2006-2008.
Este crescimento foi guiado em parte pelas atividades especulativas
dos investidores vinculados ao mercado de commodities.
Segundo, a crise econômica mundial. A FAO comenta: "Quando
a crise econômica está confinada a um único
país, ou a alguns de uma determinada região, os
governos conseguem adotar recursos para contornar o problema,
como a desvalorização da moeda, empréstimos
ou aumento da assistência social".
Terceiro, os países mais pobres estão "mais
integrados financeira e comercialmente à economia mundial"
e, por isso, "estão mais expostos às oscilações
do mercado". Estão, portanto, muito suscetíveis
às rápidas mudanças na demanda e oferta globais.
Outro fator relacionado, mas não mencionado pela FAO,
é o modo como o governo dos EUA têm monopolizado
os créditos do mercado para preparar seus multi-trilhionários
resgates bancários, explorando a posição
privilegiada do dolar americano para isso. Os países mais
pobres não possuem esse privilégio e estão
assumindo grandes dívidas de empréstimo como consequência.
Muitos países pobres têm testemunhado um grande
declínio nas remessas recebidas pelos estrangeiros, cerca
de 5% a 8%. Como relata a FAO: "Além disso, as remessas
de dinheiro geralmente continuam sendo enviadas mesmo em períodos
de crise, às vezes tendo até aumentado. A queda
nesses envios acontece neste caso devido à dimensão
da atual recessão econômica mundial".
A FAO também calcula que a ajuda internacional dada
aos 71 países mais pobres cairá em 25%. O total
da ajuda oficial dada a estes paíse tem sido de cerca de
US$ 100 bilhões por ano - insignificante, se comparada
aos trilhões injetados rapidamente no sistema financeiro
mundial ou mesmo se comparada aos gastos militares dos EUA, calculados
em US$ 500 bilhões por ano.
Países que dependem da exportação têm
sido particularmente afetados pela crise econômica. O mercado
mundial estima que suas quedas serão de 5 a 9% neste ano.
As implicações da rápida deterioração
da economia global e do consequente declínio nos níveis
de vida de milhões de pessoas são rapidamente percebidos
pelos oficiais da ONU. O Dr. Jacques Diouf, diretor-geral da FAO,
comentou: "A silenciosa crise de fome... traz um sério
risco à paz mundial e à segurança".
Josette Sheeran, do Programa Alimentício Mundial (PAM),
comentou: "Um mundo faminto é um mundo perigoso".
Muitos comentaristas apontam a possibilidade de repertir-se
a inflação galopante que surgiu em 2008. No começo
deste ano, os países do G8 se reuniram para discutir a
"emergência da fome" global. Alguns comentários,
inclusive, evidenciaram uma preocupação a respeito
do perigo de um levante social e de um processo revolucionário.