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Vinte e cinco anos desde a queda do Muro de Berlim: uma avaliação

Por Peter Schwarz
10 de outubro de 2015

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Publicado originalmente em inglês em 8 de novembro de 2014

O domingo, 9 deste novembro assinala o aniversário da queda do muro de Berlim. Este evento proclama o fim da República Democrática Alemã (RDA), quarenta e cinco anos após sua fundação.

As celebrações do aniversário programadas em Berlim são extensas. Algo em torno de 8.000 reluzentes balões apontando para o muro subirão ao espaço às 7 horas da noite ao som da “Ode to Joy”

Vetustos astros da música pop, tais como Udo Lindenberg e Peter Gabriel, acompanhados pela Banda Estatal de Berlim, darão concertos no Portão de Brandenburgo.

A radiodifusora RBB dedicará um dia inteiro à queda do muro. Um texto de divulgação para a mídia afirma que a programação de aniversário buscará reviver o júbilo infindo de 1989 e tornará palpável a loucura da época”.

O presidente da Alemanha Joachim Gauck já compareceu a uma cerimônia realizada em Leipzig intitulada “Vinte e Cinco Anos de uma Revolução Pacífica”. Lá, ele comparou os protestos contra o regime da ex-RDA, faz 25 anos, às revoluções do século 18 na América e na França e “ao movimento de libertação alemão de 1848”.

“Dezenas de milhares sobrepujaram o temor a seus opressores porque seus desejos por liberdade foram maiores do que seus temores”, proclamou Gauck. ”O que teve início com uns poucos destemidos indivíduos se tornou um movimento de massas que cresceu inexoravelmente e se transformou em revolução pacífica”.

A tentativa de retratar o fim da RDA como uma revolução liberal e promover a atmosfera eufórica que assinala a queda do muro de Berlim tem um propósito: evitar uma avaliação sóbria da reunificação da Alemanha, considerando-se o que realmente aconteceu no outono de 1989. Quanto mais melancólico for o presente, mais avançada a desintegração social, quanto mais evidente o declínio das instituições democráticas, quanto mais virulento for o retorno do militarismo, mais exaltada será a restauração do capitalismo no leste alemão, e a reunificação reluzirá como uma “revolução liberal”.

Contra-revolução social

Do ponto de vista social, o fim da RDA não foi uma revolução, mas uma contra-revolução. Com o retorno do capitalismo, o desemprego, a crassa exploração, a desigualdade social e a miséria retornaram ao leste da Alemanha.

A bem desenvolvida indústria da RDA, que assegurava emprego certo e assistência social para todos, é hoje terra arrasada. A Treuhandansstalt, agência encarregada de privatizar as indústrias estatais, apossou-se de 14.000 empresas nacionalizadas. Algumas foram liquidadas; a maior parte deixou de funcionar. Num triênio, 71% de todos os trabalhadores ou foram forçados a conseguir novo trabalho ou permanecem desempregados. Hoje, o número de postos de trabalho no setor manufatureiro no leste é apenas um quarto do total que se registrava em 1989. Hoje, o número de empregos industriais no leste é apenas um quarto do total existente em 1989.

O resultado é o despovoamento de regiões inteiras, restando a preponderância de pessoas idosas. Em 1989, 16.7 milhões viviam na ex-RDA. Por volta de 2006, o número de habitantes no leste da Alemanha caiu para 14.6 milhões, um decréscimo de 13%. Considerando-se que mais de 60% dos que emigraram tinham menos de 30 anos, e a taxa de natalidade caiu dramaticamente, a idade média da população subiu acentuadamente.

Seus bem desenvolvidos sistemas educacional e de seguro social - como também sua densa rede de instituições foram destruídos. Apenas no estado da Saxônia, que tem mais ou menos 4 milhões de habitantes, mais de 1.000 escolas fecharam desde 1989.

A proclamação de que isto foi meramente uma transição e um processo de ajustagem tem sido trombeteada pelas “reformas” de prosperidade impostas sob a égide das leis do Hartz e da crise financeira de 2008;

Até mesmo após 25 anos da unificação alemã, as condições de vida no leste e no oeste da Alemanha diferem acentuadamente. Em 2013,a renda bruta de um trabalhador nos estados do leste era 25% inferior à de seu companheiro do oeste.

Os bens domésticos, em média 67.000 euros, alcançam apenas a metade de seu equivalente no oeste, em torno de 153.000 euros.

Se houver alguma convergência, ela tomou a forma de puxar os salários no oeste para baixo na direção dos níveis do leste. De acordo com os dados do Federal Statistical Office, a média dos salários reais na Alemanha em 2013 situava-se abaixo do nível de 1995. A REM

A remuneração por hora dos que ganham menos têm de decrescido em termos efetivos mais ou menos 20% desde 1995. Em contraste, remunerações elevadas têm aumentado significativamente.

Os poderes repressivos do estado

Depois da queda do Muro de Berlim, a ditadura do Partido Socialista Unificado Alemão (SED) e a polícia secreta da Alemanha do Leste, a Stasi, foram substituídas pela ditadura dos bancos e das corporações, através de seus políticos alugados, pela mídia controlada, e órgãos de inteligência.

Num retrospecto, e comparativamente com a Agência Americana de Segurança (NSA), e sua congênere alemã, cuja vasta rede de vigilância foi revelada pelo ex-agente Edward Snowden, o aparato de segurança da Alemanha Oriental era, no linguajar americano, uma “fichinha” (bush league). Em relação as instalações da recémorganizada Foreign Intelligence Agency (BND) na Chausseestrasse, as antigas instalações da STASI na avenida Normannestrasse parecem positivamente modestas.

Os serviços secretos que substituíram a Stasi comprovadamente formam um campo para geração de ações extremistas de direita. Em 2003, a Corte Suprema rejeitou um pedido de interdição do Partido Nacional Alemão (NPD) de extrema direita baseado no fato de que um em cada sete funcionários dessa organização partidária constava da folha de pagamento do serviço secreto, tornando-a um “assunto de estado”,de acordo com os juízes. O serviço secreto do estado da Thuríngia financiou no montante de milhares de euro, ao recrutar gente da extrema direita regional da qual emergiram terroristas e fascistas do grupo National Socialista Underground (NSU).

O Muro de Berlim, cuja queda está sendo comemorada no domingo, ressurgiu de novo – nas fronteiras externas da Europa. Os 100º ou 150 que morreram ao tentar atravessar o Muro de Berlim entre 1961 e 1989 são apenas uma fração dos 25.000 que desapareceram desde 1990 no Mediterrâneo em busca de refúgio na Europa.

Direitos democráticos que por muito tempo foram considerados intocáveis agora são alvos de ataques. Dois dias antes das celebrações de aniversário a empresa ferroviária Deutsche Bahn AG, com apoio do governo alemão, tentou proibir a greve dos ferroviários e praticamente, abolir o direito de greve. As negociações consolidadas o momento propostas pelo governo dá à Confederação Sindical Alemã (DGB) um monopólio comparável ao que desfrutava a stalinista Federação do Trabalho (FDGB na Alemanha do Leste. Qualquer ação industrial que não disponha das bênçãos da DGB será considerada ilegal, de acordo com a nova legislação,

Até mesmo as “eleições livres” que muitos manifestantes reivindicavam em 1989 se revelaram uma fraude. Em lugar de figurarem numa única “Lista Unitária” de candidatos como prevalecia na RDA, os eleitores na Alemanha reunificada são obrigados escolher entre vários partidos e os candidatos devem concordar em todas as questões fundamentais. Suas políticas pelas exigências e interesses das grandes empresas.

A volta do militarismo

A consequência mais devastadora da reunificação capitalista é o retorno do militarismo alemão.

Em recente livro, o dirigente do Partido Verde e ex-ministro do exterior Joschka Fischer, desavergonhado porta-vós do imperialismo germânico escreveu que a Alemanha, duas décadas após a unificação, permanecia amarrada “à velha contradição alemã de posição média”. Ele esclareceu: “a Alemanha é, e permanece, muito grande para a Europe e demasiada pequena para o mundo”.

Em 1914 e 1939, a Alemanha tentou resolver esta contradição dominando a Europa a fim de tornar-se uma potência mundial. A investida principal ocorreu em direção ao Leste – a supressão da Rússia. Agora, as elites dominantes da Alemanha seguem a mesma trilha.

Apoiada pela mídia e todos os partidos oficiais, o presidente e governantes alemães proclamam que o “fim das restrições militares” Na Ucrânia, em concerto com os descendentes nazistas ucranianos que colaboraram com os nazistas na II Guerra Mundial, os governos alemão e americano orquestraram um golpe para impor um poder favorável à União Européia. Desencadeiam uma política de belicosa contra a Rússia. Uma guerra nuclear entre a NATO e a Rússia já não é uma hipótese teórica, mas um perigo real. No Oriente Médio, com o armamento dos Peshmerga curdos, o governo alemão sinalizou sua determinação de envolver-se ativamente na próxima redivisão violenta regional.

O que aconteceu em 1989?

As demonstrações que proclamaram o fim da RDA em 1989 não eram a expressão de uma revolução liberal. Serão vistas historicamente como um exemplo clássico de m movimento desencadeado por sentimento geral de desespero e descontentamento com um regime politicamente manipulado e conduzido a um beco sem saída por falta de perspectiva viável.

Contrário aos mitos oficiais, a iniciativa para restauração do capitalismo na União Soviética, no leste Europeu e na RDA originou-se da própria burocracia stalinista dominante. Esta casta privilegiada tinha na década de 1920 usurpado o poder político da classe operária soviética pela usurpação e eventualmente liquidação física da oposição marxista.

Baseava seu domínio nas avançadas relações da propriedade criadas pela Revolução de outubro 1917. Mas ela fez isto como se fosse um parasita que suga as energias de seu hospedeiro depauperando-o e definhando-o até destruí-lo. Pela supressão da democracia dos trabalhadores, o regime stalinista estrangulou o potencial criativo das relações de produção socializadas. Na arena internacional, o Kremlin e seus dependentes partidos comunistas estrangularam todo e qualquer iniciativa revolucionária independente.

Após a II Guerra Mundial, a burocracia stalinista serviu como um importante pilar do status quo assegurador do domínio capitalista em escala global. Em entendimento com os aliados ocidentais, Stalin estendeu a influência de seu regime ao leste Europeu. Os stalinstas aboliram a propriedade capitalista na RDA, na Polônia, na Hungria, na Romênia e em outros países do bloco Oriental, mas ao esmagar o levante operário em 17 de junho de 1953 na Alemanha do leste, suprimiram todo e qualquer movimento independente de sua classe operária.

Estas condições não podiam durar para sempre. Leon Trotsky, o principal oponente marxista do stalinismo, tinha antecipado isto. Em 1938, ao fundar delinear o programa da quarta Internacional, ele escreveu: “Ou a burocracia, tornando-se ainda mais elemento da burguesia mundial no estado operário destruirá a nova forma de propriedade e retrocederá o país no para o capitalismo, ou a classe operária esmagará a burocracia abrindo o caminho para o socialismo”.

A globalização da produção capitalista nos anos 1980 mergulhou as produções econômicas autárquicas nacionais dos países stalinistas em crise. Como previra Trotsky, a burocracia stalinista respondeu procurando criar uma nova base para seus privilégios através da introdução das relações de produção capitalista. Isto foi o significado da eleição de Mikhail Gorbachev como secretário geral do Partido Comunista da União Soviética em 1985.l

O secretário geral do SED, Erich Honecker, hesitou em imitar Gorbachev. Mas a maioria das lideranças do SED desde bastante tempo tinha escolhido o caminho para o capitalismo e para a reunificação. Três semanas antes da queda do muro, o Comitê Central do SED afastou Honecker e o substituiu por Egon Krenz, e em seguida por Hans Modrow. Este,na qualidade de primeiro –ministro, selou o destino da RDA, registrando em suas memórias: “Na minha visão, o caminho para a reunificação foi absolutamente necessário e tinha de ser assumido como determinação”. Günter Mittag, que foi o responsável pela economia da RDA por muitos anos, confessou ao Der Spiegel que tinha chegado à conclusão em 1987 que “Todas as chances tinham sido consideradas”.

As manifestações que se espalharam pelo pais em outubro de em outubro de 1989 foram um impulso para abrir as portas. Este fato foi claro para os dirigentes do Ocidente. “É meridianamente tão claro como se o Espírito Santo tivesse de súbito descido numa praça de Leipzig e mudado o mundo”, confidenciou o então chanceler alemão Helmut Kohl em 2001 a seu biógrafo Heribert Schwan.;

Essa noção, disse ele, surgiu do cérebro adulto e amadurecido de Thierse”, político do SPD da Alemanha do Leste. De fato, a decisão foi tomada em Moscou: “Gorbachev varejou os livros e reconhecer que não podia preservar o regime”.

Os movimentos dos civis, que neste período brotaram como cogumelos, acompanhavam a burocracia stalinista com o propósito da restauração capitalista. Mal surgiam formara uma “mesa redonda” com o SED e eventualmente juntaram-se ao governo de Modrow com o propósito de unificação da Alemanha.

Seus líderes eram recrutados principalmente no meio da classe média. Seus porta-vozes eram pastores, advogados e artistas. O que os aborrecia na RDA não era a opressão política da classe trabalhadora, mas o fato de que lhes faltavam as oportunidades lucrativa em suas carreiras semelhantes às de suas contrapartes do ocidente. Angela Merkel, a atual chanceler, e Gauck, o presidente, iniciaram suas carreiras políticas no leste.

As manifestantes que exigiam eleições livres no outono de 1989 e gritavam o estribilho , “nós somos o povo”, não entendiam estas relações; Eles exprimiam seu menosprezado pela burocracia dirigente.

O movimento, que começou como uma fuga para o ocidente, era socialmente heterogêneo e politicamente confuso.l Não havia objetivo claramente definido nem compreensão das forças sociais em confronto. Por esta razão, podia ser facilmente e manipulado.

1989

O resultado é o despovoamento de regiões inteiras, remanescendo a preponderância de idosos. Em 1989, 16,7 milhões de pessoas viviam na RDA. Em 2006, o número de habitantes na ex-Alemanha do leste, tinha caído para 14,6 milhões, um decréscimo de 13 por cento. Considerando-se que mais 60% dos que emigraram tinham menos de 30 anos de idade, verifica-se, portanto, dramático decréscimo da natalidade com o brusco aumento da idade média da população.

Os bens desenvolvidos sistemas educacional e de assistência social – como também sua densa rede de instituições culturais – foram abolidos. Precisamente na Saxônia, que contava por volta de 4 milhões de habitantes, mais de 1.000 escolas fecharam desde 1989.

A alegação é que tudo resulta meramente de um abrupto processo de transição devido à adoção das “reformas” impostas pelas leis do Hartz e também devido à crise de 2008.

Mesmo após 25 anos da unificação alemã, as condições de vida no leste e no oeste da Alemanha diferem visivelmente. Em 2013, a renda bruta média de um operário nos estados do leste era 25% inferior a de seu congênere ocidental.

Os bens de um lar no leste, avaliados em 67.000 Euros em média, representam apenas a metade de seu valor do ocidente, que é de 153.000 Euros.

Se tem havido alguma convergência, ela tem assumido a forma de empurrar os salários no ocidente da Alemanha para baixo, aproximando-o do valor de seu equivalente no leste. De acordo com dados da Agência Federal de Estatísticas, a média dos salários reais na Alemanha em 2013 situava-se abaixo do nível de 1995. A remuneração por hora de trabalho percebida pelos que ganham menos caiu 20% expresso em valores reais desde 1995. Em contraste, as rendas superiores aumentaram significativamente.

Os poderes repressivos do estado

Após a queda do muro de Berlim, a ditadura do stalinista Partido Socialista Unificado da Alemanha (SED, sigla alemã) e da Stasi, polícia secreta da Alemanha do leste, foi substituída pela ditadura dos bancos e das corporações, por meio de políticos cooptados, pela mídia controlada e pelos órgãos de inteligência de direita.

Num retrospecto, comparado com a National Security Agency (NSA) americana, cuja vasta rede de inteligência foi desvelada pelo especialista Edward Snowden, o aparato de segurança da Alemanha do leste, a Stasi, era no linguajar típico americano,“fichinha”. Próximo à Chausseestrasse, as instalações da Stasi na Normannestrasse parecem realmente modestas.

Os serviços de inteligência que substituíram a Stasi tornaram-se terreno fértil para o extremismo de direita. Em 2003, a Corte Suprema rejeitou um processo de interdição do Partido Nacional Alemão (NSD, sigla alemã) de extrema direita baseado no fato de que um em cada sete funcionários do partido figurava na folha de pagamento do Serviço Secreto, tornando a organização “assunto de estado”, de acordo com os juízes. O serviço de inteligência da Thuringia, financiou ao custo de centenas de milhares de Euros, militantes de extrema-direita, núcleo de que surgiu o grupelho fascista e terrorista denominado National Socialist Underground (NSU).

O muro de Berlim, cuja queda se comemorará no domingo, ressurgiu margeando os limites externos da Europa. Os 100 a 150 que morreram ao tentar transpor o muro de Berlim entre 1961 e 1989 constituem apenas uma fração dos 25.000 que morreram desde 1990 no Mediterrâneo em busca de refúgio na Europa.

Direitos democráticos por muito tempo considerados intocáveis estão agora sob ataque. Dois dias antes das comemorações de aniversário, a companhia ferroviária Deutsche Bahn AG, com apoio do governo alemão, tentou impedir a greve dos ferroviários e, com todos os efeitos, abolir o direito de greve. A lei unificada das negociações trabalhistas no momento em discussão nas esferas governamentais assegura à Confederação Única dos Sindicatos (DGB, sigla alemã) monopólio comparável ao da stalinista Federação do Trabalho (FDGB) da ex-RDA. Qualquer ação no âmbito industrial que não receba a bênção da DGB será considerada ilegal segundo a nova lei.

Até mesmo as “eleições livres” que muitos manifestantes reivindicavam em 1989 tornaram-se uma fraude. Ao invés de serem apresentadas numa “lista única” de candidatos como prevalecia na RDA, os votantes na Alemanha reunificada são obrigados a escolher entre vários partidos e candidatos que concordem em todas as questões fundamentais. Suas políticas são determinadas pelos demandas e interesses das grandes empresas alemães. Como resultado, a expressão econômica dos estados do leste caiu para menos de 50%, um decréscimo histórico.

O retorno do militarismo

A mais devastadora conseqüência da reunificação capitalista é o retorno do militarismo germânico.

Em seu recente livro, o líder do Partido Verde e ex-ministro do exterior Joschka Fischer, desavergonhado porta-voz do imperialismo alemão, escreveu que a Alemanha, duas décadas após a reunificação, permanecia contida na “velha contradição de uma posição média alemã.” Ele pontificou: a Alemanha é e permanece muito grande no conjunto europeu e muito pequena perante o mundo.

Em 1914 e 1939, a Alemanha tentou resolver esta contradição conquistando a Europa na pretensão de tornar-se potência mundial. A principal investida direcionou-se para o leste – a supressão da Rússia. Agora, as elites governantes de novo escolheram o mesmo caminho.

Apoiado na mídia e em todos os partidos oficiais, presidente e governo alemães proclamam o “fim das restrições militares”. Na Ucrânia, em concerto com os descendentes dos colaboracionistas ucranianos na II Guerra Mundial, a Alemanha e os governantes americanos orquestraram um golpe com a finalidade de criar um governo pró-União Europeia. A provocações de guerra contra a Rússia cresce. Uma guerra nuclear entre a NATO e a Rússia já não é uma hipótese meramente teórica. No Oriente Médio, através do armamento dos Peshmerga * curdos, o governo alemão demonstrou sua determinação de envolver-se ativamente na próxima redivisão regional.

O que aconteceu em 1989?

As manifestações que proclamaram o fim da RDA em 1989 não foram a expressão de uma revolução liberal. Serão vistas historicamente como exemplo clássico de um movimento desencadeado por um sentimento geral de desesperança e descontentamento com o regime que era politicamente manipulado e direcionado para um beco sem saída por falta de perspectiva viável.

Contrariando mitos oficiais, a iniciativa para restauração do capitalismo na URSS, no leste europeu e na RDA derivou da própria burocracia stalinista. Esta casta privilegiada na década de 1920 usurpou o poder político da classe trabalhadora soviética ao suprimir e consequentemente liquidar fisicamente a oposição marxista.

Ela baseou seu domínio nas relações avançadas da propriedade criadas pela Revolução de Outubro de 1917. Mas o fez como um parasita que suga seu hospedeiro e no final o destrói. Ao suprimir a democracia dos trabalhadores, o regime stalinista estrangulou o potencial criativo das relações de produção socializadas. Na arena internacional, o Kremlin e seus partidos comunistas subordinados estrangularam todo e qualquer movimento revolucionário independente.

Após a II Guerra Mundial, a burocracia stalinista serviu de importante pilar do status quo que assegurou a dominação continuada do capitalismo em escala global. Em entendimento com os aliados ocidentais, Stalin estendeu a influência de seu regime no leste europeu. Os stalinistas aboliram a propriedade privada na Alemanha do Leste (RDA), Polônia, Hungria, Romênia e outros países do bloco oriental, mas ao esmagar em l7 de junho de 1953 o levante operário da Alemanha Oriental, eles suprimiram todo o movimento independente da classe operária.

Estas condições não podiam durar para sempre. Leon Trotsky, o principal oponente do stalinismo tinha antecipado esse desfecho. Em 1938, no programa de fundação da Internacional, escreveu:

“Ou a burocracia, transformando-se cada vez mais no órgão da burguesia mundial em um estado de apoio ao capitalismo, ou a classe trabalhadora esmagará a burocracia e abre o caminho para o socialismo”.

A globalização da produção capitalista nos anos 1980 mergulhou a economia autárquica dos países socialistas em crise. Seguido previra Trotsky, a burocracia stalinista reagiu procurando criar nova base para seus privilégios através da introdução das relações de produção capitalistas. Foi isto o significado da eleição de Mikhail Gorbachev como secretário-geral do Partido Comunista da URSS em 1985.

O secretário-geral do SED, Erich Honecker, hesitou em imitar Gorbachev, mas a maioria das lideranças do SED havia bastante tempo tinha escolhido a via capitalista e a reunificação. Três semanas antes da queda do muro, o Comitê Central afastou Honecker substituindo-o por Egon Krenz e, em seguida, por Hans Modrow.

Modrow, na qualidade do último primeiro-ministro do SED, selou o destino da RDA, e relembra em suas memórias: “No meu ponto de vista, o caminho para a unificação era absolutamente necessário e tinha de ser palmilhado com determinação”. Günter Mittag, responsável pela economia da RDA por muitos anos, confidenciou ao Der Spiegel que tinha chegado à conclusão em 1987 que “todas as oportunidades tinham de ser estudadas”.

As demonstrações que se estenderam pelo país em outubro de 1989 foram impulsionadas a portas fechadas. Isto tornou-se claro aos que estavam no poder no oeste. “É completamente errado agir como se o Espírito Santo descera sobre as praças de Leipzig e mudasse o mundo”, confidenciou o então chanceler alemão em 2001 a seu biógrafo Heribert Schwan.

Essa noção, disse ele, surgiu do “cérebro adulto e educado de Thierse”, político do SDP do leste. De fato, a decisão foi tomada em Moscou: “Gorbachev examinou detalhadamente os livros e chegou à compreensão de que não podia manter o regime”.

Os movimentos de direitos civis, que à época brotavam como se fossem cogumelos, concordaram com a burocracia stalinista quanto ao objetivo da restauração capitalista. Mal se inteiraram, sentaram-se e entenderam-se com o SED na “Mesa Redonda” e logo formaram o governo com Modrow a fim de preparar a unificação da Alemanha. Seus líderes foram recrutados principalmente no seio da classe média. Seus porta-vozes eram pastores, advogados e artistas. O que eles abominavam na RDA não era a opressão política exercida pela classe operária, mas o fato de que lhes faltavam oportunidades lucrativas em suas carreiras iguais a suas contrapartes no Ocidente. Angela Merkel, a atual chanceler, e Gauck, o presidente, iniciaram suas carreiras políticas no leste.

As manifestações que reivindicavam eleições livres no outono de 1989 e repetiam o estribilho “Nós somos o povo”, não entendiam esse relacionamento. Apenas exprimiam seu desencanto com a burocracia.

O movimento iniciado como uma fuga para o ocidente era socialmente heterogêneo e politicamente confuso. Não tinha nem um objetivo claro nem uma compreensão das forças sociais em confronto. Por estas razões, podiam ser facilmente manipuladas.

As perspectivas do Partido da Igualdade Socialista

Somente um partido tinha previsto este desenrolas 25 anos antes – a Liga dos Trabalhadores Socialistas (Bund Sozialistischer Arbeiter - BSA), predecessor do Partido da Igualdade Socialista (Partei für Soziale Gleichheit – PSG). Em inúmeros informes, artigos e folhetos, mais tarde publicados no formato de livro sob o título The End of the GDR (O fim da RDA), nós advertimos sobre as consequências devastadoras da restauração capitalista.

Também predissemos o retorno do militarismo germânico. Conforme declaramos em relatório do BSA de 02 de junho de 1990: “o imperialismo germânico considera-se mais ou menos impossibilitado de expandir-se “pacificamente”, isto é, por meios puramente econômicos. Tal circunstância leva à restauração dos meios tradicionais da política expansionista germânica – o militarismo”. O BSA não tinha influência política suficiente na RDA para deter a restauração do capitalismo. O regime stalinista do SED perseguia amargamente o movimento trotskista há décadas e suprimia as críticas marxistas ao stalinismo. Ai reside seu maior crime, e não que privasse os aproveitadores da “liberdade”, de especuladores e carreiristas pequeno-burgueses.

Em 1989, os trabalhadores da RDA foram surpreendidos. Privados do conhecimento de sua própria história pelas falsificações stalinistas, impedidos do intercâmbio de ideias políticas e de organizarem-se livremente faltavam-lhes compreensão e clareza programáticas de que necessitavam para opor-se ao capitalismo.

Nenhum dos problemas da época encontrou solução. Por todo o mundo, a classe trabalhadora hoje está a braços com renda decrescente, desemprego, cortes da assistência social, repressão do estado burguês e a ameaça de guerra.

Uma avaliação dos últimos 25 anos, um entendimento dos acontecimentos de 1989, o caráter da RDA e o papel do stalinismo são requisitos para a condução da luta contra a reação capitalista de nossos dias.