O Legislativo só legisla conforme seus interesses; o Executivo, além de não ter legitimidade, não vê diferenças entre público e privado; e o Judiciário ou rasga a Constituição ou se acovarda diante dela. Chegamos ao ponto de o presidente do Senado desobedecer uma decisão judicial expedida por um ministro do Supremo Tribunal Federal - e não sofrer nenhuma sanção. Pelo contrário: após a desobediência, o plenário do STF decidiu em favor do senador.
Nesta altura do campeonato, tudo já foi dito sobre a vitória de Trump nas urnas - desde a incompreensão/compreensão da geografia e fatiamento sociológico dos votos até a insatisfação da maioria local e da "esquerda universitária" do Brasil - aquela mesma que faz manifestação na Vila Madalena e Largo da Batata, acha que via Facebook coloca a boca no mundo, mas não vai além das fronteiras dos seus grupos de WhatsApp.
Parece filme de comédia, tipo pastelão, mas é um terror da pior espécie que assistimos no País. A chegada do governo interino é uma afronta a todas as conquistas democráticas nos últimos 13 anos. Acabaram com tudo em 6 dias, varrendo direitos e protagonismos sociais para debaixo do tapete deles já altamente imundo.
Precisamos voltar às ruas e lutar, juntos, por uma reforma política decente. Lutar, juntos, por uma reforma tributária em que o "1% mais rico" pague mais impostos, e os outros 99% paguem menos. Lutar, juntos, para que os milhões de brasileiros que dependem de suas aposentadorias não tenham seus salários atrasados, e para evitar que uma reforma previdenciária injusta e mal planejada seja feita.
Nos diálogos, gravados em março deste ano, ao que tudo indica pelo próprio Machado, Jucá e seu interlocutor falam sobre a Operação Lava Jato, na qual ambos são investigados, e o estrago que ela pode causar no PMDB e também no PSDB, partido do qual foram filiados. O conteúdo das conversas é estarrecedor.
Sinto uma paz interna ao imaginar que, a partir de agora, seremos governados por homens com a competência e honestidade de um Romero Jucá, um Moreira Franco, um Eliseu Padilha, capitaneados pelo genial Henrique Meirelles na Fazenda. Cheguei a questionar o fato de todos eles terem feito parte de quase uma década de governos do PT, contudo, a dúvida sumiu da minha cabeça rapidamente quando me lembrei de que, dessa vez, eles serão liderados pelo Michel.
Uma vez aprovado o impeachment de Dilma, qualquer desculpa será motivo para derrubar um governo legitimamente eleito, mas com baixa popularidade ou dificuldade em conseguir apoio junto ao legislativo.
Se o impeachment avançar, teremos, como forma de renovar a política e dar resposta às cobranças das ruas, o PMDB, partido que apoiou o atual governo, do PT, até concluir que ele não tinha mais forças para sustentar as barganhas tradicionais, aliado ao partido derrotado nas últimas eleições, o PSDB.
O vice-presidente, pobre Michel, sabe que agora é a sua única chance de se tornar o homem mais importante do País. E essa cartada vale ouro. Mas, para que ele seja o homem mais importante do País, seu partido precisa ser - enfim - o protagonista. Por isso, o PMDB precisa de um novo PMDB.
Hoje o Brasil já está grande o bastante para se cuidar sozinho, mas ele não sabe o que fazer. A solução para tudo isso mudar não é nenhum remédio com resultado instantâneo ou um salvador da pátria. É lucidez e força de vontade.
Ou seja, tudo muda de um minuto para o outro. Uma coisa permanece, no entanto, e cada dia mais forte: o clima de tensão no País, o acirramento ideológico e o fanatismo de ambos os lados. As pessoas não mais discutem com argumentos -- com base em suas fontes de informação favoritas, em sua capacidade de interpretação e análise e em sua opinião, pendor ideológico etc --, mas usando xingamentos, ódio, intolerância.
Enquanto escrevo, acaba de ser confirmada a homologação no STF da delação premiada do senador Delcídio Amaral. Em sua delação o senador envolve quase toda a República em negócios pouco republicanos. Até o finado PFL é citado. Mas salta aos olhos a exposição das entranhas dos últimos 13 da história do país sob o governo petista.
Os políticos mais mencionados são a presidente Dilma e o ex-presidente petista Lula, mas acusações graves de indicações de ex-diretores da Petrobras são atribuídos ao vice Michel Temer e ao presidente do Senado, Renan Calheiros, ambos do PMDB.
Não vou protestar no domingo, mas isso não significa que eu seja a favor do governo ou que condene aqueles que vão protestar. Mas, por também considerar que, neste momento, o impeachment traria mais prejuízos que vantagens, torço para os protestos de agora serem menores do que os anteriores. E torço, sobretudo, para que as manifestações sejam tranquilas, sem confrontos, e para que os entusiastas da ditadura fiquem em casa, recolhidos às suas insignificâncias.
Quem acompanha o noticiário político, sabe: desde a última eleição presidencial, em 2014, instalou-se no Brasil um clima de extrema intolerância, principalmente quando se trata de política. Ambos os lados, defensores do governo e opositores, disparam ataques a todo o momento, tanto através das redes sociais quanto do mundo analógico. Pior: além de manifestarem-se espontaneamente em seus perfis e rodas de conversa, os militantes têm cada vez mais buscado o confronto.
É claro que o ex-presidente Lula precisa ser investigado, caso a Justiça ache necessário. Mas existe uma drástica diferença entre um julgamento comum e um julgamento midiático. O ex-presidente, graças ao espetáculo, já foi escrachado independente de ser culpado ou não. E isso não tem volta.