Censura: o dia que o MinC brigou com o Facebook

Escrevo este post para relatar e registrar uma bela novidade e uma bela polêmica, ambas ocorridas nesta semana de meados de abril.

A novidade veio do lançamento oficial do Portal Brasiliana Fotográfica http://brasilianafotografica.bn.br/ resultado de uma parceria entre a Fundação Biblioteca Nacional e o Instituto Moreira Salles. Em seu acervo, além de uma bela curadoria, imagens históricas dos séculos XIX e XX.

A polêmica envolve o Ministério da Cultura, que decidiu adotar as providências legais cabíveis contra o Facebook – às vésperas do Dia do Índio, que será comemorado domingo (19/4), pois a rede social censurou uma foto publicada num post do MinC, que continha uma foto de 1909, feita por Walter Garbe, de um casal de Índios Botocudos, em que aparece uma indígena com o dorso nu. Horas depois da publicação, o Facebook apagou a imagem.

A foto censurada é essa do post e pode ser conferida na íntegra no link

Segundo página do Ministério, este solicitou o desbloqueio, mas a empresa manteve a decisão de censurá-la alegando que não se submete a legislação local e que tem regras próprias, que aplica globalmente.

Diante do fato, o Ministério da Cultura protestou declarando que o Facebook, ao aplicar termos de uso abusivos e sem transparência, tenta impor ao Brasil, e às demais nações do mundo onde a empresa opera, seus próprios padrões morais, agindo de forma ilegal e arbitrária. E mais… que tal postura fere a Constituição da República; o Marco Civil da Internet; o Estatuto do Índio e a Convenção da Unesco sobre Proteção e Promoção da Diversidade e das Expressões culturais. Também desrespeita a cultura, a história e a dignidade do povo brasileiro.

O final desta história é… ao anunciar que acionaria judicialmente o Facebook contra censura na rede, a foto do casal de Índios Botocudos que havia sido retirada voltou a ser incluída na fanpage do Ministério.

Finalizando, compartilhei o assunto, com o intuito de apontar que o tema não encerra por aqui. Na execução de nossas atividades profissionais e mesmo individuais, não estamos livres da tarefa de pensar, discutir e mesmo agir em relação à questões desta natureza. Também é nosso papel discutir ampla e democraticamente o direito autoral, a governança da internet, ou ainda iniciativas como a #‎HumanizaRedes, que pretende conciliar liberdade de expressão e de informação com garantia dos direitos, respeito à diversidade e combate ao discurso de ódio e à discriminação em todas as suas formas.

Lao Tsé bibliotecário?

Lao.Tse

Lao Tsé: “Lao” significa criança; “Tsé”, velho, maduro, sábio. Nascido na China no final do século VII a. C., diz-se que seria oficial da dinastia Zhou encarregado de compilar documentos históricos.

Outras fontes relatam que ele teria sido contemporâneo de Confúcio considerado outro grande mestre da filosofia chinesa. E os dois teriam se encontrado quando Lao Tsé trabalhava como arquivista, ou compilador de documentos, na Biblioteca Imperial da dinastia Zhou. De acordo com essas histórias, eles discutiram durante meses e Lao Tsé teria influenciado o pensamento confucionista.

Diante do deterioramento da situação pública chinesa, a perda de poder da dinastia Zhou, Lao Tsé decidiu retirar-se da China cavalgando um búfalo preto e, no desfiladeiro Han Gu, o guarda da fronteira desejou que aquele sábio não saísse da China sem antes deixar algo escrito: até então, eles eram divulgados apenas com a palavra falada. Naquela ocasião, Lao Tsé teria escrito o Tao-te King, cujo título é traduzido por “O livro do caminho e da virtude” ou “Livro clássico do sentido e da vida”. Depois disso, Lao Tsé teria ido em direção ao oeste e não voltou a ser registrada a sua aparição.

Tao-te King, é considerada a obra basilar da filosofia taoísta, e um dos livros mais traduzidos, juntamente com a bíblia. O taoísmo clássico inspirou um movimento intelectual chamado xuanxue (aprendendo com o misterioso), que dominou a elite chinesa e a alta cultura dos séculos 3 ao 6 de nossa era. Dessa forma, Lao Tsé influenciou não apenas o pensamento filosófico, mas a literatura, a caligrafia, a pintura, a música chinesas.

 

A imagem de Lao Tsé e algumas informações foram retiradas da coluna Ser e Ter da revista Performance Líder e trata-se de um recorte da obra do italiano  E. Montariello, exposto na Biblioteca Humanitas – na qual também sou bibliotecária!

O que fichas catalográficas tem em comum com crowdsourcing

Primeiramente, você observa nas Bibliotecas – geralmente universitárias – colegas bibliotecários inconformados, e até mesmo mau humorados, por ficar horas e mais horas elaborando fichas catalográficas de teses e dissertações.

Depois, você lê, ouve, come, respira e transpira que estamos na era da informação, da colaboração, da participação, etc, etc, etc.  Então… bingo!!! Que tal um crowdsourcing?

Não gosto muito de “estrangeirismos”, mas se me for útil e funcional, por que não usar? Crowdsourcing ao pé da letra vem da adesão de duas palavras inglesas, crowd, que significa multidão e source, que significa fonte, origem, raiz e na sua melhor tradução para o termo, fonte de informações.

Crowdsourcing, são então pessoas que se unem para resolver problemas em conjunto, criar novos produtos, testarem sites, criarem conteúdo, encontrarem soluções e muito mais. E é uma tarefa feita por nós há muito tempo, não é uma novidade da internet, as cooperativas são exemplos de crowdsourcing, determinados movimentos também (esse conceito quem me passou foi a mega bibliotecária e amiga Marchelly Porto).

Então mãos à obra. O desafio era encontrar alguém que auxiliasse a montar um código de programação para um sistema de geração automática de ficha catalográfica de teses e dissertações; disponibilizar este formulário numa webpage, e os próprios usuários informar os dados. Gerando assim, mais autonomia ao usuário, e também empregando os bibliotecários em atividades afins na biblioteca.

Encontrei isso já pronto. Quem me cedeu gentilmente o código fonte, para livres adaptações às necessidades das bibliotecas, foi a analista de sistemas Maria Alice Soares de Castro, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo.

De posse do código, comecei a esboçar e adequar os campos. Contei com parceria das bibliotecárias da Universidade  Federal de Santa Catarina, e o então aluno de ciências da computação e estagiário, Bernardo Egelke, que foi o responsável pela implementação do código PHP.

O resultado pode ser conferido nesta página http://ficha.bu.ufsc.br/

Alguns testes com usuários, e percebi que havia muitas dúvidas de como preencher estes campos. Fez-se necessário a elaboração de um tutorial, http://portalbu.ufsc.br/ficha/

Sei que não está dentro das normas de arquitetura da informação, mas após vários testes, resolvi deixar assim, por permitir a leitura em softwares para pessoas cegas ou com baixa visão.

Outro detalhe, resolvemos chamar de Ficha de Identificação da Obra, para não “ferir” o trabalho intelectual do bibliotecário. Afinal, uma ficha catalográfica, precisa ter a CDU/CDD e Cutter, o que não temos aqui.

Agora, o próximo desafio deste crowdsourcing (preciso do auxílio de mais bibliotecários e analistas de TI), é usarmos estes dados que o usuário já informa, e, importar diretamente para os sistemas automatizados das bibliotecas. Sei que foram feitos contatos prévios com o Pergamun, mas não sei como está esse processo. A ideia é que um bibliotecário possa checar algumas informações básicas: confirmar se a tese, dissertação existe,; se está impresso e depositado na biblioteca; e, verificar os metadados, e importá-los já para a catalogação.

Outro modelo muito bem adaptado,  foi elaborado pela Biblioteca da Universidade Federal de Santa Maria, disponível em  http://cascavel.ufsm.br/ficha_catalografica/. Este está com o visual mais parecido com o código cedido pela Maria Alice, ou seja, não foram implementadas folhas de estilo.

Tá… eu sei que tem cloud computing, big data, anotações semânticas e tudo mais, mas às vezes somos desafiados nas pequenas coisas do dia a dia, e não temos verbas para gastar. Aliás, em alguma das minhas próximas postagens quero abordar a seara dos repositórios, sei que vai dar pano pra manga.

No mais, dúvidas, sugestões ou mesmo quem precisar dos códigos, me escreva que enviarei por e-mail.

Tipo uma Bibliotecária ou um Bibliotecário sem Fronteiras

Outro dia, me peguei pensando o que seria uma Bibliotecária ou um Bibliotecário Sem Fronteiras? e agora?

Folheando aqui, zapeando acolá, chego à conclusão de que não é categorizável: me parece que é um “tipo”. É um “tipo” que não segue os estereótipos comuns e massivos.

Típico, da mesma raiz de tipo, num dicionário de filosofia, não tem lá um significado muito rigoroso, mas envolve constantemente a referência ao que é comum e geral e que, justamente por isso, é considerado fundamental.

Fundamental! Eis uma boa tag, uma boa palavra-chave, se assim quisermos. Observando suas ações (este tipo não fica parado, estagnado, está em constante ação) é fundamental a curiosidade; é fundamental a criatividade. Isso se nos referirmos a criatividade sob um ponto de vista humanista, como produzir algo a partir do que se tem, achar uma solução positiva que não estava prevista segundo a lógica corrente.

Assim, ser Bibliotecário sem fronteiras pode significar uma estrada, pode ser um caminho, um meio para ampliar horizontes, conhecer e crescer. Parece mesmo fundamental! Um percurso que leve a uma forma mais refinada e autônoma de exercer a própria linha de ação. Caracteriza uma busca intensa por mais saber, e se traduz em mais “poder fazer”. Isso me lembra os bibliotecários de referencia.

Sempre me foi fundamental, e sempre fui fã, dos bibliotecários de referência. Este ser que me parece também um outro “tipo”. Tipo um oráculo; que sabe de um tudo e de todos.

De modo individual, é aquele que, depois de toda a formação técnica, tem na relação externa (espaço, pessoas, modos) a ação como inteligência de serviço. Sabe configurar e homologar a própria oferta à demanda, ou até mesmo, aguçar uma curiosidade, uma novidade que agrade o outro. Sabe vender o serviço. A biblioteca, os livros, a internet… é tudo relativo; primário é o serviço que presta àquele tipo de clientela (os usuários).

E como chegamos a tal nível de refinamento?

É necessário cuidar do próprio tempo e preparar o próprio espaço. Costumamos estar sempre fora de nós mesmos, na praça, na multidão, onde escutamos falar dos outros. Mas se nos voltamos para dentro, voltamos à única casa que temos, onde se pode compreender a própria realidade, conhecer ao próprio modo de conhecer o mundo e o que fazemos.

 Exige uma preparação, como a que para entender Dante Alighieri. Para compreender a Divina Comédia, segundo palavras de um sábio, são necessários conhecimentos prévios de história, teologia, filosofia, lingüística, entre outras. A Divina Comédia,  um grande livro, faz o ciclo do que é o homem.

Este homem, esta história do homem, é passível de ser lida, mas precede a leitura de si mesmo.

Em São Petersburgo, na famosa Avenida Névski.
Em São Petersburgo, na famosa Avenida Névski.