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Notas sobre a crise política e econômica do sistema capitalista mundial e as perspectivas e tarefas do Socialist Equality Party

Por David North
30 de janiero de 2008

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Este artigo foi publicado no WSWS, originalmente em inglês, no dia 11 de janeiro de 2008 .

O depoimento seguinte foi dado por David North, secretário nacional do SEP dos EUA, em um encontro nacional que ocorreu nos dias 5 e 6 de janeiro em Ann Arbor, Michigan.

1. 2008 será caracterizado pela intensificação significativa da crise econômica e política do sistema capitalista mundial. A turbulência nos mercados financeiros mundiais é expressão não meramente de uma crise conjuntural, mas muito mais de uma profunda crise sistêmica que já começa a desestabilizar a política internacional. Como sempre, os elos mais fracos na cadeia da geo-política imperialista são os primeiros a se romper. O assassinato de Benazir Bhutto no Paquistão, a erupção de guerras civis no Congo e Quênia e o aprofundamento das tensões nos Balcãs sobre Kosovo, são indicativos do crescente estado explosivo da política mundial.

2. Dezesseis anos após a dissolução da União Soviética, um evento que supostamente assinalava o definitivo e irreversível triunfo do capitalismo global, a economia mundial está em frangalhos. A explosão da bolha do mercado imobiliário nos EUA, que havia sido alimentada pelo descontrole nos investimentos especulativos nas hipotecas tipo subprime, resultou na perda global de centenas de bilhões de dólares para os bancos internacionais e outras instituições financeiras. A turva sopa de letrinhas dos instrumentos financeiros—i.e. SIVs (Veículos de Investimentos Estruturados), CDOs (Collateralizad Debt Obligations), etc—havia sido inventada como forma de segurar as hipotecas do subprime, ocultar seu caráter dúbio e pulverizar o risco entre um gigantesco número de instituições financeiras. O resultado é uma crise financeira internacional que, nas palavras de um analista, pôs em xeque a legitimidade do sistema anglo-americano de capitalismo. O Financial Times escreve que “a fé nas inovações financeiras do século XXI se evaporou. Os acontecimentos do último ano mostraram com brutal clareza que a dispersão do risco nem sempre previne choques financeiros, mas que ao invés disso pode ser seu combustível...” (2 de janeiro de 2008)

3. Que a atual situação econômica é extremamente séria não está mais em discussão entre os analistas burgueses. Os mais astutos e francos entre eles reconhecem que ainda há dados insuficientes a respeito da extensão das perdas finaceiras e seu impacto sobre os amplos setores da economia americana e mundial para realizar previsões firmes sobre as consequências reais da crise que continua se desenrolando. Com a compreensão de que bilhões de dólares em títulos deverão ser riscados e considerados perdas irrecuperáveis, a confiança das instituições financeiras na solvência mútua foi fortemente abalada. Logo, já se reconhece amplamente que os mesmos tipos de práticas de empréstimos que criaram a bolha imobiliária, foram aplicados em outros setores da economia americana. Existe um temor crescente de que a recessão americana possa expor a inconsequência nos empréstimos corporativos. Mas nessa situação tensa, esperanças iniciais de que o impacto do colapso nos preços de habitação na economia americana será contido estão se dissipando rapidamente. “A América entrou em 2008”, escreve o Financial Times, “com perigo de recessão ainda maior do que em qualquer outra época desde o colapso da bolha da internet em 2000-01. Assim, a maior economia do mundo luta para manter sua taxa de crescimento diante das limitações sobre o crédito, crise imobiliária e alta dos preços do petróleo”. (2 de janeiro de 2008)

4. Outro importante estudo econômico conclui: “até onde vai a crise do crédito, parece haver amplo acordo de que, somando todos os fatores, a atual crise já é mais séria do que qualquer outra que já ocorreu nos tempos modernos. Os principais bancos e suas instituições financeiras ainda divulgam perdas gigantescas quase diariamente, como resultado da prática de realizar empréstimos de modo imprudente. Os preços imobiliários estão despencando. Existe um sentimento geral de que haverá uma deterioração ainda maior, já que muitos outros que contraíram empréstimos do sub-prime sofrerão pressões ainda maiores assim que as taxas iniciais que eles pagaram aumentarem nesse novo ano.” Strategy Analysis, novembro de 2007, Levy Institute of Bard College p.9)

5. Uma crise na economia do EUA tem implicações diretas e imediatas. O Fundo Monetário Internacional alerta que “para os mercados domésticos da Europa ocidental e Japão os riscos sofreram uma virada negativa” como resultado do “contágio” emanando dos Estados Unidos. (World Economic Outlook, outubro de 2007, p.11) O FMI afirma também que “a continuidade da turbulência nos mercados financeiros globais poderia interromper os fluxos financeiros para mercados emergentes e engatilhar problemas nos mercados domésticos... O crescimento [na Ásia e América Latina] estaria vulnerável ao efeito do crescimento agregado mais lento nas economias avançadas...” [ibidem, p.19]

6. Dentro dos Estados Unidos, a crise na indústria imobiliária é, antes de mais nada, um desastre social para milhões de famílias proletárias e da classe média. É esperado que ao menos 1 milhão de famílias irá perder suas casas devido a execução de hipotecas nos próximos 2 anos. Outros milhões que ainda não estão imediatamente ameaçados com as hipotecas estão sendo seriamente afetados pela crise. Em diversas partes do país é esperada queda de 25% ou mais no preço das casas. Quedas dessa magnitude devem ter um efeito devastador sobre as finanças pessoais das famílias da classe trabalhadora. É sabido que os empréstimos hipotecários têm exercido um papel crucial na suplementação da renda ou dos salários das famílias proletárias e de classe média. Esses empréstimos têm sido usados para financiar a educação dos filhos, pagar contas médicas e atender a outras necessidades urgentes. Essa fonte de renda adicional não estará mais disponível para milhões de pessoas.

7. Assim, o colapso nos preços de imóveis priva amplas massas de trabalhadores americanos de um dos principais meios através do qual elas vêm procurando contrabalançar a alta das despesas criada por 3 décadas e meia de estagnação dos salários. A renda de um trabalhador masculino por volta dos 30 anos é agora 12% mais baixa do que a de um trabalhador da mesma idade em 1978. Como observou o ex-secretário do Trabalho Robert Reich, os “mecanismos” que têm sido empregados para lidar com a deflação na renda têm sido a inserção massiva das mulheres na força de trabalho (de 38% em 1970 para 70% hoje), e a adição de duas semanas na jornada de trabalho anual. Americanos trabalham em média 350 horas a mais do que o europeu. Na virada do século XXI, quando os trabalhadores já alcançaram os limites físicos de sua habilidade para fazer dinheiro através do trabalho, eles passaram a depender mais e mais de empréstimos, usando suas casas como garantia. Agora que esse meio de preencher a distância cada vez maior entre a renda e as necessidades desaparece, milhões se deparam com o espectro de queda num abismo financeiro. Já durante a primeira metade de 2007, falências de pessoas nos Estados Unidos aumentaram 48%. A dimensão dessa situação em que os trabalhadores são extraídos ao seu limite financeiro é demonstrada pelo fato de que 27 milhões de trabalhadores precisarão contrair empréstimos nesse inverno simplesmente para poder pagar suas contas de aquecimento. Mas o uso de cartões de crédito está se tornando tão problemático quanto as hipotecas de imóveis. No momento em que todos os meios tradicionais e individualistas para combater a inexorável realidade econômica desaparecem, a classe trabalhadora é forçada a se voltar para o único meio através do qual pode se defender—aquele da luta social e política, coletiva e consciente, contra o sistema capitalista.

8. O caráter revolucionário e as consequências da luta da classe trabalhadora são determinados acima de tudo pela natureza objetiva da crise do sistema capitalista global. Como já colocado anteriormente, a crise em expansão é de caráter sistêmico. Pela terceira vez em uma década, a economia mundial está sendo sacudida pelo estouro de uma bolha da massiva especulação financeira. A crise financeira do Leste Asiático, que irrompeu no verão de 1997, englobou as aconomias da Tailândia, Malásia, Indonésia, Coréia do Sul, Filipinas e Cingapura e chegou perto de encadear uma quebra financeira internacional. Isso foi impedido apenas por contra-medidas massivas do FMI, que distribuiu bilhões de dólares em socorro monetário para prevenir uma série de cataclismas nacionais. A vulnerabilidade do mercado acionário americano à crise asiática se refletiu em Wall Street. Em apenas um dia, o dia 27 de outubro de 1997, o índice Dow Jones caiu 554 pontos (7,2%) em resposta à crise no mercado asiático.

9. A tendência persistente de surgimento de bolhas especulativas surge de contradições profundamente enraizadas no desenvolvimento do sistema capitalista mundial, atreladas ao declínio histórico da posição global do capitalismo americano. O declínio a longo prazo da lucratividade da indústria instalada nos EUA propeliu a busca das instituições financeiras por fontes alternativas de aumentar o retorno dos investimentos. A existência da elite dirigente americana tem se caracterizado, ao longo dos últimos 30 anos, pela ainda mais ampla separação do processo de acumulação da sua riqueza dos processos de produção industrial. Esta interessa a essa elite dirigente apenas onde a disponibilidade de mão de obra barata provém a possibilidade de garantir uma taxa de lucro grande o suficiente para satisfazer a sua demanda

10. O caráter parasitário da elite dirigente americana é inextrincavelmente ligado à extrema intensificação do militarismo. Em última análise, as guerras no Iraque e Afeganistão, ao mesmo tempo que exploravam os eventos de 11 de setembro como um pretexto, saíram do controle da classe dirigente para manter a posição hegemônica global dos Estados Unidos. A doutrina da guerra preventiva, revelada pelo governo Bush em 2002, continua ativa. Os desafios geo-políticos e econômicos colocados pela existência de rivais emergente devem ser respondidos através do exercício do poder militar. As derrotas sofridas no Iraque, longe de diminuírem o impulso ofensivo do imperialismo americano, criaram novos imperativos para a manutenção do poderio dos EUA. As ameaças contra o Irã têm aumentado em resposta à fragilidade da posição americana no Iraque.

11. Quanto à guerra no Iraque, a ligeira redução na violência no país não significa que a empreitada de Bush obteve sucesso, ou que a guerra está chegando ao seu fim. De certa forma, a diminuição temporária na violência reflete o grau a que chegou a “limpeza étnica”- o produto da invasão dos EUA -nos bairros do Iraque. Há também o efeito do número massivo de mortes que já ocorreram no Iraque. Mas a conseqüência da invasão dos EUA tem sido uma tremenda intensificação das contradições sociais e políticas no país e região. O conflito crescente entre a Turquia e curdos do Iraque ameaça se transformar a qualquer momento em uma guerra. De qualquer forma - apesar do desenvolvimento de um poderoso movimento anti-guerra da classe trabalhadora americana e internacional - não há qualquer prospecto para a retirada das tropas americanas do Iraque num futuro próximo. Como observou a escritora Nir Rosen em artigo recente no periódico Current History, “a ofensiva americana é apenas uma forma de jogar o problema do Iraque para a próxima administração, mas a verdade é que os soldados americanos não deixarão o Iraque nunca. As grandes bases na província de Anbar, tais como Al Assad e Taqadum, foram feitas para durar - ‘uma presença duradoura’, como um fuzileiro me disse. Localizadas no meio do deserto, virtualmente invencíveis e apenas ocasionalmente atingidas por morteiros, essas bases permanecerão por décadas.” [dezembro de 2007, p.413]

Durante os cinco anos que passaram desde a invasão do Iraque, a posição estratégica dos Estados Unidos tem se deteriorado. Particularmente na Ásia Central, cuja dominação é considerada por Washington como central para o seu projeto de hegemonia global, os Estados Unidos são confrontados com um ambiente ainda mais desafiador. O renascimento da influência russa na região e a contínua expansão econômica da Índia e China são vistos como um possível refreamento nas ambições imperialistas dos EUA.

13. Para os estrategistas do imperialismo americano, a questão da China cresce a cada dia. O progressivo crescimento da força econômica chinesa - que deverá assumir uma forma ainda mais militarizada - é visto amplamente como incompatível com os interesses globais dos Estados Unidos. A recente formação do Centro Militar Americano para a África - AFRICOM - é uma resposta direta à crescente influência que a China vem exercendo sobre esse continente. Mas, os conflitos entre a China e os Estados Unidos pela influência no leste asiático são repletos de uma tensão ainda maior e mais imediata. Como escreveu o especialista em política externa Christopher Layne, “se os Estados Unidos tentarem manter sua atual dominação sobre o leste da Ásia, um conflito sino-americano é praticamente certo, porque as estratégias dos EUA incorporaram o instrumento da violência antecipatória como um instrumento para manter a primazia americana. Para um país hegemônico, ‘estrangular o bebê no berço’ pelo ataque preventivo a um adversário em ascensão - isto é, enquanto o país hegemônico ainda mantém o predomínio militar - sempre foi uma opção estratégica tentadora.” [Current History, janeiro de 2008, pp. 16-17]

14. A opção pela guerra se ergue inexoravelmente das ambições e dos interesses geo-políticos globais da burguesia americana. Mas ela também é o produto do estado cada vez mais maligno das relações sociais dentro dos Estados Unidos. O crescimento nos níveis de desigualdade econômica nas últimas três décadas significou a construção de tensões sociais extremadas sob a superfície da vida política oficial e fora dos canais do discurso público sancionado pela mídia. O militarismo imperialista está entre os mais importantes instrumentos políticos empregados pelas elites dirigentes para impedir que as tensões sociais assumam a forma de conflito de classe no seu próprio país.

15. Estudos recentes de Edward N. Wolff, do Levy Economics Institute of Bard College, documentam os níveis extremos de desigualdade social nos Estados Unidos. As estatísticas referentes à distribuição da riqueza e renda revelam o grau extraordinário de separação social. Os principais 1% da população detém 34,3% dos negócios domésticos nos EUA. Os 4% seguintes detém 24,6%, e os 5% seguintes detém 12,3%. No total, os 10% mais ricos da população detém 71% da riqueza nacional doméstica. Os 10% seguintes detém apenas 13,4% da riqueza. E os 80% da base detém apenas 15,3% da riqueza. Os 40% da base dos negócios domésticos detém apenas 0,2% da riqueza!

16. Quando a riqueza não imobiliária é considerada, a estratificação é ainda maior. Os principais 1% das famílias possuem 42,2% da riqueza não imobiliária. Os principais 10% detém pouco menos de 80% dela. Os 80% da base detém 7,5% da riqueza não imobiliária. Os 40% mais pobres possuem apenas 1,1%.

17. Considerando a renda, os principais 1% recebem 20% do total. Os principais 10%, por sua vez, recebem 45% do total da renda. Os 80% da base recebem 41,4%. Os 40% mais pobres recebem apenas 10,1% da renda.

18.Outro conjunto estatístico extremamente interessante diz respeito à condição financeira de famílias localizados nos 3 quintos intermediários (80-60, 60-40, 40-20). Suas casas representam 66.1% de sua riqueza pessoal. Ativos líquidos representam apenas 8,5% de sua riqueza. Instrumentos de investimentos (ações, apólices, economias, etc) representam apenas 4,2%. Esses dados deixam bastante claro como a situação geral dos 3 quintos intermediários depende do valor de suas casas e das condições gerais do mercado imobiliário.

19. Esse fato torna ainda mais significativo o grande aumento na inadimplência dessas seções da classe trabalhadora e da classe média. Em 1983, o DB/O (debt to equity ratio) desses setores era de 37,4%. Em 2004, ele já havia aumentado para 61,6%. Em 1983 a porcentagem da renda mensal desses setores comprometida com hipotecas era de 66,9%. Em 2004, aumentara para 141,2%! Em 1983, a dívida hipotecária desses 3 quintos correspondia a 28,8% do valor da casa. Em 2004, a dívida havia se elevado para 47,6%.

20. Um último conjunto de estatísticas: em 2004, de acordo com Wolff, “os 1% mais ricos detinham cerca de metade de todas as ações de destaque, títulos financeiros, investimentos e ações de empresas. O grupo de 10% das principais famílias detinha de 80 a 85% das ações na bolsa, títulos, fundos de investimento, negócios e imóveis para alugar não-comerciais. Além disso, apesar do fato de que 49% dos lares pussuírem ações da bolsa tanto direta quanto indiretamente, através de fundos mútuos, investimentos, várias contas de pensão, os 10% mais ricos detinham 79% do valor total dessas ações e fundos mútuos.” [“Rising Trends in Household Wealth in the United States: Rising Debt and the Middle-Class Squeeze”, junho de 2007, p.25]

21. Quais as implicações políticas dessas estatísticas? A profunda estratificação da sociedade americana ao longo das últimas 3 décadas está rapidamente chegando ao ponto do aberto e violento conflito de classes. O enferrujado sistema político americano, administrado por 2 partidos políticos que servem de instrumento para a implementação dos interesses da plutocracia dirigente, é organicamente incapaz de responder de forma progressista e credível às demandas do povo por uma mudança social significativa. Em última análise, a demanda por mudanças sociais, ainda que de caráter reformista, esbarram na obstinada determinação da elite dominante de defender sua opulência e privilégios sociais.

22. A eleição fraudulenta de 2000 - como advertiram o SEP e o World Socialist Web Site na época - representou um marco histórico na degeneração da democracia americana. A disposição do Partido Democrata em aceitar o roubo nas eleições demonstrou que nenhuma parcela significativa da classe capitalista americana mantinha interesse na defesa das instituições tradicionais da democracia burguesa. Tudo o que aconteceu desde a eleição veio reafirmar esse julgamento. A totalidade das violações dos princípios democráticos e constitucionais conduzidas sob a máscara da “guerra contra o terror” pós 11 de setembro - nas quais tanto republicanos quanto democratas são cúmplices -representa a mais descarada preparação para formas ditatoriais de domínio de classe. Essas não são aberrações, mas surgiram de uma cada vez mais profunda polarização social que hoje é, em última análise, incompatível com a manutenção das formas tradicionais da democracia americana. Deveria servir de aviso que a prática do “enhanced interrogation”- i.e. tortura - é uma tradução na língua inglesa para um procedimento que a Gestapo de Hitler chamava “verschärfte Verhemung.”

23. Independentemente de quem é nomeado pelos partidos burgueses e eleito presidente, a lógica dos desenvolvimentos políticos e sociais está inexoravelmente levando a uma intensificação dos conflitos de classe. Dessa forma, a estendida deterioração na posição social e no padrão de vida da classe trabalhadora, a sua sempre decrescente participação na riqueza da sociedade, a implacável intensificação da exploração por aqueles que possuem e controlam os meios de produção, lançaram as bases para uma profunda mudança na orientação política e na fidelidade da classe trabalhadora. Aqueles que falham em ver ou mesmo que negam que as profundas mudanças na vida econômica nos últimos 30 anos deixaram marcas profundas na consciência social da classe trabalhadora americana, expõe não apenas seu ceticismo desmoralizado, mas também sua ignorância em história. De fato, a ausência de conflito aberto de classe durante o último quarto de século se coloca em forte contradição com o padrão geral da história americana. Mas esse prolongado período de quietude social, enraizado numa trama de complexos processos econômicos e políticos de interação nacional e, acima de tudo, internacional, está agora alcançando seu fim. A tarefa central do Socialist Equality Party em 2008 é se preparar em todos os aspectos -teórico, político e de organização - para os desafios colocados pela erupção do conflito de classes.

24. Um aspecto importante dessa preparação é a revisão das lições aprendidas no passado em períodos de reviravolta revolucionária. Esse ano marca o 40º aniversário de 1968, ano caracterizado por lutas explosivas internacionalmente e nos Estados Unidos. Os acontecimentos daquele ano puseram em movimento um prolongado período de luta revolucionária internacional e intensos conflitos de classe dentro dos Estados Unidos. Significativamente, as erupções políticas de 1968, foram antecipadas e então se desenvolveram tendo como pano de fundo as crescentes tensões na economia mundial. A desvalorização da Libra britânica em novembro de 1967, seguida pela instabilidade do mercado do ouro europeu em março de 1968, foi o presságio da quebra do sistema de Bretton Woods, em 1971, sobre o qual a reconstrução do capitalismo internacional pós-Segunda Guerra e o papel dominante dos Estados Unidos eram baseados.

25. Repassemos brevemente os eventos daquele ano: no fim de janeiro, o governo do Vietnã do Norte iniciou sua histórica “Tet Offensive”, que desacreditou completamente as alegações do governo Johnson e do Pentágono de que os Estados Unidos estavam ganhando a guerra. O secretário de defesa Robert McNamara se demitiu e uma luta interna feroz irrompeu dentro do governo sobre sua política no Vietnã. Também em janeiro o arqui-stalinista Antonin Novotny foi substituído no cargo de premiê da Tchecoslováquia por Alexander Dubcek, pondo em movimento o que viria a ser conhecido como a “Primavera de Praga”. Em fevereiro Lyndon Johnson quase derrotou o Senador Eugene McCarthy nas prévias de New Hampshire, um evento que foi interpretado como uma enorme derrota política para o presidente em exercício. Em março, o Senador Robert Kennedy anunciou que iria desafiar Johnson para a indicação. Duas semanas depois, Johnson anunciou tanto sua vontade de iniciar conversações de paz com o Vietnã do Norte quanto sua decisão de concorrer à reeleição. No dia 4 de abril Martin Luther King foi assassinado em Memphis e conflitos irromperam em cidades por todos os Estados Unidos. Em maio, a violenta supressão dos protestos estudantis na Universidade Sorbonne de Paris levou à greve geral da classe trabalhadora francesa que paralisou o governo DeGaulle e trouxe o país à beira de revolução socialista. No dia 5 de junho, o Senador Robert Kennedy foi assassinado em Los Angeles. Em agosto, a convenção dos democratas em Chicago foi marcada por protestos anti-guerra, que o Major Richard Daley procurou suprimir através de violência policial. Na mesma semana tanques soviéticos entraram na Tchecoslováquia e restauraram o controle linha-dura stalinista. Em novembro, Richard Nixon foi eleito presidente.

26. Os acontecimentos de 1968 marcaram apenas o início de uma massiva ascensão global da luta de classes que persistiu por aproximadamente uma década. Em todos os continentes a luta das massas era a regra, não a exceção. A mais significativa característica desse período foi o desenvolvimento paralelo de movimentos revolucionários tanto nos menos desenvolvidos como nos mais avançados países capitalistas. Condições pré-revolucionárias ou revolucionárias surgiram na Bolívia, Chile, Argentina, Itália, França, Grã-Bretanha, Portugal, Grécia e Espanha. Dentro dos Estados Unidos, a força predominante nas lutas sociais durante o período não foram os estudantes, mas a classe trabalhadora. Com exceção de 1973 e 1976 o número de trabalhadores envolvidos em grandes greves nunca caiu abaixo de 1 milhão entre os anos de 1967 e 1979. Em 1970 e 1971 o número de trabalhadores envolvidos em greves era de 2,4 milhões e 2,5 milhões, respectivamente. Na Inglaterra, as greves de mineradores em 1973-74 forçaram o governo conservador de Edward Heath à renúncia.

27. A que então se pode atribuir a sobrevivência do sistema capitalista mesmo durante esse período de tumultuadas lutas sociais? Do ponto de vista político, o principal motivo para a sobrevivência do capitalismo pode ser encontrado nas políticas contra-revolucionárias dos governos, partidos e burocracia sindical stalinistas e social-democratas, que fizeram de tudo em seu poder para sabotar as lutas revolucionárias da classe trabalhadora. Além do mais, os partidos e organizações pablistas, que já haviam rompido com a IV Internacional nos anos 50 e início do 60, desempenharam um papel destrutivo encobrindo a traição política dos stalinistas e social-democratas e canalizando as lutas de massa para protestos políticos impotentes. Nesse projeto, os pablistas trabalharam de braços dados com as organizações denominadas de Nova Esquerda, cujas principais características eram o desdém pela classe trabalhadora, indiferença às lições da História, hostilidade para com a teoria marxista e ódio amargo pelo trotskismo.

28. A traição política dessas forças foi apoiada por fatores objetivos substanciais, dentre os quais o mais significativo foi a posição mundial ainda dominante do capitalismo americano. O dólar funcionava como o eixo da economia capitalista mundial, com conversão para o ouro à taxa de US$ 35 por onça. Mas política e economicamente, o mundo em 2008 é muito diferente daquele existente 40 anos atrás. O principal credor do mundo se tornou sua mais endividada das nações. O dólar americano, cujo valor nos mercados internacionais é apenas uma fração do que era durante a era de Bretton Woods, perdeu virtualmente toda credibilidade como uma moeda de reserva mundial. A substituição pelo Euro ou por um punhado de moedas internacionais, um desenrolar que é apenas inevitável, irá apenas confirmar o que já começa a aparecer - que a era da dominação global do capitalismo americano chegou ao seu fim. Logo, as extraordinárias mudanças tecnológicas que estão por trás dos processos conhecidos como “globalização” são profundamente revolucionárias em suas implicações. As últimas três décadas testemunharam uma imensa expansão mundial nas forças da classe trabalhadora internacional. Seu poder social e habilidade em potencial para reorganizar a economia mundial nos moldes socialistas - isto é, para o propósito conscientemente direcionado de acabar com a pobreza e exploração e servindo às necessidades da humanidade - é maior do que em qualquer período anterior da história.

29. O Socialist Equality Party, em solidariedade política ao Comitê Internacional da IV Internacional, antecipa confiantemente o ressurgimento das lutas da classe trabalhadora. Nós estamos convencidos de que a crise objetiva do sistema capitalista dará o impulso para a irrupção da classe trabalhadora americana e internacional. Mas a irrupção que está por vir não irá resolver automaticamente o problema que é desenvolver a consciência socialista.

30. Como as lutas iniciais da classe trabalhadora nos últimos meses demonstram, ainda existe um enorme abismo entre as implicações revolucionárias objetivas da crise e o nível atual da consciência política. As condições objetivas irão propelir a classe trabalhadora à luta e criar as condições para um enorme salto na consciência. Mas seria um erro subestimar o grau de esforço que deve ser realizado pelo partido para elevar a consciência da classe trabalhadora e superar a influência reacionária das burocracias que, mesmo enfraquecidas, permanecem um sério e perigoso sustentáculo do jugo capitalista. Tampouco podemos ignorar o papel desempenhado por uma série de tendências “radicais” pequeno-burguesas, que persistentemente tentam desorientar a classe trabalhadora e manter sua subordinação às seções “progressistas” da burguesia. A influência de todos esses diferentes agentes políticos da classe dominante pode apenas ser superada pela luta pela assimilação das experiências estratégicas das lutas revolucionárias do passado, e pela luta pelo entendimento das implicações da crise em desenvolvimento no capitalismo mundial.

31. Ao longo de 2008, o Socialist Equality Party irá assumir uma grande campanha política para expandir sua influência na classe trabalhadora e entre a juventude. Essa campanha incluirá:

(a) A participação do SEP nas eleições de 2008 com candidato próprio no maior número de estados possível. O propósito dessa campanha será desenvolver a consciência política da classe trabalhadora, e sua compreensão do programa do socialismo internacionalista, para que ela rompa com os partidos da classe capitalista, e para lutar contra a pobreza, exploração e todas as formas de desigualdade social, para construir uma oposição ao militarismo e imperialismo americano e recrutar novas forças para o interior do Socialist Equality Party.

(b) O desenvolvimento, em conjunto com nossos co-pensadores do Comitê Internacional, do World Socialist Web Site. Isso incluirá um amplo redesenho do site para aprimorar a leitura e fazer o melhor uso possível das tecnologias modernas da web. O WSWS também introduzirá mudanças editoriais que irão fortalecer seu conteúdo político, cultural e teórico. O objetivo dessas mudanças é expandir os leitores e a influência política do site como um instrumento do pensamento e ação socialista.

(c) O Internacional Students for Social Equality (ISSE), o movimento estudantil e da juventude afiliada ao SEP, irá expandir seu trabalho nos campi através dos Estados Unidos. Combinados aos esforços de nossos co-pensadores no Comitê Internacional, iremos nos esforçar para desenvolver o ISSE como um movimento genuinamente internacional lutando pela unidade política e solidariedade da juventude e dos trabalhadores através do mundo.

32. Fazemos um apelo a todos os membros do SEP para que lutem, com base na perspectiva esboçada nesse documento, para a expansão do trabalho do partido em 2008. Ao mesmo tempo, todos os membros do SEP fazem um apelo aos leitores e apoiadores do World Socialist Web Site para que percebam a urgência da crise política e econômica do capitalismo americano e mundial e se juntem a nós na luta pelo socialismo.