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União Europeia empurra mudança de governo na Itália

Por Peter Schwarz
19 de novembro de 2011

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Publicado originalmente em inglês no dia 14 de novembro de 2011.

Seguindo o exemplo da Grécia, é provável que a Itália logo venha a ser dirigida por um governo tecnocrata nomeado pelos bancos internacionais. O primeiro-ministro Sílvio Berlusconi convocou uma reunião de gabinete para sábado à noite, na qual ele deverá entregar sua carta de renúncia. O mais cotado para sucedê-lo é o economista e ex-comissário europeu, Mario Monti, que não é aliado político de Berlusconi.

Berlusconi anunciou na noite de terça-feira que iria renunciar caso o parlamento italiano adotasse as medidas de austeridade exigidas pela UE. Porém, ele não havia especificado nenhuma data. Os mercados financeiros estavam insatisfeitos com esse anúncio vago, e na quarta-feira as taxas de juros dos títulos italianos dispararam para 7%, tornando o refinanciamento da dívida pública praticamente impossível.

A União Europeia também intensificou sua pressão. O chefe do fundo de resgate europeu (EFSF), Klaus Regling, declarou em uma entrevista a jornais europeus que o país precisava de "um governo operante o mais rápido possível". A Itália havia perdido o "prazo para acalmar os mercados", avisou.

O parlamento italiano então declarou que estava disposto a adotar o pacote de austeridade em procedimentos sumários. O pacote inclui cortes de empregos no setor público, a desregulação do mercado de trabalho e cortes sociais. Especialistas concordam que essas medidas são apenas o prenúncio de cortes futuros.

Na sexta-feira, o senado aceitou o pacote de austeridade por 156 votos contra doze. Espera-se que no sábado a câmara de deputados faça o mesmo. Isso abriria caminho para a renúncia de Berlusconi, e um novo governo poderia ser formado já na próxima semana.

A força que está por trás do remanejamento do governo é o presidente Giorgio Napolitano. Ele insistiu diversas vezes nos últimos meses que se implementassem as medidas da UE. Oficiais internacionais do governo agora o consideram um aliado favorável para discussões. Na última cúpula do G20 em Cannes, a chanceler alemã, Ângela Merkel, argumentou de consultar Napolitano para saber sobre a situação econômica na Itália.

É uma ironia histórica a proeminência de que Napolitano desfruta agora. Agora com 86 anos, Napolitano se filiou ao Partido Comunista em 1945 - período em que, devido a pressões das potências da Otan, o partido era frequentemente retirado do governo, apesar do fato de ser na época o maior partido da Itália. A UE e os EUA agora dependem desse funcionário veterano stalinista para assegurar que a Itália seja cúmplice dos ditames dos mercados financeiros.

Como presidente, Napolitano cumpre majoritariamente funções cerimoniais. Em situações de crise, no entanto, ele assume um papel-chave, uma vez que pode tanto dissolver o parlamento e apontar um candidato de sua escolha para formar um novo governo.

Alguns dias atrás, Napolitano usou a dissolução do parlamento como uma ameaça para ganhar apoio a um governo de transição. Ele sabe que os partidos de centro-esquerda - os Democratas, que vieram do Partido Comunista, e vários grupos cristãos democratas - agora temem novas eleições. Todos eles apoiam medidas de austeridade impopulares, mas não querem argumentar publicamente a favor de tais medidas em uma campanha eleitoral. Além disso, eles dizem, uma campanha eleitoral não apenas atrasaria a implementação de medidas de austeridade.

Também foi Napolitano que levantou a possibilidade de Mario Monti dirigir um governo tecnocrata. Na quarta-feira ele nomeou Monti para um cargo de longa vida como senador para fortalecer sua credibilidade política.

Monti, 68 anos, tem amplas conexões internacionais. Ele foi presidente da agência de consultoria política BRUEGEL, e é frequentador regular da Conferência de Bilderberg, que reúne representantes da política, das finanças, das forças armadas e da mídia europeia e norte-americana para consultas regulares.

Ele estudou na Universidade de Yale nos EUA e trabalhou como professor de economia em várias universidades italianas. Como comissário da União Europeia, dirigiu dois departamentos importantes de 1995 a 2004: o de mercado interno e o de competição. Como comissário de competição fez seu nome com ações contra a gigante empresa americana de software Microsoft e a alemã Volkswagen.

Se Napolitano de fato consegue assegurar uma maioria parlamentar para um governo tecnocrata dirigido por Monti ainda não está claro. O maior partido de oposição, os Democratas, demonstraram sua aprovação juntamente com diversos partidos centristas menores.

O PDL (Pessoas da Liberdade) de Berlusconi, porém, está rachado: alguns membros apoiam um governo de transição, enquanto outros exigem novas eleições. O próprio Berlusconi abandonou sua posição inicial para apoiar um governo liderado por Monti - ao menos oficialmente.

Gianfranco Fini, líder dos "pós-fascistas", chamou Monti "a pessoa certa para resolver a crise" e rejeitou novas eleições, chamando-as de "um tiro no escuro". Fini fundiu seu partido com o PDL em 2009, mas desde então rompeu relações com Berlusconi.

O partido de coligação de Berlusconi, a Liga do Norte, se pronunciou contra Monti. O líder da Liga, Umberto Bossi, disse: "É bom estar de volta na oposição, e estaremos de volta na oposição". Este partido populista de direita certamente deseja tirar proveito da imensa revolta que existe contra as medidas de austeridade. O partido pró-direitos civis liderado pelo ex-promotor Antonio di Pietro também convocou eleições antecipadas.

A Itália já teve más experiências nos anos 1990 com os assim chamados governos tecnocratas. Após a implosão do antigo sistema partidário no pântano de escândalos de corrupção, o presidente do Banco Central, Carlo Azeglio Ciampi, assumiu a direção do governo vigente em 1993. Ele foi substituído por Silvio Berlusconi, que ganhou as eleições parlamentares para conformar seu primeiro governo.

O governo de Berlusconi afundou alguns meses depois, no entanto, após uma oposição de massas contra os cortes sociais implementados. Ele então foi substituído por outro governo tecnocrata, desta vez sob a direção de Lamberto Dini, o sucessor de Ciampi na presidência do Banco Central. Dini permaneceu no poder por 16 meses.

Ambos os governos Ciampi e Dini podiam contar com o apoio de toda a esquerda parlamentar, que ficou profundamente desacreditada nesse processo. Isso gerou as condições sob as quais Berlusconi pôde voltar ao poder em 2001, e de novo em 2008.

Um governo liderado por Monti iria muito mais longe do que seus antecessores políticos. Sem qualquer credencial política, tal governo implementaria os ditames dos mercados financeiros internacionais, ao mesmo tempo que contasse com o apoio dos partidos de centro-esquerda, dos sindicatos, e de seus aliados da pseudoesquerda. Dada a enorme montanha de dívidas do país, cerca de 1,9 trilhões de euro, ou 120% do PIB italiano, isso só é possível cortando drasticamente os padrões de vida de amplas camadas sociais, como está acontecendo agora na Grécia.

Dada a profunda oposição popular a suas políticas, um governo dirigido por Monti seria altamente instável. Ele representaria um estágio transitório a um regime de medidas abertamente ditatoriais contra a classe trabalhadora. Em seu editorial de sexta-feira, o Financial Times, principal jornal europeu de economia, alertou que "nomear um tecnocrata que não foi eleito não é ideal". Tanto na Grécia como na Itália, "seria um erro fatal presumir que uma coligação da velha elite política, dirigida por um tecnocrata, irá providenciar uma saída milagrosa para problemas de raízes muito mais profundas. [...] Ambos os governos terão de se equilibrar na corda bamba entre sua política interna e a credibilidade nos mercados. [...] Esses novos líderes também devem reconhecer que nada será conquistado sem apoio popular", conclui o Financial Times.

Mas onde a classe dominante encontrará "apoio popular" a uma política dirigida a destruir as vidas de amplas camadas da população? Por esse motivo, setores da burguesia estão abertamente cogitando um movimento populista de direita ou fascista. O maior perigo de um governo tecnocrata apoiado por toda a "esquerda" oficial encontra-se no fato de que ele cria um solo fértil justamente para esse tipo de movimento.

Traduzido por movimentonn.org