Dois meses após o golpe militar de 3 de Julho, a junta
egípcia, apoiada pelo governo dos Estados Unidos, continua
reprimindo toda e qualquer oposição, seja ela o
partido islâmico Fraternidade Muçulmana (FM), seja
ela a classe trabalhadora.
Na terça-feira (3 de setembro) um tribunal de Cairo
determinou o fechamento da rede de televisão Al-Jazeera
Mubasher Misr, e de mais 3 outras, Al-Yamouk, Al-Quds e Ahrar
25, sob a acusação de representarem uma ameaça
à segurança nacional. O governo alegou que essas
redes televisivas estão conectadas ao partido islâmico
e sendo parciais em favor do presidente deposto, Mohamed Mursi.
Na segunda feira (2), o tribunal ordenou o fechamento permanente
da rede Salafist Al-Hafez. Também na segunda-feira, três
repórteres da Al-Jazeera foram deportados pela força
de segurança egípcia.
Em uma matéria publicada na terça-feira, Repórteres
Sem Fronteiras condenou a repressão contra jornalistas
e profissionais da mídia atual desde o golpe. De acordo
com a denúncia, as autoridades egípcias têm
censurado dez canais de mídia e invadiram seis escritórios.
Cinco jornalistas foram assassinados, 80 foram detidos arbitrariamente
e outros 40 foram atacados por policiais ou bandidos em cooperação
com as forças de segurança.
Durante o final de semana, as forças de segurança
dispersaram os protestos de âmbito nacional chamados de
Coalizão Nacional de Apoio à Legitimidade da FM,
matando cerca de oito manifestantes e ferindo outros 221, de acordo
com números oficiais. Diante dos protestos, o Ministério
Egípcio do Interior anunciou que o uso de munição
letal contra os manifestantes foi em "legítima defesa".
Nos últimos dois meses, a junta militar, liderada pelo
articulador do golpe, General Abdel Fatah Al-Sisi, tem organizado
massacres e prisões de centenas de manifestantes. Seif
Abdel Fattah, assessor do ex-presidente Mursi e professor de ciências
políticas na Universidade do Cairo, acusou a junta militar
de "assassinar mais de 3 mil egípcios que não
podem ser culpados de nada mais do que serem contra o golpe".
As forças de segurança continuam a fechar o cerco
na liderança da FM. Na segunda-feira, unidades especiais
detiveram o ex-governador de Kafr El-Sheikh, Saad El-Husseini,
em uma casa no Novo Cairo. Na terça-feira, Mostafa Issa,
renomado líder da FM e ex-governador de Minya, também
foi detido.
No mesmo dia, uma corte militar egípcia sentenciou um
membro da Fraternidade à prisão perpétua,
enquanto outros 48 receberam penas que variam de cinco a quinze
anos. Os réus são acusados de "atirar e utilizar
meios violentos" contra o exército na cidade portuária
de Suez no dia 14 de Agosto, o dia em que as forças militares
e a Força Central de Segurança reprimiram violentamente
as manifestações e protestos pacíficos em
apoio ao ex-presidente Mursi por todo o Egito.
De acordo com a agência de notícias MENA, o próprio
presidente deposto, Mursi, será julgado em uma corte criminal
no Cairo sob as acusações de "ter cometido
atos de violência, incitando a população a
cometer assassinatos e vandalismos", ao lado de outras figuras
de liderança da FM, como o Guia Supremo da Fraternidade
Islâmica, Mohamed al-Badie.
No Sinai, o exército continua sua ofensiva contra o
que eles chamam de "terrorismo". Na terça feira,
foi reportada a morte de 8 militantes islâmicos, enquanto
outros 15 ficaram feridos, em um ataque aéreo de quatro
helicópteros de guerra Apache.
O objetivo final do que a junta militar chama de "guerra
contra o terrorismo" é silenciar e suprimir qualquer
resistência contra a tentativa de restaurar a ditadura militar
existente antes da revolução egípcia sob
o governo do ex-ditador Hosni Mubarak. Ultimamente, o alvo central
da junta militar tem sido a classe trabalhadora, que tem sido
a força central por detrás da revolução
egípcia.
Quando o exercito atacou violentamente uma greve de 2.100 metalúrgicos
na Suez Steel, no dia 12 de agosto, justificou o ataque dizendo
que "islamistas" estavam por trás da greve. Um
documento militar publicado no período afirmou que "elementos
infiltrados" que eram "exploradores da religião"
tentaram envenenar os trabalhadores "em nome da religião".
O número de ataques a grevistas e a protestos de trabalhadores,
por todo o Egito, é crescente. No dia 17 de agosto uma
greve na Scimitar Petroleum Company, foi violentamente dispersada.
Nos últimos dias, veículos militares blindados
têm circulado nas proximidades da Misr Textile Company,
em Mahalla, onde centenas de trabalhadores entraram em greve na
última semana.
As características antiproletárias do golpe militar
foram recentemente sublinhadas pelo bilionário egípcio
Naguib Sawiris, que financiou e apoiou a conspiração
direitista de Tamarod, o principal mecanismo para a burguesia
egípcia para criar um descontentamento massivo contra o
presidente deposto Mursi e a FM, por trás dos militares.
Em seu Twitter, pediu pela proibição de "manifestações
e protestos por dois anos para que pudessem respirar e construir
nosso país".
Recentemente, David D. Kirkpatrick publicou um artigo no New
York Times intitulado "O Egito amplia a repressão
e o Significado de 'Islamista'", que nos dá um vislumbre
do aparato de terror e medo que estão reinstalando no Egito.
Kirkpatrick escreve que "Abusos policiais e acusações
políticas não são novidade no Egito e não
acabaram sob o governo de Morsi. Mas desde que a junta militar
assumiu no último mês, muitos ativistas dizem que
as autoridades estão agindo com um senso de impunidade
que excede até mesmo o período anterior a 2011,
nas revoltas contra Hosni Mubarak".
Ele continua dizendo que: "O governos instaurado pelo
General Abdul-Fattah el-Sisi renovaram a Era Mubarak de estado
de emergência, removendo todos os direitos de proteção
contra o abuso de poder da polícia. Os policiais têm
se pronunciado 'vingados'. Eles dizem que a alegação
do novo governo de estar combatendo a violência dos islamistas
corrobora o que eles sempre disseram: eram os islamistas, e não
a polícia, que matavam os manifestantes antes da deposição
de Mubarak."
Kirkpatrick aponta o fato de que o termo "islamista"
é utilizado para acusar qualquer pessoa que seja contra
o atual regime e, particularmente, contra os trabalhadores grevistas
que estão sendo rotulados como "terroristas"
ou "agentes da FM".
Os mais fervorosos apoiadores desses planos de colocar um fim
em todos os protestos e greves estão entre a classe média,
esquerdistas ou liberais, e suas organizações políticas.
Primeiramente colaboraram com o bilionário Sawiris e a
campanha Tamarod e agora estão prontos para ativamente
suprimir a classe trabalhadora.
Kamal Abu Eita, o novo ministro do trabalho e antigo líder
da Federação Egípcia dos Sindicatos Independentes
(EFITU), combinou sua entrada no governo apoiado pelos militares
sob a condição de que os trabalhadores encerrariam
suas greves e se tornariam "campeões de produção".
Quando os militares puseram um fim na greve da Suez Steel, ele
lançou a campanha publicitária e afirmou que a Fraternidade
Muçulmana é que estava incitando as greves.
Refletindo as aspirações da alta classe média,
cujos interesses estão vinculados com os do imperialismo
e do capital financeiro internacional, eles estão apoiando
uma ditadura militar para se proteger da ameaça de uma
revolução socialista no Egito.
Hamdeen Sabahi, um político Nasserista e antigo candidato
à presidência, disse à Reuters no último
final de semana que "o General Sisi é um herói
nacional por excelência, e, se ele decidir realizar eleições,
seria o candidato mais popular no momento".
O entusiasmo do meio da esquerda liberal por Sisi e pela junta
militar só é comparável pelo entusiasmo dos
bancos internacionais. Recentemente, Lutz Roehmeyer, um gerente
de fundos Alemão do Landesbank Berlin disse à Bloomberg:
"Estou confortável com esse tipo de regime militar.
Nós vemos isso de tempos em tempos nos mercados emergente
e geralmente servem como uma força de estabilização".